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Latinos arriscam ao centrarem parceria militar num só sócio
Síndrome de "colocar todos os ovos no mesmo cesto" pode afetar a operacionalidade das Forças Armadas da
região
Guinadas políticas de aliados,
como recente decisão de
Barack Obama sobre escudo
antimísseis, já resultaram no
fim repentino de acordos
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
A Colômbia está atrelada aos
EUA para compra de material
militar, doutrina e treinamento; a Venezuela, cada vez mais
adquirindo armas russas. E
agora o Brasil cria parceria "estratégica" com a França e torna-se dependente do país europeu para importantes sistemas
de armas, como submarinos,
helicópteros e talvez caças.
Essa síndrome de "colocar
todos os ovos no mesmo cesto",
contudo, já causou problemas
sérios para muitos países e pode afetar no futuro a operacionalidade das forças armadas da
América Latina.
Nenhum país é totalmente
autossuficiente na compra de
equipamento militar. Mesmo
os EUA podem comprar no exterior se descobrirem algum
item melhor do que o disponível no mercado nacional, embora busquem rapidamente
iniciar a produção local.
Países em desenvolvimento,
em geral, procuram diversificar
as fontes de seu material bélico
para evitar depender de um
único fornecedor. Pois basta
uma mudança de governo para
uma parceria desaparecer. A
recente mudança de orientação
do governo americano em relação ao escudo antimíssil balístico na Europa surpreendeu a
República Tcheca e a Polônia.
Na década de 1950, os franceses enfrentavam a guerrilha
pró-independência da Argélia,
que recebia ajuda de países árabes. Como revide, a França virou o grande arsenal de Israel:
aviões de caça, tanques, canhoneiras "made in France" foram
adquiridos pelos israelenses.
Até que em 1967, por conta
da Guerra dos Seis Dias, o governo francês iniciou um embargo a Israel. Mesmo aviões de
caça Mirage já pagos não foram
enviados. Além de forçar o país
a criar uma indústria de defesa
própria, o embargo francês
transformou os EUA no principal fornecedor israelense. Mas
quando Israel tentou produzir
seu próprio caça, as verbas
americanas secaram, e os israelenses tiveram de continuar
comprando caças dos EUA.
A política americana de vendas para a América Latina, de
republicanos e democratas,
sempre buscou manter um suposto "equilíbrio" regional. Determinadas armas não eram
vendidas por essa razão. A Força Aérea Brasileira quis comprar na década de 1970 o poderoso caça F-4 Phantom II, mas
teve de se contentar com um
modelo mais modesto, o F-5
Tiger, que ela ainda opera (e está modernizando).
Há armas que os EUA não
vendem a ninguém -é o caso
do caça F-22 Raptor, o melhor
do planeta. Outras são vendidas
só a aliados próximos, como
Reino Unido, Japão e Israel.
Cuba teve suas Forças Armadas equipadas exclusivamente
pela antiga União Soviética.
Com o fim da URSS e a suspensão do auxílio financeiro, as forças cubanas entraram em processo avançado de deterioração
e obsolescência. Os russos hoje
buscam na venda de armas uma
fonte de recursos e cobram caro. A Venezuela de Hugo Chávez tem a renda do petróleo para financiar as compras de armas russas. Cuba não tem.
Precedente
A Argentina é exemplo mais
lembrado -e temido- entre os
militares do subcontinente.
Depois que tropas argentinas
invadiram a colônia britânica
das ilhas Malvinas, o país sofreu embargo total de venda de
armas de europeus e dos EUA.
O embargo foi decisivo para a
derrota argentina. Apenas uma
fração dos caças-bombardeiros
franceses Super-Étendard armados com mísseis antinavio
Exocet foi entregue antes do
conflito. Essa combinação de
avião e míssil causou as maiores perdas entre os navios britânicos e forçou a Marinha Real
a operar distante das ilhas. Se
tivessem recebido toda a encomenda, o resultado da guerra
poderia ter sido outro.
A Colômbia depende muito
dos EUA para lutar contra a
guerrilha das Farc, e os EUA
querem ter voz ativa no equipamento colombiano. Isso quase
impediu a compra pela Colômbia do avião de ataque leve brasileiro Super Tucano, da Embraer. A bem-sucedida destruição de um acampamento da
guerrilha no Equador e a morte
do porta-voz das Farc, em
2008, tiveram participação do
avião brasileiro e mostraram o
acerto da compra.
É praxe entre as forças armadas da América Latina a utilização de equipamento por bem
mais tempo do que entre os
países desenvolvidos. Isso implica poder fazer manutenção
adequada ao longo de anos, ter
acesso a suprimentos que poderão deixar de ser fabricados
no país de origem e ter a possibilidade de realizar uma modernização de "meia-vida" que
prolongue o uso do material.
Colocar todos os ovos no mesmo cesto é, portanto, arriscado.
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