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Cessar-fogo com Israel é possível, diz líder do Hamas
Dirigente de Gaza recusa, no entanto, negociação direta com governo israelense
Para Mahmoud Zahar, gabinete de união nacional dissolvido pelo presidente Abbas ainda é o governo "legal" dos palestinos
MARCELO NINIO
DA REDAÇÃO
Em 26 de janeiro de 2006,
ainda sob o impacto da surpreendente vitória do Hamas
nas eleições palestinas do dia
anterior, o médico Mahmoud
Zahar, um dos principais líderes do grupo islâmico, não previu problemas em dividir o poder com o rival Fatah, que acabara de ser derrotado após monopolizar a política palestina
por quatro décadas.
"Isso foi feito na França, por
exemplo", disse então à Folha.
"O presidente era de um partido e o premiê de outro. Portanto, não vejo problema."
Mais de um ano e meio depois, o discurso é outro. A tentativa de coabitação terminou
com uma miniguerra civil que
deixou mais de cem mortos. O
Hamas tem o controle total de
Gaza e os palestinos estão mais
divididos do que nunca.
"Nos livramos de um regime
profundamente corrupto e
agora podemos cuidar das necessidades do povo palestino",
disse Zahar ontem à Folha, por
telefone. Chanceler do gabinete formado após a vitória do
Hamas, Zahar, considerado um
dos ideólogos da ala radical do
grupo, ficou fora do fracassado
governo de união palestino formado em março, mas parece
ter recuperado sua influência
após a tomada de Gaza. Tem sido apontado como o principal
líder do Hamas nesta nova fase.
Zahar continua se recusando
a negociar com Israel, mas admite um cessar-fogo para cuidar das necessidades básicas da
população de Gaza. Leia a seguir trechos da entrevista.
FOLHA - Agora que expulsou o Fatah, o que o Hamas vai fazer com
Gaza?
MAHMOUD ZAHAR - Temos que
ajudar o povo palestino de todas as formas possíveis. Já conseguimos trazer segurança.
Também vamos ter sucesso nos
serviços sociais, em dar salários
para todos. E vamos continuar
a lutar para obter uma solução
final para os nossos problemas.
Nos livramos de um regime
profundamente corrupto e
agora podemos cuidar das necessidades do povo palestino.
FOLHA - O Hamas vai continuar governando Gaza ou pretende voltar a
dividir o poder com o Fatah?
ZAHAR - Não há mais governo
do Fatah. O que há é um governo ilegal, estabelecido pelo senhor [Mahmoud] Abbas, e o governo legal, de união, que representa Gaza e parte da Cisjordânia.
FOLHA - O Hamas não aceita negociar com o governo israelense, mas
depende dele para muitas coisas,
como a passagem de pessoas e mercadoria na fronteira.
ZAHAR - Estamos esperando
pelas ações deles. Se eles continuarem a permitir que os serviços básicos sejam prestados ao
nosso povo, tudo bem. Caso
contrário, teremos que falar
com o Egito.
FOLHA - O senhor quer dizer que o
Hamas poderia negociar com Israel?
ZAHAR - Negociar o quê? Não
temos nada a falar com eles, a
não ser sobre a ajuda essencial,
de emergência, como alimentos. Eles não têm um projeto a
oferecer ao povo palestino.
FOLHA - O Hamas vai impedir o disparo de foguetes contra Israel?
ZAHAR - Essa resposta deve ser
dada antes de tudo pelos israelenses. Eles estão dispostos a
parar com a agressão contra os
palestinos em Gaza? Ontem
eles mataram seis palestinos.
FOLHA - O Hamas está disposto a
aceitar um cessar-fogo?
ZAHAR - Se os israelenses estiverem dispostos a parar sua
agressão nós poderemos discutir um cessar-fogo, com a intermediação dos egípicos. Até agora todos os cessares-fogos fracassaram por culpa de Israel.
FOLHA - O Egito anunciou hoje que
sediará uma conferência de apoio
ao Fatah. Ainda assim o senhor considera possível a mediação egípcia?
ZAHAR - Os egípcios apoiarem
o senhor Abbas não é novo. O
importante é que temos o apoio
do povo palestino.
FOLHA - Como o Hamas sobreviverá a esse crescente isolamento?
ZAHAR - Já passamos por períodos piores, de boicote dos
Estados Unidos e da União Européia, e mesmo assim conseguimos ajudar o povo palestino.
Esses boicotes não significam
que perdemos o apoio da comunidade internacional.
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