São Paulo, sábado, 20 de novembro de 2010

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Jornais do México omitem 90% dos crimes

Levantamento de fundação que preza pela liberdade de imprensa denuncia "buracos negros" de informação

Conforme estudo da Fundação Mepi, regiões sob os cartéis do Golfo e dos Zetas não reportam nem 5% dos episódios

GABRIELA MANZINI
DE SÃO PAULO

Só 1 em cada 10 crimes relacionados ao narcotráfico que acontecem no México chegam às páginas dos jornais. É o que conclui um levantamento realizado pela Fundação Mepi de Jornalismo Investigativo.
O levantamento pretende comprovar que o chamado "narcossilêncio", a autocensura que é imposta à mídia mexicana pelo crime organizado por meio de ameaças, sequestros e assassinatos, não retrata casos isolados, mas sim a situação do país.
"O poder do narco se espalhou nos últimos anos como um câncer", afirma o documento. "Em seu avanço, de cidade em cidade, os cartéis criaram buracos negros de informação, forçando os jornalistas ao silêncio."
O levantamento foi realizado durante o primeiro semestre deste ano com os jornais "El Noroeste", de Culiacán, "El Norte", de Monterrey, "El Dictamen", de Veracruz, "Mural", de Guadalajara, "Pulso", de San Luis Potosí, "El Mañana", de Nuevo Laredo, "Milenio", de Hidalgo, "El Diario de Morelos", de circulação nacional, e "Norte", de Ciudad Juárez.
Os pesquisadores compararam o número de reportagens contendo palavras-chave ligadas ao crime organizado com o de assassinatos ocorridos na região.
Também foram entrevistados diversos profissionais do setor. A maioria, descreve a Mepi, admite não publicar toda a informação que recebe e "confessa enfrentar uma escolha difícil entre a ética e a segurança pessoal".
Em Ciudad Juárez, fronteiriça com os EUA e a mais violenta do país, traficantes dos dois cartéis que duelam pelo controle da área -Juárez e Sinaloa- assassinaram 300 ao mês, no período pesquisado, mas só figuravam em 30 reportagens por mês.

TAMAULIPAS
Conforme a pesquisa, o Estado de Tamaulipas é aquele em que a "narcocensura" se instalou mais cedo e de maneira mais profunda.
Lá, data de 1986 o primeiro caso de um jornalista assassinado depois de publicar informações que contrariaram criminosos. Era Norma Moreno Figueroa, 24, colunista do "El Popular", morta a tiros na porta do jornal.
Seu "crime", diziam seus colegas à época, foi publicar uma coluna sobre o prefeito Jesús Roberto Guerra Velasco, parente de Juan Nepomuceno Guerra, fundador do poderoso cartel do Golfo.
No primeiro semestre deste ano, um dos jornais locais, o "El Mañana", publicou, a cada mês, até cinco textos que mencionavam o narcotráfico e nenhum sobre assassinatos. Entretanto, no mesmo período, morreram em média três por dia.

CARTÉIS
Não por acaso uma das conclusões apresentadas na pesquisa da Mepi é a de que os territórios onde o crime é dominado pelo cartel do Golfo e o dos Zetas são os mais silenciosos. Os grupos estão "em guerra", sendo os Zetas uma dissidência do Golfo formada por homens egressos do Exército.
De acordo com o levantamento, nesses territórios, a taxa máxima de divulgação de crimes é de 5%.
Oito jornalistas que atuam naquele Estado contaram à Mepi que são intimados com frequência pelo tráfico para receber orientações sobre o que será publicado. A primeira regra, relata a Mepi, é nunca expor os chefes do crime.


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