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TECNOLOGIA
Forças anglo-americanas investem no aumento de armas "inteligentes" contra Saddam
EUA apostam em "batalha digital"
DA REPORTAGEM LOCAL
Um ataque anglo-americano ao
Iraque pode ser a primeira guerra
em que o software terá mais destaque que o hardware, na qual soldados passarão menos tempo
apertando gatilhos e mais tempo
olhando telas de computador, enviando e recebendo mensagens.
À primeira vista parece que
pouco mudou desde a Guerra do
Golfo de 1991. As fotos dos equipamentos levados ao Kuait mostram versões mais novas dos mesmos tanques pesados M1 Abrams,
veículos de combate de infantaria
M2 Bradley, canhões autopropulsados M-109, e os mesmos caça-bombardeiros F-16 Fighting Falcon, da Força Aérea, e F/A-18
Hornet, da Marinha, em ação.
A grande mudança é invisível,
pois faz parte do "recheio" de um
tanque ou avião. Uma década de
desenvolvimento da eletrônica e
da informática promete iniciar o
que o Pentágono chama de RMA,
"Revolution in Military Affairs",
Revolução em Assuntos Militares.
O novo "espaço de batalha digital" chega na hora certa para os
militares dos EUA. A maior exigência feita hoje às tropas atacantes é a rapidez. Por motivos políticos, os EUA e seus aliados precisam tomar o Iraque no menor
tempo possível, com o menor número de baixas entre civis.
Isso só é teoricamente possível
graças a um moderno sistema conhecido pela sigla C4 ISR -Command, Control, Communications, Computers, Intelligence,
Surveillance and Reconnaissance
(Comando, Controle, Comunicação, Computadores, Inteligência,
Vigilância e Reconhecimento).
Sem colocar as Forças Armadas
iraquianas fora de combate através de golpes rápidos, os anglo-americanos correm o risco de se
verem envolvidos em arriscados
combates urbanos em Bagdá ou
Basra, com um número de baixas
bem mais elevado, e a possível
morte de milhares de civis.
O aspecto mais divulgado da
moderna revolução em eletrônica
é o aumento da precisão das armas, que cunhou a expressão
"ataque cirúrgico" (embora o
"bisturi" em questão seja uma
carga explosiva de dezenas ou
centenas de quilos). Mas acertar o
alvo é apenas parte da questão.
Primeiro é preciso localizá-lo. O
comandante também tem de saber onde estão suas tropas para
"gerenciar" o campo de batalha.
Graças ao sistema de posicionamento por satélite GPS, e à difusão dos dados por uma espécie de
internet militar própria, o comandante pode ter no seu monitor a
localização exata e em tempo real
de seus comandados, e estes também podem saber onde estão em
relação ao resto das tropas.
Um dos sistemas digitais de comando e controle do Exército dos
EUA leva a curiosa sigla FBCB2
(Force 21 Battle Command, Brigade and Below -Força 21, Comando de Batalha, Brigada e
Abaixo). Seu objetivo é a integração no espaço de batalha digital
das principais unidades combatentes, a brigada e seus componentes "abaixo" (batalhões, companhias, pelotões).
Além de manter seu sistema C4
ISR operacional, o atacante procurará impedir o do inimigo de
funcionar. Mais importante do
que destruir cada míssil do Iraque
será atacar seus postos de comando, estações de rádio e de radar.
Em um Exército autoritário como é o do Iraque, a iniciativa costuma ser negada aos escalões inferiores. Sem receber ordens, essas
tropas ficam passivamente esperando o ataque inimigo ou podem se dispersar, como em 91.
As vantagens da nova estratégia,
especialmente para tropas numericamente inferiores, podem ser
entendidas por uma comparação.
O Exército do Iraque equivale a
um grupo de pessoas com vendas
nos olhos e tampões nos ouvidos,
apenas tateando o entorno, atacados por um grupo menor e ágil
com todos os sentidos ativos.
A rapidez no avanço é um dos
maiores desafios às forças anglo-americanas, porque tropas terrestres ainda têm que levar em consideração as leis da física. Tanques
não voam e só um número pequeno deles pode ser levado de avião.
Além de ter de combater pelo
caminho, desde a fronteira kuaitiana até Bagdá, as forças mecanizadas de tanques e blindados de
transporte de tropas têm um ritmo de avanço próprio mesmo
sem oposição inimiga.
Esse ritmo não mudou não só
desde a guerra de 1991, mas continua praticamente o mesmo desde
a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Em um avanço considerado clássico, a 7ª Divisão Blindada
alemã comandada por Erwin
Rommel percorreu 60 km por dia
na conquista da França em 1940.
Como lembra o historiador militar israelense Martin van Creveld, o mesmo ritmo ocorreu na
Guerra dos Seis Dias entre Israel e
árabes em 67: "Mesmo um exército operando em condições ideais,
desfrutando de completa superioridade aérea e atacando de surpresa um inimigo de segunda categoria não consegue cobrir mais
que 40 milhas (66 km) por dia".
Segundo Creveld, o mesmo
aconteceu em 1991. Apesar de os
blindados atuais terem poder de
fogo bem maior que os de 1945,
também têm motores que consomem mais combustível. Forças
mecanizadas precisam parar, se
reorganizar e serem supridas de
tempos em tempos.
Outro ponto em que a informática promete facilitar as operações
é seu uso na organização da logística, do suprimento de comida e
munição aos combatentes. Milhares de itens, de fuzis e baterias a
chocolate, receberam códigos de
barra para facilitar sua movimentação e distribuição rápida.
Uma alternativa a um lento
avanço por terra até a capital iraquiana que estaria sendo cogitada, segundo o jornal britânico
"The Sunday Times", é um assalto
por pára-quedistas diretamente
sobre o aeroporto de Bagdá.
Tradicionalmente, é uma operação arriscada, pois os pára-quedistas não contam com armas como artilharia pesada e tanques
nas primeiras horas. Só depois de
tomada uma pista de pouso é que
esses itens chegam. Em compensação, o domínio do ar permite
que a aviação apóie tropas avançadas 24 horas por dia.
A ênfase na modernidade tecnológica não significa esquecer o
que está por trás das telas de computador: força bruta concentrada.
Maior precisão das armas "inteligentes" significa também que menos aviões e mísseis são necessários para destruir um alvo, permitindo que mais objetivos sejam
atingidos ao mesmo tempo.
O cenário básico de uma guerra
ao Iraque envolve uma fase inicial, de duração variável, de ataques por bombas e mísseis, com
grande concentração nas primeiras horas. A diferença crucial é
que, se as armas "inteligentes"
eram cerca de 10% da tonelagem
empregada em Kosovo em 91 e no
Afeganistão em 2001, a proporção
subiu para mais de 90%, o que
permitiria um ataque inicial bem
mais concentrado que em 91.
O "kit" de modificação conhecido como JDAM custa cerca de
US$ 20 mil. Consiste na instalação
de um receptor de GPS na cauda
das bombas, tornando-as capazes
de acertar um alvo com margem
de erro de meros 13 m, de noite ou
com visibilidade ruim.
(RICARDO BONALUME NETO)
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