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São Paulo, quarta-feira, 22 de outubro de 2003

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TENSÃO

Ministros francês, alemão e britânico obtêm concessão em visita a Teerã; EUA dizem que querem ver promessa se concretizar

Pressionado, Irã pára de processar urânio

DA REDAÇÃO

Na presença dos ministros do Exterior de França, Reino Unido e Alemanha, o Irã concordou ontem em suspender seu programa de enriquecimento de urânio e a assinar um protocolo adicional ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear, o que permitiria à AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), ligada à ONU, inspeções mais frequentes e aprofundadas a suas instalações.
Os EUA, que têm mantido forte pressão sobre o regime iraniano, reagiu à decisão com ressalvas, dizendo que a promessa iraniana deve se traduzir em fatos concretos. Trata-se de "um passo que apenas será positivo se for integralmente implementado", disse Scott McClellan, porta-voz do presidente George W. Bush.
A decisão iraniana interrompe um cerco diplomático que poderia mais uma vez levar o país ao isolamento internacional. Os EUA colocaram o Irã num "eixo do mal" -junto com a Coréia do Norte e o Iraque pré-guerra- e vinham ameaçando buscar sanções internacionais contra o país.
A AIEA estipulara o próximo dia 31 como prazo final para que a República islâmica abrisse suas instalações a inspeções detalhadas e fornecesse o histórico completo de suas atividades nucleares.
Os ministros Jack Straw (britânico), Dominique de Villepin (francês) e Joschka Fischer (alemão) decidiram viajar ao Irã para convencer o país a evitar o impasse. Os três reuniram-se por quatro horas com dirigentes iranianos, incluindo o presidente do país, Mohamad Khatami.
Straw foi quem reagiu de modo mais cauteloso à concessão iraniana. "O que importa não são os termos do comunicado [conjunto], mas a forma pela qual o Irã cumprirá suas obrigações com a agência [AIEA]", disse ele.
Na declaração assinada com os ministros europeus, o secretário do Conselho Supremo de Segurança Nacional, Hassan Rowhani, reafirmou "que a produção de armas nucleares não faz parte da doutrina de defesa iraniana".
Rowhani disse que a suspensão do enriquecimento de urânio era uma decisão unilateral iraniana e que seu governo poderia revogá-la no momento apropriado.
"É possível que tomemos essa decisão dentro de um dia ou dentro de um ano. O importante é sublinhar que a decisão nos pertence", afirmou Rowhani, em declaração aparentemente destinada a confortar as alas mais radicais do público e do regime iraniano.
O país alega que o objetivo de seu programa nuclear é produzir energia, embora o país tenha grandes reservas de petróleo.
A questão nuclear é vista como tabu pelas lideranças xiitas mais ortodoxas, enquanto o presidente reformista é favorável a concessões que favoreçam a reinserção iraniana na comunidade internacional. Villepin procurou aparentemente reagir de modo a reforçar a posição de Khatami e seu grupo. "O dia hoje é muito importante. Proliferação é um problema maior para o mundo, e agora encontramos uma solução para uma questão pendente", disse.
França, Alemanha e Reino Unido haviam proposto fornecer urânio enriquecido ao Irã, para que o país não precisasse enriquecer seu próprio combustível. A Rússia, principal colaboradora do programa iraniano -apesar das pressões dos EUA-, também se comprometeu a fazer o mesmo.

Ganhar tempo
Em Londres, Rosemary Hollis, do Instituto Real para Assuntos Internacionais, disse ter sido dado só um primeiro passo para aliviar a crise e que o Irã ganhou tempo. "Os iranianos crêem que o desenvolvimento de alguma capacidade [nuclear] é de seu interesse nacional. Não vêem razão para não tê-la, especialmente vendo o que ocorre na Coréia do Norte: tendo capacidade nuclear, todos as negociações são possíveis e as ações militares são menos prováveis."
Para a analista, a concessão feita ontem em Teerã não é suficiente para tranquilizar a administração americana.
Já David Albright, ex-inspetor de armas da ONU e pesquisador do Instituto de Ciência e Segurança Internacional, disse que os EUA deveriam aprender com a missão européia que a política de engajamento é mais efetiva do que as ameaças de Washington. "O Irã está respondendo. Creio que isso deveria levar os EUA a pelo menos repensar sua política isolacionista em relação ao Irã."


Com agências internacionais

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