São Paulo, sábado, 20 de novembro de 2010

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Comunismo gera confusão entre chineses

Em palestra no Rio, acadêmicos são inquiridos sobre ausência de menção ao termo

CLAUDIA ANTUNES
DO RIO

Dois acadêmicos chineses foram inquiridos por colegas ocidentais por não mencionarem as palavras "socialismo" ou "comunismo" e citarem uma profusão de teóricos europeus e americanos em seminário da Academia da Latinidade, na última quarta-feira, no Rio.
A mesa redonda da qual participaram Tong Shijun, vice-presidente da Academia de Ciências Sociais de Xangai, e Wang Ning, professor de literatura comparada da Universidade Tsinghua (Pequim), discutiu se a China pode representar uma "modernidade alternativa", que não seja sinônimo de ocidentalização.
A resposta de ambos foi "sim", e Wang disse que a "modernidade com características chinesas" inclui tanto teorias marxistas adaptadas quanto o neoconfucionismo -tradição redescoberta com o fim do maoísmo e que a China pretende exportar nos institutos Confúcio espalhados pelo mundo.
Os dois citaram pensadores não chineses, incluindo o alemão Jürgen Habermas, teórico da democracia, o neomarxista americano Fredric Jameson e o francês Jean-François Lyotard (1924-1998), filósofo do pós-modernismo.
"Acho que na China há mais coisas sob o céu do que as imaginadas por teóricos ocidentais. Peço-lhes que sejam mais chineses", protestou o italiano Gianni Vattimo, professor de filosofia da Universidade de Turim.
Vattimo lembrou que a modernidade no Ocidente refere-se ao período iniciado com as Descobertas e a Reforma, enquanto a pós-modernidade vem do fim "da ideia colonialista de uma humanidade unitária".
Disse que queria saber, então, quais são as referências concretas dos chineses.
O equatoriano Enrique Ayala, reitor da Universidade Andina Simón Bolívar, contou que "há décadas" participou de encontro com chineses que defenderam que o "único caminho para a democracia é o socialismo".
"Suponho que muitos acadêmicos não têm mais essa posição, mas senti falta da palavra socialismo em seus estudos. Há alguma conexão entre socialismo e democracia?", perguntou.
Susan Buck-Morss, da Universidade Cornell (EUA), revelou que no início deste mês foi instruída a tirar a palavra "comunista" do título de uma palestra em Xangai, na abertura de encontro do Comitê Internacional de Museus de Arte Moderna.
O título era "Herdando a Cultura, um Modo Comunista de Fazer História", e Buck-Morss não pretendia falar do comunismo em si, mas fazer uma "provocação" para contestar as normas sobre direitos autorais e defender o livre trânsito de ideias, "desde que com o devido crédito".
Segundo ela, seus anfitriões chineses lhe disseram que era um momento delicado para "temas sensíveis", devido à premiação com o Nobel da Paz do dissidente Liu Xiaobo.
"No Ocidente, a palavra comunismo costuma causar embaraço. Eu queria saber se ocorre o mesmo entre seus pares", pediu a Wang e Tong.
Num clima que o secretário-geral da Academia da Latinidade, Candido Mendes, definiu como de "perplexidade", a resposta dos chineses revelou um enredo de enganos: eles pensavam estar agradando aos colegas deste lado do mundo.
"A experiência nos mostra que, quando um acadêmico ocidental fala do comunismo, geralmente o faz de modo crítico, e era isso que seus anfitriões chineses queriam evitar", disse Tong a Buck-Morss.
Segundo ele, embora socialismo e comunismo sejam termos controvertidos para "alguns" chineses, sua percepção pela maioria ainda é "bastante positiva".
"As pessoas não estão muito satisfeitas com membros do PC e organizações locais. Mas estão bastante com os dirigentes nacionais. É um problema, porque os líderes locais são criticados e as pessoas comuns dizem: "os líderes nacionais são legais, porque não seguem seus conselhos?"."


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