São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 2006

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ESPANHA

Premiê mantém cautela; se cumprida, trégua que entra em vigor amanhã porá fim a campanha terrorista de quase 40 anos

ETA anuncia cessar-fogo permanente

ANTÓNIO TORRES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM MADRI

O grupo separatista basco ETA anunciou a adoção de "um cessar-fogo permanente", a partir de 0h de amanhã, que, se efetivamente cumprido, porá fim a quase 40 anos de atentados terroristas que mataram cerca de 800 pessoas na Espanha.
O anúncio foi feito ontem, ao meio-dia, por três pessoas com os rostos cobertos por capuzes, em vídeo transmitido pela televisão pública do País Basco. O mesmo comunicado, lido diante das câmeras por uma voz feminina, foi em seguida publicado pela edição on-line do jornal basco "Gara".
"Nosso objetivo é impulsionar o processo democrático no País Basco", dizia o texto. O grupo, considerado terrorista pela União Européia e pelos EUA, lançou um apelo por um referendo que defina o grau de autonomia daquela região. A locutora também pediu que a França e a Espanha -os bascos estão dos dois lados da fronteira, ao norte dos Pirineus- "respondam positivamente, sem fazer uso da repressão".
ETA é a sigla de Euskadi Ta Askatasuna, que significa "Pátria Basca e Liberdade". Ele foi fundado em 1959 com objetivo de reunificar os bascos espanhóis e franceses num Estado independente e socialista. A causa perdeu muito de seu fôlego no final dos anos 70, quando a redemocratização da Espanha deu autonomia às Províncias com idioma próprio.
O premiê espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, reagiu com prudência, declarando que a pacificação definitiva do País Basco "será um processo difícil, que, para ser cumprido, precisará de todas as forças políticas da Espanha, sobretudo do Partido Popular", principal grupo de oposição.
Mas o líder do PP, Mariano Rajoy, disse ter dúvidas sobre as intenções do grupo, questionando se o anúncio não se trata apenas "de uma nova pausa nas atividades criminosas" do ETA.

Diálogo político
O PSOE, partido de Zapatero, e o PP têm se enfrentado em razão do conflito basco. O PP acredita que os socialistas não deveriam dialogar com o ETA até que o grupo se autodissolvesse.
Mas o partido do premiê aceitava a possibilidade de diálogo, contanto que precedido pelo fim incondicional dos atentados. O PNV (Partido Nacionalista Basco), o mais importante na região, qualificou a decisão do ETA de "magnífica" e disse crer que o cessar-fogo é uma intenção séria.
Familiares dos mortos em atentados executados pelo grupo pediram "muita cautela" ao governo, em comunicado da Associação das Vítimas do Terrorismo.
O caminho que levaria a uma paz definitiva ainda é incerto. A Justiça espanhola está à procura de Arnaldo Otegi, líder da Batasuna (o braço político do ETA, colocado na ilegalidade em 2002), por incitação ao terrorismo. Se for localizado e preso, é possível que ocorra um recuo no processo, já que ontem o ETA exigiu o fim da repressão a seus dirigentes.
A associação dos bispos espanhóis "alegrou-se" com a decisão do grupo basco, apesar de não considerar o anúncio de ontem como "suficiente" -para a Igreja, o ETA deveria se dissolver.
Já os sindicalistas da UGT (União Geral dos Trabalhadores) afirmaram que continuarão empenhados na obtenção da paz. A entidade dos empresários bascos disse esperar "que também terminem as extorsões" praticadas pelo ETA.
A França não se pronunciou sobre uma questão "de soberania espanhola". Mas o presidente Jacques Chirac disse ver "com grande esperança" a oportunidade de pôr fim "à praga do terrorismo" no país vizinho.
Em Londres, o primeiro-ministro Tony Blair disse "aplaudir" a decisão do grupo basco, enquanto o espanhol Javier Solana, responsável pela política externa da União Européia, manifestou sua "satisfação" pela "boa notícia".


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