São Paulo, sábado, 23 de fevereiro de 2008

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Kosovo leva a confronto de EUA e Rússia

Diplomata russo ameaça com uso da força; Departamento de Estado qualifica a afirmação de "altamente irresponsável"

Putin diz que independência de Kosovo é "precedente terrível"; americanos tiram famílias de diplomatas após queima de Embaixada

Marko Djurica/Reuters
Soldado americano da Otan faz barreira em Kosovo contra protesto sérvio do outro lado da fronteira


DA REDAÇÃO

As tensões geradas pela declaração unilateral de independência de Kosovo, no domingo, colocaram ontem em confronto direto os Estados Unidos, partidários dos kosovares, e a Rússia, que apóia a Sérvia e não aceita a secessão do território.
Em Moscou, Dmitri Rogozin, representante russo na Otan, a aliança militar ocidental liderada pelos americanos, afirmou que seu país poderá "utilizar a força" caso o bloco militar e a União Européia extrapolem suas atribuições e contrariem decisões da ONU sobre Kosovo.
Rogozin não é do primeiro escalão do Kremlin. A ameaça teria um peso maior se partisse de um ministro. É pouco provável que forças russas invadam o Kosovo, cuja segurança é assegurada por 16 mil militares da Otan (americanos, britânicos, franceses ou alemães).
O próprio diplomata, em teleconferência com jornalistas em Bruxelas, descartou depois a hipótese de conflito direto.
Mas os Estados Unidos ficaram perplexos. O número três do Departamento de Estado, Nicholas Burns, qualificou em Washington a afirmação de Rogozin de "altamente irresponsável", expressão bastante forte no jargão diplomático. Ele exortou o governo russo a repudiar as declarações de seu diplomata, que considerou "cínicas e anacrônicas".
Horas depois o presidente Vladimir Putin deu declarações. Ignorou Rogozin e afirmou que a independência de Kosovo é um "precedente terrível" que golpearia "no rosto" as potências ocidentais. O episódio, disse, "acabará destruindo todo o sistema de relações internacionais, desenvolvido durante décadas".
Ao mesmo tempo, e sem citar os Estados Unidos, o porta-voz da diplomacia russa, Mikhail Kamynin, responsabilizou os ocidentais pelos "lamentáveis" atos de violência ocorridos na véspera em Belgrado, quando a embaixada americana foi invadida e incendiada por manifestantes exaltados.
"As forças que apoiaram o reconhecimento unilateral de Kosovo deveriam estar conscientes das conseqüências dessa decisão", afirmou.
A secretária de Estado Condoleezza resposabilizou o governo sérvio pelo ataque à embaixada. "Eles tinham a obrigação de proteger missões diplomáticas", disse Rice ontem. "Esperamos que isso não aconteça novamente."
O primeiro-ministro sérvio, Vojislav Kostunica, lançou um apelo à calma e condenou duramente a invasão e o início de incêndio, na quinta, da embaixada americana. O ministro da Defesa, Dragan Sutanovac, afirmou que a quinta-feira "foi um dos dias mais tristes" da história recente de seu país e acusou os grupos ultranacionalistas de insuflarem a violência.
O chanceler sérvio, Vuk Jeremic, disse que os atos de vandalismo "provocaram um grande prejuízo diplomático" ao país.
A União Européia pediu que a Sérvia seja mais eficiente na proteção às missões estrangeiras e advertiu que negociações sobre a adesão do país ao bloco seriam suspensas em caso de novos atos de violência. Em Washington, o Departamento de Estado determinou que diplomatas não-essenciais e familiares de todo o pessoal da embaixada deixem Belgrado.

Novos protestos
Cerca de 5.000 sérvios de Kosovo -onde são 7% da população- agrediram ontem policiais da ONU com pedras e garrafadas em Kosovska Mitrovica, cidade mineira de 100 mil habitantes, também habitada por kosovares de origem albanesa (88% da população).
"Kosovo é da Sérvia e nunca nos renderemos, apesar da chantagem da União Européia", gritavam os manifestantes, ao serem dispersados.
Soldados franceses da Otan não permitiram que moradores da Sérvia vizinha engrossassem o grupo. Desde domingo, quando Kosovo declarou unilateralmente sua independência, imóveis ocupados pela Otan e pela ONU foram vandalizados.
A Província está sob controle da ONU e da Otan desde 1999, quando a aliança militar interveio contra a repressão sérvia aos separatistas kosovares. A resolução do Conselho de Segurança que pôs fim ao conflito reconheceu, na época, a soberania sérvia sobre o território.


Com agências internacionais


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