São Paulo, quarta-feira, 20 de abril de 2005

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Alemão, novo papa terá missão de recuperar a alma européia

CATHERINE PEPINSTER
DO "THE INDEPENDENT"

O cardeal Joseph Ratzinger, agora papa Bento 16, é um papa para a Europa. Não pode ser por acaso que ele escolheu o nome de são Bento, santo padroeiro da Europa, para seu título papal.
Como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, posto que ocupou durante 23 anos sob o pontificado de João Paulo 2º, Joseph Ratzinger passou a se preocupar cada vez mais com a secularização da Europa, com as ameaças à alma cristã do continente.
Parece extremamente provável que os cardeais no conclave, dos quais a maioria era européia, quiseram alguém que fosse capaz de enfrentar a sua maior preocupação: a de que a Europa, antes o centro da Igreja Católica, hoje seja o continente perdido da igreja.
Eles vêm assistindo, alarmados, à queda na presença dos católicos na missa, ao esvaziamento dos seminários, à pouca inclinação dos leigos em aceitar os ensinamentos da igreja com relação à contracepção e ao fracasso dos casamentos religiosos católicos.
Não que tal crise constitua novidade na Europa. Mas, na Europa pós-moderna, os problemas vêm sendo mais insidiosos. Hoje não é apenas o catolicismo mas o cristianismo em geral que vem sendo visto como pouco mais do que uma opção de estilo de vida.
A visão que Joseph Ratzinger tem da Europa ficou clara quando, no ano passado, ele se manifestou contra a candidatura da Turquia para ingressar na União Européia. Mas os temores em relação à Europa cristã são muitos mais profundos. Existe a percepção de que o continente rico e materialista vem perdendo sua alma.
Poderá Bento 16 ajudá-lo a reencontrá-la? Este é um papa que sempre foi mais teólogo do que pastor. Mas o papa precisa ser pastor de seu rebanho, guiando 1 bilhão de católicos no mundo.
Talvez este Bento tome como seu mentor o último papa Bento, Bento 15, eleito em 1914, que buscou sobretudo a paz, tentando dissuadir os EUA de entrarem na guerra. Bento 15 encontrou uma maneira de trabalhar com pessoas de muitas visões distintas.
A igreja, incluindo os progressistas que terão visto esta eleição com alguma consternação, vai esperar do novo papa que ele una essas tendências diversas.
Aqueles que conhecem Joseph Ratzinger dizem que ele é um homem bondoso, dotado de inteligência aguda e que, às vezes, era uma influência moderadora sobre João Paulo 2º. Foi ele, afinal, quem se opôs ao desejo de João Paulo de fazer dos ensinamentos sobre o controle de natalidade um dogma infalível.
E aqueles entre nós que queremos uma igreja que não seja afeita a modismos, mas que pratique a compaixão -uma igreja capaz de começar a compreender por que o uso de contraceptivos não constitui pecado, ou que o uso de camisinhas para combater a Aids na África não é um mal-, devemos prestar atenção ao fato de que Joseph Ratzinger assumiu o nome de Bento. Pois a primeira palavra das regras da ordem de São Bento, pai da Europa, é a mais importante. É a palavra "ouça". Ouça, Bento 16, o povo da igreja, o povo da Europa e o povo do mundo.


Catherine Pepinster é editora do semanário católico "The Tablet"
Tradução de Clara Allain


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