São Paulo, domingo, 22 de janeiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EUA

Casos como o de Abramoff são "anomalia", diz o democrata Michael Berman

Para lobista americano, sistema impede excessos

IURI DANTAS
DE WASHINGTON

O megalobista republicano Jack Abramoff, cujo acordo com a Promotoria para delatar cúmplices vem provocando arrepios em Washington, é uma anomalia. O endurecimento das regras do jogo não trará mudanças na prática, e contra os excessos o melhor é confiar no sistema.
Em resumo, essa é a avaliação de Michael Berman, 66, um democrata que atua na cidade mais controlada pelos republicanos. Ele é lobista desde 1980 e também dá aulas de ética na American University. Em entrevista à Folha, defendeu os colegas. Pregou regras justas para o trabalho e lembrou que as suspeitas de corrupção envolvem também, e sempre, os agentes públicos.

Folha- Que lição o sr. tirou do processo contra Abramoff?
Michael Berman-
Nas minhas aulas de ética na American University costumo dizer aos alunos que não há lições a serem aprendidas com Abramoff. O que ele fez foi quebrar todas as leis e regras. Se admitiu culpa é porque fez intencionalmente. Não foi como se tivesse escorregado. Essa não é uma questão de ter gasto US$ 53 [quando um lobista só pode gastar US$ 50 numa refeição], mas sim que ele tinha um restaurante e os congressistas e os funcionários do governo basicamente entravam, comiam, assinavam um recibo e ninguém via a conta. Isso tem provocado muitas reações, mas ele é uma anomalia.

Folha - Mas a prática de oferecer jantares e adular políticos é regra.
Berman -
A maioria do Congresso não muda seu voto por uma ou dez refeições. Pode mudar alguns de seus votos, mas não aqueles relacionados aos chamados grandes temas nacionais.

Folha - A solução é confiar no sistema para isolar anomalias?
Berman -
Eles sempre são pegos. O que acontece é que eles começam a trapacear em questões pequenas, não são descobertos e, como em outros casos, tornam-se mais ousados, vão além e além. De repente, o sistema responde. O sistema americano é feito para lidar com os excessos. E Abramoff trapaceou todo mundo, seus clientes, seus empregados, e enganou seus colegas.

Folha- Endurecer as regras trará mudanças na prática?
Berman -
O mundo vai acabar se alguém levar um congressista para um jogo de futebol? Se disserem que os congressistas não podem ter viagens pagas pelo setor privado, irão com dinheiro do governo. Essas propostas que estão estudando não mudam a essência de nada. Se disserem que os congressistas precisam esperar dois anos antes de influenciar seus colegas diretos... nada disso é o fim do mundo. O sistema muda, as pessoas se ajustam. A coisa que um lobista mais quer são regras justas. O que a maioria faz é advogar interesses de uma indústria contra os interesses de outra, e ninguém quer que o outro lado tenha vantagens indevidas.

Folha - E a idéia de aumentar a fiscalização?
Berman -
Não acho que mais fiscalização vá impedir as pessoas de aceitar presentes. Muito disso acontece dentro das regras. Se você olha para viagens na superfície, as fundações que pagam, os formulários, os relatórios, a verdadeira questão é como o dinheiro entra nas fundações, há muitas coisas que derivam daí. Há muito esforço em dizer que a culpa é dos lobistas, mas são necessárias duas pessoas para jogar esse jogo.


Texto Anterior: História: Lobby de hotel deu origem ao nome
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.