São Paulo, quinta-feira, 20 de agosto de 2009

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Governo ameaça expulsar quem não respeitar censura

Na véspera da votação, autoridades endurecem restrições à divulgação pela mídia de atentados, o que pode motivar abstenção

Sujeitos a serem fechados, meios locais afirmam que não cumprirão a ordem, repudiada pela ONU, que recomendou sua revogação


DO ENVIADO A CABUL

O governo afegão começou a censurar o trabalho dos jornalistas ontem e promete punir quem não cumprir a ordem de não divulgar atos violentos hoje: expulsar os estrangeiros e fechar meios locais.
"Não é bem o que chamam de uma democracia. Isso é ridículo", afirmou à Folha o diretor da principal rede privada, a Tolo TV, Saad Mohseni.
Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a medida visa evitar que notícias de violência afastem pessoas do pleito. A abstenção é o objetivo principal da campanha intimidatória do Taleban e o principal temor da ONU.
As Nações Unidas, contudo, rejeitaram a censura e pediram a suspensão da medida. "As pessoas precisam de acesso à informação. A credibilidade destas eleições está ligada diretamente à informação a que as pessoas têm acesso", disse o porta-voz Alim Siddique.
A ordem havia sido expedida anteontem, mas os meios locais afirmaram que não iriam respeitá-la. "Em cada país democrático, há situações extraordinárias que levam o governo a tomar decisões para preservar o interesse nacional", afirmou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Ahmad Zahir Faqiri.
O blecaute informativo sobre violência em tempo real, segundo os decretos de terça-feira, vale das 6h às 20h de hoje (22h30 de ontem e 12h30 de hoje no Brasil). A eleição ocorre entre as 8h e as 16h no Afeganistão. Além disso, está proibida a presença de jornalistas em locais em que tenha havido atos violentos no período.
Mas a repressão ao trabalho dos jornalistas efetivamente já começou ontem. A Associated Press foi proibida de tirar fotos no centro da cidade, e em vários bloqueios pela cidade nenhuma credencial era aceita.
Quando chegou ao final do cerco militar ao banco que havia sido tomado pelo Taleban no centro de Cabul, a Folha foi obrigada e ficar atrás de uma barreira policial. Quando tentou fotografar, um soldado do Exército afegão deu um tapa na câmera.
"São as ordens", disse ele. Mas o decreto que também proíbe a presença de jornalistas em cenas de atentados só vale para o dia da eleição. "Não interessa", foi sua resposta ao tradutor.
Mais tarde, a reportagem foi parada e obrigada a dar meia-volta em quatro bloqueios próximos ao palácio presidencial. Num deles, o soldado tentou reter o passaporte do repórter, sem sucesso.
O Afeganistão é um país movido a boatos. Nas cidades maiores, conversas de bazar viram histórias mirabolantes com certa frequência.
Mas é inescapável lembrar que o Taleban está cumprindo sua promessa de atacar o processo eleitoral com violência.
A repórteres, o diretor da Associação dos Jornalistas Independentes do Afeganistão afirmou que o governo está sendo tolo. "Ninguém vai deixar de trabalhar, esconder as coisas só vai piorar tudo", afirmou Rahimullah Samander.
(IGOR GIELOW)


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