São Paulo, sexta-feira, 22 de abril de 2005

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O NOVO PAPA

Bento 16 opta por continuidade na igreja

Dois dias após sua eleição, o novo papa mantém todo o topo da burocracia da Igreja Católica em Roma nos seus cargos até segunda ordem

IGOR GIELOW
ENVIADO ESPECIAL A ROMA

Dois dias após sua eleição, o papa Bento 16 tomou sua primeira medida administrativa. Manteve todo o topo da burocracia da Igreja Católica em Roma nos seus cargos, "donec aliter provideatur" -frase em latim que significa "até outras providências", ou seja, até segunda ordem.
Com isso, o alemão Joseph Ratzinger garante a governabilidade da igreja, a começar pelo seu número 2, o cardeal italiano Angelo Sodano, mantido no cargo de secretário de Estado com seus dois adjuntos. O cardeal serviu 14 anos no cargo sob João Paulo 2º, mas, aos 77 anos, Sodano já ultrapassou em dois a idade em que o Vaticano pede a demissão do seus altos funcionários, o somado à menção às futuras mudanças, indica que Bento 16 deverá promover alterações na Cúria Romana.
Historicamente Ratzinger era um defensor de uma igreja centralizada, e especula-se que ele favorecerá uma redução no tamanho da burocracia em Roma. Ninguém sabe ao certo o tamanho da máquina: uma vez perguntado, o bonachão papa João 23 (1958-63) respondeu: "É a metade". A Cúria é formada por dicastérios, que é o nome dado às diversas congregações, tribunais eclesiásticos, conselhos, órgãos da administração do Vaticano e outros. Há cerca de 3.000 funcionários, entre contratados e prestadores de serviços.
Os dicastérios são chefiados normalmente por cardeais, com arcebispos logo abaixo, descendo a bispos, monsenhores até o nível básico de padre. Há leigos nos andares de baixo da estrutura.
Só não foi anunciado quem sucederá a Ratzinger na poderosíssima Congregação para a Doutrina da Fé, que ele liderou por quase 24 anos sem concessão a elementos que considerava modernizantes em termos teológicos. Perseguiu religiosos e ajudou a quebrar a espinha da chamada "igreja progressista" na América Latina. Como virou papa, o cargo ficou vago. Entre os candidatos em especulação estão o arcebispo de Viena, Christoph Schönborn, muito ligado a Ratzinger.
O papa emitiu mais um sinal conciliatório ontem, após ler anteontem uma homilia em que falava com surpreendente abertura de temas como ecumenismo, ao enviar um telegrama para o rabino-chefe de Roma, Riccardo di Segni. Pediu ao "Altíssimo para continuar o diálogo e reforçar a colaboração com os filhos e filhas do povo hebreu".
Além da questão do ecumenismo em si, que como cardeal Ratzinger combateu em termos teológicos, o contato mostra normalidade numa relação que alguns temem poder azedar, já que quando adolescente o alemão foi convocado a servir na Juventude Hitlerista e, depois, nas Forças Armadas nazistas. João Paulo 2º havia sido o primeiro papa a entrar numa sinagoga, em 1986.
A impressão que se tem em Roma é a de que Bento 16 adotará, pelo menos nos primeiros sinais externos, uma postura mais flexível do que a do ultraconservador Ratzinger. A análise só poderá ser feita com o correr do tempo.
Bento 16 celebra no domingo sua primeira missa pública, na qual receberá o Anel do Pescador, símbolo do poder papal que faz referência à profissão do primeiro líder da Igreja Católica, são Pedro. O governo da Itália e o do Vaticano estão preparando um esquema de segurança semelhante ao adotado no funeral de Karol Wojtyla. Estima-se aproximadamente 500 mil fiéis na missa, um pouco menos do que no enterro do dia 8 passado.
Enquanto isso, mantém uma agenda relativamente cheia. Além das duas visitas externas a seu antigo apartamento ontem e anteontem, perto do Vaticano, Bento 16 faz hoje um encontro com todos os cardeais que ainda estão em Roma.


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