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Regime está paranoico, afirma iraniano
Intelectual prevê piora da repressão antes de primeiros sinais de abertura e diz que Teerã quer melhor relação com Ocidente
Para escritor Hooman Majd,
radicado nos EUA, Irã quer
dominar tecnologia nuclear,
mas não necessariamente
almeja a bomba atômica
SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL
O temor de um complô orquestrado pelas potências ocidentais está levando à paranoia
o regime iraniano, que, seis meses após a contestada reeleição
do conservador Mahmoud Ahmadinejad, mantém o cerco aos
partidários do reformista Mir
Hossein Mousavi.
A avaliação é de Hooman
Majd, escritor iraniano radicado em Nova York que, pelo profundo conhecimento dos EUA,
foi transformado em consultor
particular da Presidência iraniana -primeiro a serviço do
reformista Mohammad Khatami (1997-2005) e hoje de Ahmadinejad, a quem serviu também de tradutor para o inglês.
Em entrevista à Folha por e-mail, Majd diz que o Ocidente é
mais intransigente que o Irã no
diálogo nuclear.
FOLHA - A dez dias do fim do prazo
dado para o Irã aceitar a mão estendida pelos EUA, por que o Irã endurece o tom nas conversas nucleares?
HOOMAN MAJD - Não vejo o Irã
endurecendo sua posição. O
país até ofereceu um acordo
-trocar urânio empobrecido
por enriquecido [em uma ilha
iraniana do golfo Pérsico]- que
foi rejeitado pelos americanos.
Os EUA tinham outra proposta que nunca teria funcionado como prometido. O Irã
está preocupado com a possibilidade de enviar urânio ao exterior e ter que esperar um ano
até recuperá-lo sob forma de
combustível. Se alguém faz
uma oferta e diz que é pegar ou
largar, então não se trata de
uma negociação. Após 30 anos
de hostilidade não se pode
achar que alguns dias de conversa darão resultados.
O Irã não tem medo da guerra ou de mais sanções e está disposto a melhorar a sua relação
com o Ocidente, mas não quer
fazer isso em uma posição de
fraqueza.
FOLHA - O Irã pode estar blefando
quando anuncia novas usinas e
maior grau de enriquecimento?
MAJD - Acho que há uma dose
de blefe, e os anúncios do Irã
parecem ser uma reação irritada à resolução da AIEA [que
condenou Teerã por falta de
transparência de seu programa
nuclear]. É claro que construir
mais dez centrais é um exagero
e algo improvável. Mas o Irã
deve ser levado a sério quando
diz que, se não houver acordo e
a AIEA continuar seguindo as
potências, poderá decidir elevar por conta própria a sua capacidade nuclear [e abandonar
o Tratado de Não Proliferação].
FOLHA - O sr. ainda acredita, após a
revelação da central secreta de
Qom, que o Irã não quer a bomba?
MAJD - Continuo acreditando
que o Irã não quer a bomba. A
planta de Qom faz sentido na
medida em que EUA e Israel
ameaçaram várias vezes bombardear Natanz [única central
de enriquecimento operacional
no Irã]. Teerã quer ter uma capacidade nuclear plena, e isso
significa dominar o ciclo todo.
Obviamente, isso lhe daria a
habilidade de fabricar também
a bomba, mas não significa que
o governo a esteja querendo.
FOLHA - Por que o Irã passou a usar
tanta violência contra opositores?
MAJD - O Irã se tornou mais
autoritário. O regime está paranoico achando que a oposição
está sendo usada por agentes
externos para fomentar uma
revolução e a queda do sistema.
Mas a oposição não vai desaparecer, o que aumenta as
chances de que um dia se chegue à abertura, principalmente
se os clérigos apoiarem as reivindicações opositoras. Mas,
no curto prazo, é provável que
tenhamos mais autoritarismo,
pelo menos até que o regime se
sinta mais seguro.
FOLHA - Mousavi é tão popular como se pensa no Ocidente? Ele recebe
alguma ajuda externa?
MAJD - Mousavi é muito popular, talvez mais do que na época
em que concorria à Presidência, e não acho que ele receba
qualquer ajuda do exterior
além de apoio moral. Mas o que
a mídia ocidental não reconhece é que Ahmadinejad também
é popular, e [o líder supremo,
Ali] Khamenei, mais ainda. Deve ser verdade que Mousavi recebeu mais votos do que Ahmadinejad, mas isso não significa
que o presidente tenha recebido poucos votos.
FOLHA - Que mudanças o sr. percebeu no seu país nos últimos anos?
MAJD - Percebi a descrença dos
iranianos em relação a seu regime e seu presidente. Isso se refletiu com clareza na alta participação na eleição presidencial
e na imensa decepção que sucedeu o voto.
Embora fosse difícil prever o
resultado da eleição e suas consequências, o pleito evidenciou
o que os iranianos vêm pedindo
há anos: mais integração na
economia mundial, melhor relação com o exterior, mais proteção para os direitos civis e
mais oportunidades de trabalho. Todos os candidatos prometeram isso, até Ahmadinejad. Há, portanto, um reconhecimento unânime dos problemas do Irã, com propostas diferentes para abordá-los.
Apesar da severa repressão
contra liberdades civis nos últimos seis meses, o regime terá
de se adaptar para atender às
demandas populares. Acho que
estamos vendo um Irã mais democrático tomar forma.
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