São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2011

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"Possuo apenas uma planta e uma cama"

Ativista indiano Anna Hazare, 74, adota simplicidade digna de Gandhi e atrai multidões

JIM YARDLEY
DO "NEW YORK TIMES", EM NOVA DÉLI

Na "nova" Índia, frequentemente obcecada pela riqueza e o status, Anna Hazare é uma figura que parece vinda de uma era anterior.
Sua boina branca pontuda e suas roupas simples de algodão branco evocam uma simplicidade digna de Gandhi. Sua aparência rural despretensiosa é algo que poderia suscitar risinhos de escárnio da elite urbana indiana.
Mas Hazare, 74, emergiu como o rosto improvável de um movimento popular acalorado na Índia, uma efusão de sentimento público que se concentrou no combate à corrupção, mas também exprime ansiedades mais profundas numa sociedade fustigada pelas mudanças.
Sua prisão, na terça passada, foi feita quando ele estava a caminho de um parque em Nova Déli onde iniciaria greve de fome em campanha contra a corrupção.
Ele foi detido com base em leis que autorizam prender quem represente ameaça à paz ou tenha "intenção" de cometer delito. Sua prisão levou milhares às ruas.
Sob pressão pública, as autoridades tentaram libertá-lo, mas ele se negou a deixar a prisão, a não ser que fosse libertado incondicionalmente.
Na quinta, os dois lados chegaram a um acordo. Na sexta, ele deixou a prisão, disposto a liderar uma greve de fome no centro de Nova Déli para reforçar sua reivindicação de que o governo crie uma agência anticorrupção poderosa e independente.

VALORES TRADICIONAIS
A atração exercida por Hazare parece ter sua origem em parte nos valores tradicionais que ele personifica. Hazare vem fazendo campanha contra a corrupção há quase duas décadas no Estado de Maharashtra, vivendo de uma pensão militar e financiando obras beneficentes por meio de donativos.
Se suas roupas evocam Mahatma Gandhi, o fundador da Índia, o mesmo pode ser dito de suas táticas de protesto não violentas: greves de fome e marchas pacíficas.
Hazare e seus assessores -um grupo de advogados e ativistas sociais apelidado de Time Anna- passaram meses em campanha. Eles distribuem vários e-mails por dia a jornalistas, com informações atualizadas e os mais próximos usam a mídia social para entrar em contato com seguidores jovens.
Hazare nasceu em 1937, na zona rural de Maharashtra, com o nome de Kisan Baburao Hazare. Ele ainda fala o marathi como sua primeira língua. Mais tarde, assumiu o nome Anna. Além de sua admiração por Gandhi, ele tirou inspiração de Swami Vivekananda, um reformista destacado do século 19.
Tendo topado com os ensinamentos de Vivekananda enquanto servia no exército indiano, Hazare decidiu dedicar sua vida ao serviço público depois de escapar da morte enquanto atuava na fronteira do Paquistão, segundo sua biografia oficial.
Ele serviu o exército por 15 anos, o que lhe deu direito a uma pensão, e aposentou-se no Maharashtra, passando a dedicar-se ao trabalho social. Hazare já recebeu dois dos mais importantes prêmios civis da Índia por seu trabalho, que inclui esforços para ajudar flagelados da seca e o trabalho para criar um "vilarejo modelo", nos moldes propostos por Gandhi.
Na década de 1990, Hazare começou a fazer greves de fome em Maharashtra para pressionar autoridades estaduais ligadas à corrupção, várias das quais acabaram sendo afastadas de seus cargos.
Em dado momento, ele foi alvo de acusações contrárias, segundo as quais o dinheiro de uma de suas fundações teria sido usado para pagar por sua festa de aniversário.
Uma comissão nomeada pelo governo concluiu que o dinheiro foi gasto de forma imprópria, mas que não houve corrupção pessoal por parte de Hazare.
"Sim, eu me sinto empoderado", disse Hazare em junho. "Isso acontece porque grande número de pessoas se posiciona comigo. Porque, tirando isso, o que eu tenho? Sou um pedinte. Vivo em um templo. Não tenho talão de cheques. Possuo apenas uma planta e uma cama."


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