São Paulo, domingo, 22 de fevereiro de 2004

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PALESTRA

De olho na ONU, ex-presidente defende a criação de um exército internacional para conseguir a paz no mundo

FHC defende a "redefinição de valores universais"

ROBERTO COSSO
DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), que quer ser secretário-geral da ONU, defendeu nesta semana a redefinição dos "valores universais mínimos" e a criação de um exército internacional para garanti-los.
As idéias foram apresentadas durante uma palestra sobre "ação para a paz e a compreensão mundial", proferida para 750 pessoas na última quinta-feira, em um encontro organizado pelo Rotary Club de São Paulo - Sumaré.
FHC afirmou que a paz mundial somente será atingida quando houver a "adesão de todos os povos aos valores mínimos universais" e que, hoje, não existe limite entre a aceitação de um conjunto de regras tidas como universais e o respeito à diversidade cultural.
"É preciso estabelecer um pacto entre os povos [e não mais entre as nações]; decantar um terreno em que todos estejam de acordo", disse o ex-presidente, que propõe que o monopólio da força seja retirado do Estado e transferido para um órgão internacional.
Apresentando-se como assessor especial do secretário-geral da ONU, Kofi Annan, FHC disse que há "ingenuidade" e "um pouco de fundamentalismo" dos países ocidentais, que pensam que "o que é bom é o que nós praticamos". Ele ressaltou que não é ingênuo: "Se eu fosse ingênuo, não teria sido presidente duas vezes".
Segundo FHC, o que se busca hoje é a adesão universal aos valores ocidentais. Para justificar, ele citou a forma como os EUA pretendiam organizar as eleições no Iraque -por meio de convenções regionais com líderes locais, semelhantes ao caucus (tipo de prévia para a escolha de candidatos presidenciais americanos). FHC também criticou a ação americana no Iraque: "Foram muito além do que parecia prudente e agora não sabem o que fazer".
FHC disse que o Tribunal Penal Internacional e o exército internacional devem tutelar os valores mínimos universais -coisa que a ONU não é capaz de fazer.
"A ONU depende da cooperação dos Estados nacionais para agir. Se os países mais poderosos não quiserem agir, as possibilidades ficam limitadas. Porque só um país [EUA] tem capacidade de atuação global." O ex-presidente afirmou que, "se não houver um esforço para evitar que a hegemonia [americana] desapareça pelo confronto, não teremos a paz". E disse ser necessária a criação de mecanismos para compartilhar o poder entre as nações.
FHC disse que Roma também teve monopólio e essa condição desapareceu com o tempo. "Estamos longe disso [em relação aos EUA], mas a China está aí; talvez para daqui a 50 anos."

ONGs
FHC é presidente do Painel de Personalidades Ilustres das Nações Unidas sobre a relação da ONU com a sociedade civil, cargo que, na verdade, cuida da organização do bom relacionamento da entidade com as ONGs (organizações não-governamentais).
Ele ressaltou que quem dá sustentação aos ideais humanitários da ONU são poucos Estados e muitas ONGs, com atuações expressivas na sociedade civil.
Em referência aos movimentos antiglobalização, FHC disse que há movimentos agressivos, mas ressaltou: "Os movimentos antiglobalização são todos globalizados e ficam sabendo das coisas pela internet".
O ex-presidente disse que, em seu governo, o Brasil foi um dos poucos países que obtiveram êxito no combate à Aids e atribuiu o sucesso à parceria do Estado com as ONGs de portadores de HIV.
Ele disse ter esperanças de que o século 21 seja capaz de criar entidades que não sejam contra o Estado, mas que ajudem o Estado.


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