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São Paulo, domingo, 23 de março de 2003

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CICATRIZES

Safwan receia a volta de Saddam

Cidade tomada pelos EUA festeja

DO "THE NEW YORK TIMES",
EM SAFWAN

Felicidade e terror surgiram juntas hoje nesta desolada cidade de fronteira, onde alguns dos primeiros iraquianos sob controle das tropas americanas e britânicas tiveram a alegria de sua libertação silenciada pelo medo de que ela fosse boa demais para durar.
Quando milhares de soldados da coalizão chegaram aqui logo depois do raiar do dia, o coração da cidade que sentiu os extremos do regime de Saddam pareceu explodir, com aldeões correndo pelas ruas para celebrar, gargalhando e chorando em longos gritos.
"Oooooo, que a paz esteja com você, que a paz esteja com você, que a paz esteja com você, oooooo", gritou Zahra Khafi, 68, mãe de cinco, para um grupo de americanos e britânicos. "Eu não tenho mais medo de Saddam."
Dois anos atrás, disse Khafi, seu filho Masood, de 39 anos, foi assassinado por capangas de Saddam pelo mero crime de devoção a uma corrente do Islã fora dos favores oficiais. Ao contar sua história, Khafi implorou aos visitantes que ficassem para protegê-la. "Saddam vai voltar?"
Durante todo o dia, Safwan parecia celebrar o colapso da autoridade de Saddam Hussein olhando por cima do ombro.
Apenas algumas horas antes, disseram os locais, a Mukhabarat, força de segurança de Saddam, vinha mantendo Safwan em um estado de terror quase permanente. Mesmo agora, afirmaram, os agentes do ditador estavam esperando o momento de voltar -como fizeram há doze anos.
"Ali há homens de Saddam, e se você me deixar eles me matam agora mesmo", disse Najah Neema, ex-soldado iraquiano. Ele temia que os americanos fossem perder o ânimo, como em 1991, quando um levante incitado por eles no sul do Iraque caiu diante de um assalto de Saddam que não produziu resposta americana.
Uma das pessoas para quem Neema apontou com tanto medo foi Tawfik Mohammed, um homem bem vestido que estava a alguns metros dali. Mohammed riu diante da sugestão de que tivesse um dia trabalhado para o regime de Saddam. Ele era diretor da escola local, um homem de respeito.
"Se Deus quiser, a Mukabarhat vai voltar", afirmou, com um aceno, e foi embora.
Boa parte dos festejos hoje veio de marines americanos, que rasgaram todos os pôsteres gigantes de Saddam Hussein que decoravam a vila. Um deles foi amarrado ao pára-choques de um carro de tropas e cortado com uma faca.
"Isso é bom", disse Oscar Guerrero, marine do Texas, enquanto deslizava sua faca pela tela com a pintura do líder iraquiano. "Queria que fosse ele em pessoa."


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