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ANÁLISE
Por enquanto, crise é só retórica
CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO
A crise entre EUA e Israel deve ser vista em perspectiva. Se
considerados o balanço do debate interno americano, favorável à posição israelense, e o
histórico da relação bilateral,
ela não foi muito além dos decibéis a mais na retórica da Casa
Branca, por enquanto sem consequências práticas.
Ao condenar o anúncio israelense de novas construções no
setor árabe de Jerusalém, o governo americano reagiu à desmoralização do vice-presidente
Joe Biden, que visitava Israel.
Mas também tentou consertar
o erro tático que cometeu em
novembro, enfraquecendo a
promessa de Barack Obama de
promover negociações que afinal levassem aos dois Estados.
Naquele mês, depois de a Casa Branca ter exigido que Israel
congelasse a colonização dos
territórios palestinos -requisito de todos os planos de paz já
mediados pelos EUA-, a secretária de Estado Hillary Clinton
elogiou como "sem precedentes" a decisão do premiê Byniamin Netanyahu de declarar
uma suspensão parcial, temporária e que não incluía Jerusalém Oriental.
Por esse recuo, a Casa Branca
vinha sendo criticada por líderes árabes e por veteranos estrategistas da política externa
americana -o jornal "Financial Times" afirmou que Obama parecia "emasculado" diante de Netanyahu.
"Você não pode adotar uma
posição que é coerente com a
política americana de anos e,
no momento em que reagem a
seu empurrão, você amolece",
disse no mês passado James
Baker, secretário de Estado entre 1989 e 1992, no governo de
George Bush pai.
Como Zibgniew Brzezinski,
outro antigo chefe da diplomacia americana, Baker vem alertando para os prejuízos que a
posição israelense traz aos "interesses" dos EUA no Oriente
Médio e nos países muçulmanos. "Os contribuintes americanos dão a Israel US$ 3 bilhões
por ano, numa época em que
nossa economia está em má
forma. Não é pouco razoável
pedir que a liderança israelense
respeite a política americana
sobre os assentamentos", disse.
Bush sênior, no entanto, protagonizou um raro momento
nos últimos 20 anos em que a
Casa Branca exerceu pressão
efetiva sobre o aliado. Na época,
foram congelados US$ 10 bilhões em garantias de empréstimos a Israel, a fim de convencer o premiê Yitzhak Shamir a
aceitar o princípio da "troca de
terras por paz" que nortearia a
Conferência de Madri (1991). A
coalizão de direita de Shamir se
desfez em função disso, e ele
acabou substituído pelo trabalhista Yitzhak Rabin.
Crescimento exponencial
Desde então, e apesar dos
Acordos de Oslo (1993), houve
crescimento exponencial dos
assentamentos na Cisjordânia,
em Jerusalém e em Gaza -que
foi desocupada em 2005, de
forma não negociada com os
palestinos.
Os mais de 400 mil colonos
hoje inviabilizam um Estado
palestino contíguo -além de
condenar Israel, na ausência de
um acordo, a ser "um tipo de
nação do apartheid", disse o republicano Baker, repetindo o
ex-presidente democrata
Jimmy Carter (1977-1981).
Pela Convenção de Genebra,
os assentamentos são ilegais,
posição que é a da ONU e que os
EUA nunca renegaram. A anexação de Jerusalém Oriental
tampouco é reconhecida, nem
pelo governo americano.
Apesar disso, Washington
sempre vetou na ONU resoluções contra as colônias e hesita
em usar o peso da relação bilateral para pressionar Israel
-cuja imagem internacional
em boa medida depende de haver diálogo com os palestinos,
mesmo que ele seja prolongado
ao infinito.
Se George W. Bush levou a
aliança ao paroxismo -os extremistas islâmicos do Hamas e
na prática todo o movimento
palestino foram enquadrados
na "guerra ao terror"-, a mudança prometida pela nova Casa Branca vem naufragando.
Os israelenses nunca confiaram em Obama. Na campanha
de 2008, ele tirou de cena dois
assessores -Brzezinski e Robert Malley, que havia assessorado Bill Clinton- acusados de
ser pró-palestinos.
Israel também sempre preferiu que o programa nuclear do
Irã, e não a questão israelense-palestina, fosse a prioridade
americana na região. A controvertida reeleição do antissemita Mahmoud Ahmadinejad facilitou essa agenda.
Ao longo dos últimos dias,
depois que a condenação a Netanyahu foi criticada por uma
leva de congressistas e por boa
parte das organizações pró-Israel nos EUA, a Casa Branca pareceu recuar. Em meio a reafirmações da aliança, já não está
claro se ainda pede a suspensão
das construções anunciadas ou,
como deu a entender Hillary
Clinton na sexta-feira, que o
governo israelense seja discreto nas próximas vezes.
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