São Paulo, quarta-feira, 21 de novembro de 2007

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Com a França parada, Sarkozy diz que não recua

Um terço dos servidores franceses adere a greve de 24 horas contra projetos que cortam gastos com funcionalismo

Movimento grevista afeta os aeroportos e atrai 65% dos professores da educação primária; presidente chama sindicatos de "minoria"

CÍNTIA CARDOSO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE PARIS

Depois de uma semana de paralisação dos transportes públicos, os demais servidores engrossaram ontem o contingente de grevistas na França.
Diante da adesão de um terço dos funcionários públicos a uma paralisação de 24 horas que se opõe a projetos do governo que visam diminuir os gastos com o funcionalismo e levar as universidades públicas a arrecadar verbas com a iniciativa privada, o presidente Nicolas Sarkozy falou pela primeira vez sobre o movimento.
Em discurso diante de prefeitos, Sarkozy disse que não recuará em suas propostas. "Não cederemos. Não recuaremos", afirmou. A tônica de negociador duro, que foi a marca de sua campanha à Presidência, marcou o pronunciamento. "Permanecerei determinado até o fim, mas aberto, porque esse é o meu dever. Mas também digo que é preciso terminar uma greve quando começa a hora da discussão", argumentou o presidente.
O presidente conservador disse ainda que "a França precisa das reformas para enfrentar os desafios impostos a ela pelo mundo" e chamou os grevistas de "minoria", que "não pode impor sua lei à maioria".

Aeroportos
Ontem, em média 1 em cada 3 funcionários públicos cruzou os braços. No Ministério da Educação, 39% aderiram à greve, com a maior taxa de participação, quase 65%, registrada entre professores primários. Nos outros ministérios, a média de grevistas também ficou em um terço do efetivo total.
Já entre os empregados dos Correios, o número de grevistas foi relativamente pequeno, cerca de 15%. Médicos e profissionais da saúde também foram convocados para participar da mobilização, mas o serviço não chegou a ser interrompido.
Problema maior foi a mobilização dos controladores de vôo, que provocou atrasos e cancelamentos nos principais aeroportos de Paris: Orly e Charles de Gaulle. Para sorte dos passageiros, a greve teve baixa adesão entre os empregados encarregados das bagagens. Na França, a aviação aérea civil é garantida pelo Estado. Os empregados da DGAC (Direção Geral de Aviação Civil), submetida ao Ministério dos Transportes, são servidores públicos.
Seguindo a tradição francesa de protestar nas ruas, os grevistas, ao lado de estudantes universitários e secundaristas, manifestaram-se nas principais cidades do país. Em Paris, a marcha partiu da Place d'Italie, ao sul da cidade, em direção ao centro. De acordo com Bernard Thibault, secretário-geral da central sindical CGT, foram 700 mil manifestantes. Mas, segundo a Direção Nacional da Polícia Geral, os protestos reuniram 375 mil pessoas.

Poder aquisitivo
A paralisação dos servidores tem como motivação o temor de empobrecimento da categoria . As centrais sindicais exigem maiores reajustes salariais porque denunciam uma perda de 6% no poder aquisitivo desde 2000. Em 2007, reclamam os sindicalistas, a política salarial do governo concedeu um magro aumento de 0,8% para os servidores.
"Nos últimos seis anos, os funcionários públicos franceses têm sofrido com uma austeridade severa da política salarial. Os salários não acompanharam a alta dos preços, especialmente em setores como habitação e alimentação", avalia Guillaume Duval, responsável pela publicação "Alternatives Economiques".
A questão da queda do poder aquisitivo foi um tema central da campanha de Sarkozy e figura entre as principais inquietações dos franceses.

Pacote
Outro foco de tensão que motivou a greve desta terça é o anúncio do corte de 22 mil postos da função pública defendido pelo presidente Nicolas Sarkozy para 2008. Essa redução dos quadros do funcionalismo atinge principalmente os professores primários.
O confronto entre os grevistas e o governo põe em xeque o pacote de reformas liberais proposto por Sarkozy e o seu relacionamento com os servidores, que compõem um quinto da força de trabalho no país e são uma das categorias mais atingidas pelo projeto de reestruturação do Estado francês.
O projeto foi o ponto principal da plataforma eleitoral de Sarkozy, que, com 53% dos votos, derrotou a socialista Ségolène Royal no segundo turno da eleição presidencial de maio. Mesmo então já se prenunciava que a implementação das reformas provocaria a atual queda-de-braço entre o governo e os sindicatos.


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