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ARGENTINA
Presidente tenta esvaziar o poder de Scioli, que o criticou; Casa Rosada nega semelhança com a queda de De la Rúa
Atrito com vice abre primeira crise do governo Kirchner
ELAINE COTTA
DE BUENOS AIRES
A lua-de-mel entre o presidente
argentino, Néstor Kirchner, e o
poder começou a entrar em crise.
Com pouco menos de três meses
de governo -os 90 dias se completam dia 25-, Kirchner protagonizou uma queda-de-braço
com o vice-presidente, Daniel
Scioli, que colocou em cheque a
permanência de Scioli no cargo.
As divergências dentro do governo não eram novidade -no
início da semana houve troca de
farpas entre os ministros da Economia, Roberto Lavagna, e Planificação Federal, Julio de Vido- ,
mas atingiram proporções mais
preocupantes depois que Kirchner decidiu trocar todo o comando da Secretaria de Turismo e Esporte, pasta que ficava sob tutela
do vice. O alvo foi o secretário de
Turismo Germán Pérez, homem
de confiança de Scioli.
O "curto-circuito" -como a
imprensa argentina define a crise- teve como pano de fundo
declarações feitas pelo vice que
desagradaram a Kirchner. Scioli,
em encontro com empresários,
defendeu um reajuste das tarifas
públicas, congeladas desde janeiro de 2002, e marcou data para o
aumento -outubro. Também
criticou a decisão da Câmara de
anular as leis de anistia que impedem o julgamento de militares da
última ditadura (1976-83).
O temor de alguns analistas é de
que a crise repita a história recente do país e que levou ao fim do
governo de Fernando de la Rúa
(1999-2001), cuja derrocada começou com a renúncia do vice
Carlos Chaco Alvarez. Scioli tem
sido enfático ao afirmar que não
irá renunciar. "A população também votou em mim."
O governo nega que haja semelhanças entre a atual crise e a de
De la Rúa. "Não há crise. Até porque Kirchner não é De la Rúa e
Scioli não se parece com Chaco
Alvarez", disse o ministro do Interior, Aníbal Fernández.
Scioli iniciou sua carreira política há menos de dez anos apoiado
pelo ex-presidente Carlos Menem
(1989-99). Depois, associou-se ao
ex-presidente Eduardo Duhalde,
padrinho da candidatura de
Kirchner à Presidência. Durante
as eleições, os comentários eram
de que Kirchner seria apenas um
títere de Duhalde, mas o presidente parece se impor. Agora, os
dois disputam poder dentro do PJ
(Partido Justicialista).
A mulher de Duhalde, Hilda
"Chiche" Duhalde, candidata ao
Congresso, saiu em defesa de
Scioli e criticou Kirchner ontem.
"O presidente deveria cuidar dos
direitos humanos para os vivos
que se encontram em estado de
pobreza e marginalidade."
"A crise entre Kirchner e Scioli,
mais do que consequências institucionais, tem um conteúdo político. O que realmente está por trás
desse enfrentamento é uma disputa do presidente com Duhalde", disse à Folha o analista político Rosendo Fraga.
Um levantamento telefônico
realizado pela consultoria Equis
mostrou que 63,7% dos entrevistados acreditam que a situação
deve piorar nos próximos dias.
Questionados sobre quem poderia estar por trás de Scioli na tentativa de desestabilizar o governo,
30% disseram ser Menem.
Manifestações
Desde anteontem, centenas de
manifestantes estão acampados
na frente da Casa Rosada (sede do
governo). O protesto é para reclamar do atraso da liberação de verbas para programas sociais.
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