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Relator da ONU quer asilo do Brasil a preso de Guantánamo
Manfred Nowak afirma que receber ex-detento de prisão americana não seria risco
Coautor de relatório sobre o
centro de detenção, jurista
deve apresentar às Nações
Unidas em março de 2010
texto sobre prisões secretas
ANDREA MURTA
DA REDAÇÃO
Se o governo dos EUA encontra resistência entre aliados europeus na realocação de suspeitos de terrorismo detidos na
prisão de Guantánamo (Cuba),
esforços na América Latina
têm tido ainda menos sucesso
-o que não impede que um
crescente número de vozes argumente a favor do envio de alguns deles para o Brasil.
É o caso do jurista austríaco
Manfred Nowak, relator especial da ONU para a tortura, para
quem o país não teria aumento
no risco de segurança ao receber um preso do centro de detenção, símbolo da "guerra ao
terror" do ex-presidente dos
EUA George W. Bush. "Há muita gente solta no Brasil que pode ser perigosa e ninguém sabe.
[No caso do detento de Guantánamo], se há alguma suspeita,
sempre se pode monitorar",
disse ele à Folha ontem, em
São Paulo, onde participou de
seminário internacional sobre
os direitos humanos promovido pelo governo do Estado.
O presidente Barack Obama
pretendia fechar a prisão até
janeiro próximo, mas já admitiu que o prazo não será cumprido. Um dos problemas é o
destino dos detentos.
"Sou a favor de todos receberem presos de Guantánamo. Se
todos os países do mundo aceitassem ao menos um detento, o
problema estaria resolvido",
afirmou Nowak.
A ideia não é exatamente nova no governo brasileiro -em
março, o ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial
de Direitos Humanos, afirmou
que, "do ponto de vista dos direitos humanos, é a favor" de o
país abrigar ex-detentos da prisão. Vannuchi deixou a decisão
para o chanceler Celso Amorim, que ainda não tem posição
fechada sobre o tema.
O Itamaraty afirma que, apesar de não haver política oficial
a respeito, em geral o país recebe presos de nacionalidade
brasileira e por questões humanitárias. Alocar ex-detentos
de Guantánamo estaria, portanto, fora dos padrões.
Para Nowak, situação similar
ocorre na Europa: "Ministros
dos direitos humanos ou mesmo chanceleres estão dispostos a receber os detentos, mas
membros linha-dura dos governos afirmam que isso seria
um risco". "Há muitos países
que já os receberam e não houve riscos, como o Reino Unido.
Devemos parar de pensar que
essas pessoas são as mais perigosas do mundo e são a "representação do mal'", diz.
Na região, as Bermudas já
aceitaram receber detidos de
Guantánamo.
Novos rumos
Apesar de elogiar os esforços
de Obama para fechar Guantánamo, que abriga hoje 198 presos, o relator diz ter encontrado
problemas para investigar a
prisão também neste governo.
Como ocorrera sob Bush,
seus pedidos para entrevistar
detentos em particular foram
negados. "Fui convidado a ir da
mesma maneira que congressistas vão, quase como uma visita turística. É absurdo", diz.
Coautor do relatório de 2006
da ONU sobre Guantánamo,
ele discorda de parte do caminho escolhido pela Casa Branca
para dar cabo da prisão, principalmente a perspectiva de alguns presos serem julgados em
comissões militares ou permanecerem detidos indefinidamente sem julgamento.
"Temos que sair desse paradigma de guerra", afirmou. "Esse presos são acusados de crimes, e como tais devem ser julgados em tribunais penais domésticos ou soltos."
Além da investigação sobre
Guantánamo, Nowak hoje estuda prisões secretas pelo
mundo ao lado do relator especial da ONU para o terrorismo,
Martin Scheinin. Suas conclusões serão apresentadas ao
Conselho de Direitos Humanos
da ONU em março de 2010.
Nesse caso, não são só os
EUA que estão na berlinda.
"Não se pode estabelecer "zonas negras" sem que ao menos
algumas pessoas da inteligência e do governo dos países-base saibam. Houve uma cooperação próxima entre os sistemas de inteligência não só na
Europa mas também no Oriente Médio e com países particulares de origem de suspeitos de
terrorismo, como Egito, Jordânia, Síria, Arábia Saudita."
Em São Paulo, Nowak discutiu, ao lado de Paulo Sérgio Pinheiro, comissário interamericano de direitos humanos, e de
convidados internacionais a
criação de uma Corte Mundial
de Direitos Humanos, à qual vítimas de abusos poderiam levar
seus casos. Segundo Pinheiro, o
rascunho da ideia já foi apresentado a cerca de 30 países e
obteve apoio de 15. "O Brasil
ainda não deu resposta formal,
mas temos recebido sinais positivos", disse Pinheiro.
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