São Paulo, domingo, 20 de maio de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Política externa dos EUA pode ser terceirizada"

Opinião é de autor de estudo sobre mercenários, inspirado por colega

Indústria movimenta hoje cerca de US$ 100 bilhões no mundo, segundo Bicanic; mudanças tiram restrições das regras de combate

DE WASHINGTON

Além de "Blackwater", o livro, e da série de audiências em diferentes comissões do Congresso, várias obras recentes tratam do fenômeno dos "soldados privados", uma indústria que existe há tempos mas multiplicou-se com os conflitos do Afeganistão (2001) e do Iraque (2003) e hoje movimenta US$ 100 bilhões no mundo.
Quem faz a conta é o documentarista Nick Bicanic, autor de "Shadow Company" (A companhia fantasma). Inédito no Brasil, o filme parte da história de James, colega do diretor na Universidade de Cambridge que virou mercenário no Iraque, para examinar o tema.
Com a proliferação de mercenários, disse Bicanic à Folha por telefone, "a política externa dos EUA pode ser terceirizada". Leia os principais tópicos de sua entrevista: (SÉRGIO DÁVILA)

 


Número de soldados
"Quando começamos a pesquisar o tema, não sabíamos qual a extensão da indústria nem a importância que ela tinha na Guerra do Iraque. Nos meses após a queda de Saddam Hussein [abril de 2003], os documentos colocam os números perto de 20 mil pessoas. Agora, superam 100 mil. É um número imenso de civis -e armados- em uma zona de guerra. Mesmo 20 mil é um numero inédito em guerras contemporâneas."

Exército dependente
"A investigação acabou sendo sobre como as regras da guerra mudaram e o que isso significará para conflitos futuros. Se o Exército americano não consegue mais lutar sem "soldados privados", o que isso significa para a política externa, por exemplo? Quem a desenha, o governo ou as empresas?"

Perigos
"Quando há um número grande de indivíduos trabalhando numa zona de guerra, a motivação não será sempre a mesma da missão como um todo. Ou seja, a missão dos soldados, seja qual for, não é necessariamente a mesma da empresa. Se temos essencialmente dois grupos armados, e um deles tem um compromisso totalmente diferente do outro em relação à missão, há problema."

"Terceirização"
"A longo prazo, é muito mais sério. O que estamos vendo no Iraque, além do ocasional superfaturamento ou do manejo errado de armas por civis, são problemas pequenos em comparação ao que pode ocorrer. Que é a política externa ser terceirizada. No momento, há um sistema de freios e contrapesos no governo americano, que quer dizer que o presidente não pode apenas decidir ir à guerra, ele tem de passar por uma série de etapas no governo, no Legislativo, para que isso aconteça.
Se você permitir que empresas privadas tenham um papel cada vez mais importante na política externa, incluindo-as em aspectos importantes da guerra, isso levantará questões importantes. A quem eles respondem, quem toma decisões, quem é o responsável final?"


Texto Anterior: Mercenários no Iraque se igualam a EUA
Próximo Texto: Profissão perigo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.