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"Mãe, tenho de fugir do furacão", diz brasileira
Olívia recebeu com indiferença as instruções sobre o furacão. No supermercado, percebeu o momento grave
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
"Mãe, tenho que fugir do furacão." Eu estava em casa pela manhã, lendo jornal, mais preocupada com a renúncia do Severino
Cavalcanti do que com o noticiário internacional, quando o telefone tocou. Era minha filha.
Olívia Tolentino, 26, mudou-se
com o marido, Paulo Fortes, 34,
em julho último para Houston, no
Texas. Recebeu com indiferença
brasileira as primeiras instruções
sobre como prevenir-se da chegada do furacão Rita. "Compre água
mineral, bebidas isotônicas e cooler com pacotes de gel para manter a bebida gelada", dizia uma
delas.
No supermercado anteontem,
ela percebeu a seriedade do momento e que muita gente havia se
antecipado a ela. ""Me dei conta da
situação quando vi as gôndolas
vazias", disse.
Voluntária no atendimento dos
refugiados do Katrina, acomodados no estádio Astrodome, Olívia
via-se sob o risco de ser um deles.
Filha de dois jornalistas, mas
formada em administração de
empresas, casada com um engenheiro, saiu às ruas e me fazia relatos de repórter.
Por telefone, ela informava: as
rodovias interestaduais 10 e 45,
que dão acesso à cidade, já estavam engarrafadas à tarde, quando
deixavam o apartamento com
destino a San Antonio, a 300 km
de distância, também no Texas.
Eram 13h10, no horário local.
Muitas lojas estavam fechadas,
mas os supermercados permaneciam abarrotados de pessoas que
corriam para estocar água mineral e alimentos não perecíveis.
""Estamos traumatizados com o
que aconteceu em
Nova Orleans. Há
uma tensão no ar,
mas, fora isso, nada sugere que um
desastre esteja a
caminho", relata-me Paulo, aos
atropelos.
Grau 5
A televisão acabara de informar
que o furacão Rita
havia atingido o
grau 5 de intensidade. Desligam a TV, colocam o
aparelho no chão, seguindo a
orientação da administração do
edifício, e saem de casa, levando
documentos, roupas e os bens de
maior valor sentimental.
Recém-casados, deixaram o Rio
de Janeiro, contratados por uma
multinacional de petróleo. Ontem
à tarde, a empresa liberou os funcionários para cuidarem de suas
coisas ou deixarem a cidade.
Os moradores começaram a tomar providências na terça-feira.
Minha filha conta que, pouco depois do almoço, recebeu de colegas de trabalho um roteiro com as
medidas que deveria tomar, caso
permanecesse na cidade.
A primeira providência é encher o tanque do carro para o caso
de remoção dos moradores. A
medida seguinte é ter em mãos
uma receita médica para a compra
de medicamentos
de primeiros socorros.
Uma das conseqüências prováveis do furacão é o
corte de energia
elétrica. Como a
maioria das casas
tem fogão elétrico, as famílias são
aconselhadas a
comprar carvão e
fluido para poderem cozinhar em churrasqueiras.
""Recarregue o celular, tire dinheiro, lave roupas e lençóis",
prossegue o roteiro. Outro passo é
comprar martelo, pregos, fita isolante, ripas de madeira e plásticos
para preparar a casa. As fitas isolantes são usadas para diminuir a
chance de que portas e janelas de
vidro sejam quebradas pela força
do vento.
Ainda em relação à casa, recomenda o ""check-list" antifuracão,
para que as famílias limpem os
quintais e retirem os móveis das
varandas, para evitar que ""saiam
voando".
Ao chegar ao apartamento, o
casal recebeu novas instruções,
desta vez da administração do
edifício.
Entre as recomendações estava:
encher a banheira com água, para
a eventualidade de suspensão do
abastecimento, verificar se há
possibilidade de o bairro alagar,
passar fitas nas portas e janelas e
buscar proteção em um cômodo
seguro na hora do furacão.
Nas empresas, os funcionários
foram instruídos a proteger equipamentos e documentos importantes. Minha filha conta que a
empresa em que trabalha instalou
um serviço de informação por telefone, que funcionará 24 horas
por dia, para que os funcionários
possam receber instruções. As demais linhas telefônicas foram desligadas.
Na saída, Olívia buscou seguir
uma última recomendação: levar
consigo seus documentos pessoais e objetos de valor sentimental, porque poderiam nunca mais
reavê-los. Ao terminar esse texto,
falei novamente com Olívia por
telefone para saber a quantas andava. Não andava. Estava presa
no engarrafamento do acesso à
rodovia 45.
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