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SONHO AMERICANO
Apesar de protestos pela volta de Elián, muitos moradores da ilha continuam a tentar arriscada travessia
Cubanos seguem fugindo para os EUA
JAN McGIRK
do "The Independent",
em Varadero, Cuba
Enquanto milhares de cubanos
saem às ruas pedindo a volta do
menino náufrago Elián González,
6, paradoxalmente não se reduziu
o êxodo de cubanos que sonham
em enriquecer nos EUA. Só no
ano passado, cerca de 1.300 pessoas fugiram da ilha levando seus
poucos pertences.
Apesar de 60 candidatos a refugiados terem morrido afogados
durante a viagem -entre eles a
mãe de Elián, Elisabet Brotons-,
centenas de outros continuam
tentando atravessar o estreito infestado de tubarões que separa
sua ilha dos EUA.
Eles se reúnem na costa norte
da ilha, repleta de manguezais, e,
com suas famílias, lotam pequenas embarcações motorizadas
que, apesar de frágeis, representam um avanço grande em relação às toscas jangadas feitas pelos
refugiados no início dos anos 90.
As fortes correntezas do golfo
do México que passam por Cárdenas podem levá-los 150 km ao
norte, até atingirem a Flórida.
Os proprietários das lanchas
velozes usadas no contrabando
de cigarros, que também são o
meio de transporte preferido dos
narcotraficantes de Miami, cobram até US$ 8.000 por pessoa.
O construtor que vendeu um
barco de alumínio de seis metros
a Lázaro Munero, o namorado da
mãe de Elián, foi preso pouco
após o naufrágio da embarcação.
Apesar do risco, a maioria dos
candidatos a refugiados prefere
recorrer a operadores menores,
como Munero, devido aos preços
mais baixos que cobram. O casal
que sobreviveu à viagem, ao lado
de Elián, contou aos funcionários
da imigração que pagara US$
1.000 pela viagem clandestina.
Ninguém oferece essas viagens
abertamente, mas não falta garra
aos desempregados que passam
os dias à toa nas ilhas entre Cárdenas e o resort turístico de Varadero. Em troca de um pequeno
pagamento em dinheiro vivo, é
fácil descobrir quando vai partir
o próximo barco .
"Quem quer partir não tem medo do mar", disse ao "Miami Herald" uma prima de Elián, Carmen Rodriguez Brotons. Ela fez a
viagem há quase dois anos com
seu marido, Orlando. Seu bote
salva-vidas improvisado era a câmara de um pneu de trator russo,
semelhante àquela à qual a mãe
de Elián amarrou o menino. Os
pais, dois irmãos e uma cunhada
de Orlando morreram em novembro, na viagem de Elián.
A maioria dos cubanos que arrisca a perigosa travessia tem menos de 30 anos. Mais da metade
dos 11 milhões de cidadãos cubanos nasceu após a revolução de
1959 e vê como algo natural e nada especial o ensino e saúde gratuitos proporcionados pelo comunismo. Cada vez mais, porém,
os jovens se ressentem das restrições impostas pelo estilo de vida
pós-revolucionário.
Hoje em dia, as etiquetas de grifes são tão valorizadas entre os
cubanos jovens que em Havana
se vêem mais camisetas com a assinatura de Tommy Hilfiger do
que com a de Che Guevara.
Recentemente um adolescente
de Varadero, sem condições financeiras de usar as roupas esporte da moda, mandou tatuar o
logotipo da Nike diretamente em
seu peito.
Desde o início dos anos 90,
quando a queda da União Soviética levou a economia cubana a
entrar em colapso, o governo cubano vem incentivando o turismo estrangeiro.
Um dos maiores pontos de partida é a praia de Varadero, onde o
pai e a mãe de Elián trabalhavam,
em busca de gorjetas em dólares.
"Aqui a gente tem um vislumbre da boa vida e percebe que ela
pode ser melhor ainda lá fora",
diz a camareira Maria, que trabalha no hotel Paradiso. "É só uma
questão de tempo." O salário médio cubano é de apenas US$ 8 por
mês, e os profissionais de mais alta categoria ganham US$ 30.
O governo distribui carnês de
racionamento para os produtos
alimentícios básicos, mas as famílias que não têm acesso a dólares enfrentam dificuldades para
sobreviver de um mês a outro.
Muitos cubanos sobrevivem
com a ajuda de amigos e parentes, que mandam dinheiro do exterior para seus familiares pobres. Os estimados US$ 800 milhões que chegam do exterior representam uma contribuição vital à economia cubana.
A sociedade cubana se divide
em três faixas: a elite do Partido
Comunista, as pessoas que têm
acesso a dólares e o resto.
Com 2 milhões de turistas esperados este ano, Cuba investiu
muito em resorts turísticos de
praia e mergulho, apropriados
para pacotes de férias. Novos
joint ventures trouxeram dúzias
de guindastes de construtoras para o litoral de Varadero, onde pipocam apartamentos em regime
de partilha e prédios de apartamentos à beira-mar. Para promover um ambiente "família", o governo está exercendo forte repressão à prostituição, maneira
tradicional de obter dinheiro vivo
em pouco tempo.
Tradução de Clara Allain
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