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São Paulo, domingo, 23 de março de 2003

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GUERRA DE AUDIÊNCIA

Repórteres convivem com soldados 24 horas por dia e se arriscam como eles

Conflito vira "reality show" na TV


Walter Rodgers, correspondente da CNN, quase foi vítima de um ataque na última quinta-feira. Ele acompanha o 7º Regimento de Cavalaria. Estava ao vivo, quando bombas explodiram perto de suas tropas


LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Redes de TV norte-americanas estão avançando rumo a Bagdá junto com as tropas dos Estados Unidos. Convivendo 24 horas com os soldados, nos momentos de ação e de descanso, os enviados especiais estão dando um clima de "reality show" às transmissões da guerra.
No front, repórteres acabam correndo praticamente os mesmos riscos que os militares.
Walter Rodgers, por exemplo, correspondente da CNN, quase foi vítima de um ataque iraquiano na última quinta-feira. Ele acompanha o 7º Regimento de Cavalaria, um dos mais importantes na ofensiva contra o Iraque. Estava ao vivo, quando bombas chegaram bem perto de suas tropas.
Nesse dia movimentado, Rodgers entrou várias vezes no ar, mostrando em tempo real a movimentação norte-americana no deserto do sudeste do Iraque, rumo a Bagdá. Mais duas pessoas fazem parte de sua equipe: o cameraman Charlie Miller e o engenheiro de satélite Jeff Barwise.
Os três seguem a bordo de um veículo próprio, um Humvee. Trata-se de uma espécie de van grande e quadrada, que lembra um pequeno tanque de guerra. O carro, que também é usado por norte-americanos nas ruas das cidades, tem tração nas quatro rodas e é ideal para trilhas com obstáculos muito difíceis.
Nesse caso, o transporte foi internamente adaptado, transformado em um estúdio móvel, capaz de captar imagens e editar reportagens. Para as transmissões ao vivo, Rodgers (como a maioria dos correspondentes internacionais) usa videofone. O aparelho, portátil, foi a novidade tecnológica do confronto no Afeganistão e tornou-se indispensável por ligar a câmera de vídeo a um satélite.
Quando os soldados param para descansar, é hora de entrevistá-los e, como nos "reality shows", de investir nos dramas pessoais. Em movimento, os militares são acompanhados por uma câmera portátil, que Miller segura na janela do Humvee. Por isso, essas imagens costumam ser tremidas.
Rodgers tentou descrever a sensação de estar ao lado dos tanques dos EUA, em um artigo para o site da CNN: "Imagine uma onda gigante de aço cruzando o deserto do sudeste do Iraque. E imagine que a cada hora essa onda cresce em tamanho e número".
Outro repórter da CNN que faz parte do chamado grupo de jornalistas "embedded" (algo como encaixado, embutido) é Martin Savidge, que passou pela mesma experiência na Operação Anaconda, uma das maiores do conflito no deserto do Afeganistão.
Àquela época, no entanto, a presença de jornalistas em tropas foi eventual e não em grande escala e com a regularidade de agora.
Esse projeto foi organizado pelo próprio Pentágono e, pela pronúncia do termo "embed", já foi apelidado de "na cama ("in bed') com o Pentágono". Não foram divulgados números exatos, mas chega-se a falar em centenas de correspondentes, incluindo repórteres de jornais, revistas e internet. Outra novidade foi a aceitação de jornalistas por agrupamentos do exército britânico.
A CNN não quis revelar quantos de seus funcionários estão com as tropas, nem quais regimentos acompanham. Larissa Pissara, assessora de imprensa da rede, sediada em Atlanta, afirmou à Folha que a decisão foi tomada "por questões de segurança".
A maior concorrente local da CNN, a Fox News, lista em seu site os principais jornalistas escalados para o esquema "reality show". Rick Leventhal e Oliver North estão com os fuzileiros navais (marines) e Greg Kelly segue a 3ª Divisão de Infantaria.

Maior investimento
Apesar dos riscos, esse tipo de cobertura passou a ser o maior investimento das TVs norte-americanas, já que seus enviados foram expulsos de Bagdá pelo governo iraquiano (até sexta-feira, apenas Peter Arnett, da NBC, ainda permanecia na capital iraquiana).
De acordo com reportagem da revista "Variety", dos EUA, o Pentágono vem chamando de "unilaterais" jornalistas excluídos do programa de acompanhamento das tropas que tentam fazer reportagens independentes no Iraque. Não o contrário.


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