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García quer pena de morte para abuso sexual infantil
Medida contraria tratado internacional de direitos humanos subscrito pelo Peru
Proposta conta com apoio popular, mas ainda depende de longa tramitação no Congresso e divide governo recém-empossado em Lima
FABIANO MAISONNAVE
DA REPORTAGEM LOCAL
A menos de um mês na Presidência peruana, Alan García já
provocou a primeira grande
controvérsia do seu segundo
governo ao anunciar que proporá o mais rápido possível ao
Congresso a reinstituição da
pena de morte para violadores
e assassinos de crianças. A iniciativa, defendida ao longo da
campanha eleitoral, divide seu
próprio gabinete, mas tem forte respaldo popular.
"Acredito que a sociedade
precise de mais rigor, mais ordem e que os delinqüentes precisem de punições muito mais
severas.Diante do crime atroz
que é a violação repetida, o assassinato de uma criança, creio
que essa gente não tem direito a
viver", afirmou recentemente
García, de centro-esquerda, em
uma das várias declarações públicas sobre o tema desde que
tomou posse, no final de julho.
O presidente peruano minimizou declarações contrárias
de quatro ministros do seu próprio gabinete e até de sua segunda vice-presidente, Lourdes Mendoza del Solar (há dois
vices no Peru). "Com a Justiça
peruana, poderíamos condenar
muitos inocentes", disse ela.
"São ministros de um governo eleito pelo povo, a quem foi
prometido levar esse tema ao
Congresso. Qualquer pessoa
sabe que, ainda que esteja contra, deve permitir que se cumpra uma promessa eleitoral",
rebateu García.
O abuso sexual contra crianças e adolescentes é apontado
como um dos principais problemas de segurança pública no
Peru. Dados do Ministério da
Mulher e do Desenvolvimento
Social estimam que, em média,
ocorrem 30 delitos desse tipo
por dia no país e que há cerca de
4.500 condenados por esse crime nos presídios peruanos.
A sensação de que se trata de
um crime disseminado é aumentada pelos populares tablóides sensacionalistas peruanos, que costumam dar bastante destaque a casos de abuso sexual contra crianças. Segundo
uma pesquisa citada recentemente pelo próprio García,
85% dos peruanos aprovam a
pena de morte para esse crime.
Por outro lado, opositores ao
projeto no Peru têm citado outra estatística oficial, segundo a
qual 76% dos casos são cometidos por alguém do entorno familiar. Desses, 56% são pais ou
padrastos. A aplicação da pena
de morte, avaliam, acarretaria
ainda mais problemas familiares a essas crianças.
A pena de morte no Peru foi
praticamente abolida em 1979,
ficando restrita apenas a "traidores da pátria" durante períodos de guerra.
Discussão jurídica
Para aprovar a pena de morte, García conta até agora com o
apoio do seu partido, o Apra, e
dos fujimoristas, respectivamente a segunda (36) e a quarta
(13) maior bancada do Congresso, que é unicameral.
É pouco para uma reforma
constitucional que, além de
aprovar a pena de morte, terá
de tirar o Peru da competência
da Convenção Interamericana
sobre Direitos Humanos. Esse
tratado, do qual o Peru é signatário, impede que se restabeleça a pena de morte em países
que a aboliram.
Uma reforma constitucional
precisa de 81 dos 120 votos em
duas legislaturas seguidas.
Os partidários de García têm
sugerido o melhor caminho é
que o Peru rechace parte da
convenção para aprovar a pena
de morte. "Com quem queremos ter problemas? Com a sociedade que exige resposta ou
com a Corte Internacional de
Direitos Humanos?", afirmou o
parlamentar do Apra Maurício
Mulder, um dos principais porta-vozes governistas.
O projeto de García e a intenção de sair da convenção têm
provocado críticas também no
exterior. Na quinta-feira, a Federação Internacional dos Direitos Humanos disse que a
medida "iria de encontro com a
tendência atual de abolição da
pena de morte no mundo" e
exortou o governo peruano a
cumprir os tratados internacionais de direitos humanos.
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