São Paulo, terça-feira, 22 de maio de 2007

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Confrontos no Líbano matam nove civis

No segundo dia de choques, Exército bombardeia campo de refugiados palestino para conter grupo radical islâmico

Total de mortos em dois dias se aproxima de 60, na crise interna mais sangrenta no país desde a guerra civil; premiê acusa governo sírio

Nabil Mounzer/Efe
Bombardeios do Exército libanês envolvem em fumaça o campo de refugiados palestino de Nahr al Bared, norte do país; além da violência, os refugiados começaram a sofrer desabastecimento

TARIQ SALEH
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
DE BEIRUTE


Os combates entre tropas do Exército libanês e militantes do grupo islâmico radical Fatah al Islam continuaram intensos ontem pelo segundo dia consecutivo, deixando ao menos nove mortos no campo de refugiados palestino de Nahr al Bared, perto de Trípoli (norte).
É o mais sangrento episódio interno ocorrido no Líbano após a guerra civil (1975-1990). Desde domingo, quando começaram as hostilidades, pelo menos 60 pessoas foram mortas -30 soldados, 15 militantes e 15 civis. Mas a informação não pôde ser confirmada devido à dificuldade de acesso ao campo de refugiados.
Durante o dia de ontem, colunas de fumaça eram vistas a quilômetros de distância e o som da artilharia era audível de outras cidades. Os militares usaram tanques e bombardearam o campo sem piedade. Além de causar a morte de civis, provocaram um isolamento que levou à falta de alimentos e medicamentos no campo de Nahr al Bared, onde vivem pouco mais de 30 mil palestinos.
Organizações humanitárias acusaram o Exército libanês de atacar indiscriminadamente o campo e não deixá-las chegar aos feridos. Uma tensa trégua combinada entre as partes para retirar feridos durou pouco.
O fracasso do cessar-fogo obrigou funcionários da ONU e da Cruz Vermelha a sair às pressas do campo. Segundo eles, algumas casas de civis dentro do campo foram completamente destruídas.
Não se sabe ao certo o número de vítimas, mas uma professora residente no campo, que se identificou como Enas, disse à Folha, por telefone, que havia cerca de 125 feridos: "Há crianças e elas estão assustadas e com fome, não aguentarão mais que dois dias".
O porta-voz do Fatah al Islam, Abu Salim, ameaçou levar a guerra para fora da cidade se o Exército continuar os bombardeios. "Eles não estão apenas atirando, estão descarregando a artilharia cegamente", disse. O Fatah al Islam é apontado como braço da rede terrorista Al Qaeda. O grupo nega, mas admite que concorda com alguns dos métodos do grupo liderado por Osama bin Laden.

Isolamento
O líder da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) em Beirute, Abbas Zahki, disse à Folha que há vários meses tentava isolar o Fatah al Islam e expulsá-lo dos campos.
"Eles não representam nenhuma ideologia do povo palestino", disse Zahki, que também criticou o Exército libanês. "O Exército só está causando sofrimento aos civis. Devemos negociar um acordo."
Devido a um acordo de 1969, assinado no Cairo, as forças de segurança libanesas não podem entrar nos 12 campos de refugiados palestinos que existem no Líbano. A segurança nesses locais é responsabilidade das facções palestinas.
As hostilidades tiveram início no domingo, quando forças de segurança libanesas tentaram prender suspeitos de um roubo a banco no centro de Trípoli. Os suspeitos, membros do Fatah al Islam, resistiram à prisão e seus colegas atacaram postos militares, matando vários soldados libaneses.
O Exército respondeu bombardeando o campo de Nahr al Bared e cercando o edifício no centro de Trípoli. A cidade virou um campo de batalha, com civis no fogo cruzado, enquanto os militares tentavam tomar o prédio. Em uma das sacadas, três militantes disparavam ao lado de uma bandeira do Brasil (resquício da última Copa do Mundo).
Quase à meia-noite de ontem (18h de Brasília), um novo atentado sacudiu Beirute. Um carro com explosivos foi detonado no bairro sunita de Verdun, área residencial conhecida pelo comércio de luxo, deixando quatro feridos.
Centenas de pessoas acompanharam os trabalhos dos bombeiros. Verdun é uma área residencial e comercial de luxo, com shopping centers e lojas de grife. O local da explosão foi cercado e a perícia isolou os destroços do carro para os trabalhos de investigação. Slogans anti-Síria podiam ser ouvidos entre a multidão. "Eles nos deram um recado. Agora vamos revidar", gritavam alguns jovens exacerbados.
Na noite de domingo, uma outra explosão havia destruído lojas no coração do bairro cristão de Achrafieh, em Beirute, deixando uma mulher morta.
O premiê libanês, Fuad Siniora, acusou a Síria de estar por trás dos atentados e dos confrontos em Trípoli. "Tentam usar o medo como arma e usam os palestinos como marionetes", disse.
Segundo Siniora, o objetivo da Síria é impedir o julgamento dos autores do assassinato do ex-premiê Rafik Hariri, em 2005.


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