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ARTIGO
Serviço público é marca cultural francesa
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Um dos componentes culturais da França é o apreço aos
serviços de alta qualidade prestados pelo Estado. Não há praticamente hospitais ou universidades da iniciativa privada.
Crianças e adolescentes são
apenas matriculados nas poucas escolas particulares quando
os pais preferem o ensino religioso. Correios e transportes
terrestres são exemplares.
O setor público é também gigantesco. Possui 5,2 milhões de
funcionários para um país de
63,7 milhões de habitantes, o
que não é escandaloso.
Ao ser eleito em maio, o presidente Nicolas Sarkozy anunciou dois pacotes de medidas
que estão na origem das greves
que se encavalaram umas sobre
as outras e praticamente paralisaram ontem a França.
Ele pretende pôr fim ao regime especial de aposentadorias.
Algumas categorias -maquinistas de trens e metrô, cenógrafos da Ópera de Paris e da
Comédie Française- recebem
pensões integrais com menor
tempo de cotização. Os beneficiados -meio milhão na ativa e
1,1 milhão de aposentados-
não têm, segundo as pesquisas,
o apoio da população.
Aposta no esvaziamento
O presidente francês assumiu o risco da greve, que ontem
completou uma semana, sabendo existir uma tendência ao
esvaziamento. Os ferroviários
paralisados eram ontem apenas 27%, e os metroviários,
18%. Sarkozy, mudo durante
todos esses dias, reafirmou ontem que o governo "não cederá
e não recuará".
Mas também entraram em
greve, embora só por 24 horas,
39% dos professores, 19% dos
funcionários da saúde e 15%
nos empregados dos Correios.
Em média, diz o governo, 30%
dos funcionários públicos deixaram de trabalhar ontem. Mas
também ocorreram fotogênicas passeatas que reuniram
700 mil em todo o país, segundo as centrais sindicais.
O instituto CSA, em pesquisa
encomendada pelo diário comunista "L"Humanité", diz
que, ao contrário dos que querem manter o privilégio das
aposentadorias antecipadas,
esses grevistas têm a simpatia
de 53% da população.
Sarkozy não quer e não pode
demiti-los. Mas propõe um plano de enxugamento gradativo
dos quadros -a cada três aposentados, apenas duas contratações. Não quer controlar o
déficit fiscal por meio da diminuição da folha de pagamento.
A idéia é financiar um programa de diferenciação individual
de rendimentos, baseado na
produtividade e nas horas extras. Os sindicatos, o que se enquadra na lógica da visão homogênea de cada categoria,
previsivelmente são contra.
Nada indica que o presidente
recuará desse plano. Diz que
um Estado mais eficaz concorre em condições vantajosas
dentro da União Européia.
Isso não impede que, de imediato, a vida dos franceses tenha se transformado num inferno. Desde a semana passada
com menos ônibus, trens ou
metrôs, ontem milhões de pais
ou mães foram obrigados a ficar em casa para tomar conta
dos filhos menores. O setor de
serviços foi afetado em cheio.
É parte de um jogo no qual,
ao contrário das greves do setor
público de 1995, é desta vez
bem mais provável que Nicolas
Sarkozy saia ganhando.
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