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Região patina entre desenvolver e preservar
Aprovação popular de nova rodovia e suspensão judicial da busca por petróleo ilustram impasse na Amazônia peruana
Praticamente sem árvores, Tarapoto, cidade imersa na selva, encara problemas
na coleta de lixo e falta
de saneamento básico
DA ENVIADA A TARAPOTO
Muitas dezenas dos populares motocars -dianteira de
moto colada a uma carroceria
para duas pessoas, marca da
selva peruana- disputam as
ruas estreitas e empoeiradas do
centro de Tarapoto. Praticamente não há árvores. Mas é a
Amazônia peruana, a 1.490 km
da capital, Lima.
A Grande Tarapoto, na região
(Estado) de San Martín, no
norte do país, com 161 mil habitantes, é um exemplo de que a
integração e o desenvolvimento econômico da região carregam tensões para além da questão dos direitos indígenas.
Nos últimos três anos, a cidade teve de lidar com a construção de uma estrada e com a
concessão de um lote para exploração de petróleo, ambas
iniciativas afetando área da reserva regional Serra Escalera.
A área é uma floresta úmida
onde a cordilheira dos Andes
encontra a selva, algo que lembra visualmente a mata Atlântica brasileira.
A estrada liga a cidade à vizinha Yurimaguas e faz parte da
Interoceânica Norte. Trata-se
de uma rota de 955 km que conecta a região ao litoral e é operada por um consórcio liderado
pela construtora brasileira
Odebrecht, que tem a pretensão de, no futuro, ligar fluvialmente a região a Manaus.
Já o lote petrolífero, que se
sobrepõe à reserva, é partilhado pela Petrobras, a espanhola
Repsol e a canadense Talismã.
As duas frentes são exemplos
também de como a versão peruana do PAC (Programa de
Aceleração do Crescimento)
tem bastante a ver com o Brasil.
Um dos eixos centrais do plano
é a integração viária e energética com o território brasileiro.
A rodovia ficou pronta em
março, não sem antes enfrentar polêmicas ambientais. Mas
é a alegria dos que reduziram
de até sete horas para duas horas e meia o tempo usado no
trajeto, principalmente para
Yurimaguas, isolada depois da
serra e há 50 anos esperando a
benfeitoria.
A estrada ganhou até a simpatia de ecologistas locais, que
negociaram com a empresa a
implementação de alguns projetos para diminuir o impacto
ambiental e social da estrada.
"Nem tudo foi feito, mas é
um começo", diz Marta del
Castillo, da principal ONG pró-ambiente da cidade, o Cedisa.
Dilema
Mas são os mesmos ecologistas que lamentam o fato de a rota melhorar tanto o acesso da
população como dos madeireiros à área de proteção, o eterno
dilema do melhoramento viário da selva, inclusive no Brasil.
Enquanto isso, os testes para
buscar combustível no lote
próximo à cidade estão suspensos pelo Tribunal Constitucional peruano desde abril. Movida pela Cedisa e associações civis locais e depois apoiada pelo
governo regional de San Martín, a ação argumentou que a
exploração do lote, no trecho
da reserva, destruiria a fonte de
água da cidade e da região.
O prefeito da cidade, Christopher Sandro Rivera, que apoiou
a ação, diz que ainda não há estudos confiáveis sobre o tema.
Rivera afirma que a população quer desenvolvimento e
que a campanha contra o lote
deu certo porque se centrou no
tema da água, sugerindo que os
tarapotenhos não se sensibilizariam se o tema fosse luta contra o aquecimento global ou defesa da biodiversidade.
A cidade é um centro comercial da região -e vive disso.
Tem problemas na coleta de lixo e de saneamento.
"Só tem água quando chove.
Por isso eu não quero as empresas. Prefiro ter água do que ter
emprego", diz Carlos Córdoba,
funcionário de um hotel local.
Mas o motorista Berman
Sánchez ainda sonha com as
petroleiras. E aposta que, numa
consulta popular, metade da cidade diria sim para elas.
A possibilidade de exploração continua aberta. A decisão
da Justiça diz que as atividades
estão suspensas até que a palavra final seja dada no plano de
administração da reserva que,
por norma baixada neste ano
por Alan García, tem de passar
pelo governo nacional.
"Temos um governo extrativista. Se Lima mudar, a nossa
mobilização vai ser maior",
promete Marta del Castillo.
(FM)
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