São Paulo, terça-feira, 20 de janeiro de 2009

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Israel diz que deixa Gaza até Obama assumir

Líder do Hamas manifesta apoio à retomada do diálogo como o rival Fatah, como pedem mediadores, 18 meses após ruptura

Em conferência no Kuwait, árabes racham sobre grupo radical palestino; sauditas prometem doar US$ 1 bilhão para reconstruir território

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A SDEROT (ISRAEL)

Israel deu sinais ontem de que pretende completar nas próximas horas a retirada de suas tropas da faixa de Gaza, dois dias depois do cessar-fogo que colocou fim a três semanas de ofensiva contra o grupo extremista palestino Hamas. Segundo fontes do governo, contanto que a trégua seja mantida, a ideia é que não haja um só soldado em Gaza até a posse de Barack Obama.
O movimento de retirada dos tanques e israelenses seguiu durante todo o dia de ontem, deixando para trás um cenário de devastação que os moradores de Gaza só agora começam a dimensionar.
Todos os prédios ligados ao governo, incluindo o Parlamento, foram destruídos, junto com cerca de 4.100 casas em todas as regiões de Gaza. Segundo a ONU, mais de 50 mil pessoas estão desabrigadas, e mais de 400 mil não têm acesso a água corrente.
O total de mortos em Gaza na ofensiva é estimado em 1.314 por israelenses e palestinos, mas há uma enorme diferença quanto ao número de baixas civis. Enquanto o Exército israelense diz ter matado 580 militantes do Hamas, o grupo afirmou ontem que sofreu 48 baixas. Do lado israelense, foram 13 mortos, sendo 10 soldados.
Escondidos em bunkers durante 22 dias, os extremistas aproveitaram o fim dos bombardeios para cantar vitória prometendo se rearmar para o próximo confronto com Israel. Em uma demonstração de força, o grupo colocou homens uniformizados nas ruas para patrulhá-las e organizar o trânsito já desde domingo.

Diálogo palestino
Ao mesmo tempo, porém, a liderança acusava o golpe sofrido com a maciça ofensiva israelense, mostrando flexibilidades antes inexistentes.
Em um discurso em que não desviou da retórica triunfalista esperada de um movimento islâmico armado, o premiê do Hamas, Ismail Haniyeh, manifestou apoio à retomada do diálogo com o Fatah, grupo secular expulso de Gaza em 2007, numa miniguerra civil que dividiu os palestinos geograficamente e ampliou o fosso ideológico.
Até o começo de dezembro, quando abandonou as tentativas de reconciliação intermediadas pelo Egito, o Hamas parecia pouco disposto a colaborar com o Fatah, visto por parte da liderança islâmica como traidor, devido às relações que mantém com Israel.
A união entre os palestinos foi considerada um tema crucial do acordo de cessar-fogo que o mesmo Egito negociou nas últimas semanas, com amplo apoio internacional. O ditador egípcio, Hosni Mubarak, insiste em trazer a Autoridade Nacional Palestina, controlada pelo Fatah, para um entendimento que inclua o monitoramento das fronteiras de seu país com Gaza.
Em reunião da Liga Árabe no Kuwait, Mubarak fez um discurso em tom crítico raramente visto em eventos desse tipo, geralmente marcado pela retórica da união árabe. O egípcio, que vê no Hamas uma extensão da Irmandade Muçulmana, a principal força de oposição a sua ditadura militar, acusou diretamente os fundamentalistas palestinos pela guerra em Gaza.
Para ele, a decisão do Hamas de rejeitar a extensão da trégua com Israel, em dezembro, foi "um convite à agressão". Ele disse que o Egito continuará com os esforços pela reconciliação palestina, e que sem ela será impossível levantar o embargo a Gaza, exigência do Hamas para manter o cessar-fogo.
"Faremos tudo o que pudermos, mas se as facções [extremistas] não responderem a nossos esforços, então diremos a elas que Deus ajuda aqueles que ajudam a si mesmos", afirmou, expondo a mais a crescente divisão no Oriente Médio ao criticar as "forças externas" que influenciam o Hamas, uma insinuação clara a Síria e Irã.
Presente ao encontro, o ditador da Síria, país que abriga a liderança do Hamas no exílio, respondeu dizendo que o Hamas foi forçado a reagir à agressão israelense. Bashar Assad acusou Israel de usar armas proibidas e propôs qualificar o país de "entidade terrorista".
Um dos padrinhos do acordo de cessar-fogo, ao lado do Egito, o governo francês acrescentou pressão europeia para aproximar o Hamas de uma posição moderada. Em entrevista ao canal France 2, o presidente Nicolas Sarkozy disse que a UE suspenderá as sanções a Gaza caso seja estabelecido um governo palestino de união.
A reunião culminou ainda em promessas para reconstruir o território, onde a ofensiva israelense deixou um prejuízo estimado em US$ 1,9 bilhão. A Arábia Saudita prometeu injetar US$ 1 bilhão em Gaza. Paralelamente, os países árabes estudam a criação de um fundo de US$ 2 bilhões.


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