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EUROPA
Sabendo crescer nas crises e sem ocultar ambição presidencial, ministro vira o mais popular dos conservadores franceses
Sarkozy emerge como estrela da direita
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Nicolas Sarkozy, 51, é o ministro
francês do Interior e o provável
candidato presidencial do bloco
de centro-direita nas eleições de
abril de 2007. Mas é bem mais que
isso. Tornou-se o político sobre o
qual mais se fala -bem ou mal-
na França de hoje em dia.
A oposição de centro-esquerda
o acusa de racista e mistificador.
O situacionismo vê nele a opção
para se manter no palácio presidencial do Elysée e evitar a desagradável "alternância de poder".
Pesquisa Sofrès divulgada este
mês diz que 48% dos franceses
querem ver Sarkozy nos próximos meses ou anos ocupando
funções de responsabilidade.
Nesse grupo estão 24% dos eleitores de partidos da esquerda. Ele é
de longe o nome mais popular entre os conservadores.
O ministro só perde no "barômetro" daquele instituto para Ségolène Royal, possível candidata
socialista à Presidência. Ela ficou
com 53%. Tem baixa rejeição.
Sarkozy entrou em evidência
nas duas crises sérias que a França
enfrentou nos últimos seis meses.
De ambas saiu fortalecido.
A primeira foi em outubro do
ano passado, quando 9.000 automóveis foram queimados em subúrbios habitados por imigrantes
de países muçulmanos. Ele pôs lenha na fogueira ao qualificar os
adolescentes envolvidos de "racaille" (escória, canalha). Mas, ao
fim da crise, em dezembro -ele
prometeu expulsar em massa os
delinqüentes, o que não ocorreu-, sua popularidade estava
em 68%, segundo o instituto Ifop.
A segunda é mais recente, quando centenas de milhares de estudantes da classe média protestaram em passeatas contra a lei do
primeiro emprego. Assessores de
Sarkozy pulverizaram pela mídia
críticas sutis ao projeto de seu rival, o primeiro-ministro Dominique de Villepin. Pressionado, o
governo retirou a lei. Os índices
de aprovação de Villepin e do presidente Jacques Chirac foram parar no chão. Mas Sarkozy mantinha seus índices bem elevados.
Ele não é um candidato presidencial enrustido. Afirma abertamente ser esse seu projeto pessoal. Entre ele e Chirac -seu guia
espiritual, a quem "apunhalou
pelas costas" (a frase é de Bernadette, a poderosa mulher do presidente) em 1995, ao apoiar o rival
Edouard Balladur às eleições presidenciais- a relação varia do
amor ao ódio.
Para machucá-lo, dá a entender
a jornalista do "Le Monde" Béatrice Gurrey, em seu livro "Le rebelle et le roi" (o rebelde e o rei),
"Sarkô", como é também chamado, teria insinuado ser o amante
de Claude, a filha do presidente.
A segunda mulher do atual ministro do Interior era na época
uma das figuras mais vistosas da
França, Cécilia Ciganer-Albeniz.
Ela fora casada com Jacques Martin, apresentador conhecidíssimo
da televisão. Pois eis que há dois
anos Cécilia abandona o marido e
o troca por um outro. Os inimigos
de "Sarkô" usaram o fuxico para
atingir sua honra e sua taxa de
aprovação. Não funcionou.
Seu perfil é singular entre os políticos conservadores franceses.
Não estudou na Escola Nacional
de Administração, celeiro das elites. Formou-se em direito e fez
apenas um obscuro mestrado.
Sua ascensão foi surpreendentemente rápida. Vereador aos 22
anos do abastado subúrbio parisiense de Neuilly-sur-Seine, foi
aos 28 prefeito daquele município, deputado aos 33 e ministro
do Orçamento aos 38. Ocupa hoje
o ministério do Interior pela segunda vez, depois de ter sido também ministro da Economia.
Nada mal para quem não tem
pedigree familiar e não pertence a
uma casta política. Filho de judeus -ele foi batizado como católico-, seu pai era castelão na
Hungria e emigrou durante a Segunda Guerra. "Sarkô" nasceu no
17º Distrito de Paris, um bairro de
classe média alta. Começou a fazer política em 1975, como dirigente da juventude do partido
neogaullista. Teve como padrinho Jacques Chirac.
O ministro é um trabalhador
compulsivo. Sua hiperatividade
gera a impressão de competência
e de possuir a capacidade de ter
soluções para qualquer problema.
Partiu dele o engenhoso enquadramento da comunidade muçulmana francesa. Criou um conselho de mesquitas e o subsidiou
com dinheiro do Estado, para impedir a dependência financeira de
doadores sauditas, que espalham
pela Europa o fundamentalismo
da "guerra santa".
Mas ele ao mesmo tempo atropela sem cerimônias a separação
de poderes e é advertido com freqüência pelo Sindicato da Magistratura, que na França tem a mesma autoridade moral da OAB
brasileira. Foi o caso de pedir a
punição de um juiz que dera liberdade provisória a um preso que
em seguida matou uma mulher.
O presidente do Partido Socialista, François Hollande, o acusa
de gastar dinheiro oficial para fazer política no interior. O "Prêmio
Big Brother", para personalidades
que ameaçam as liberdades civis,
foi dado a ele no ano passado,
"pelo conjunto de sua obra".
Sua política de imigração despertou esta semana reações da
conferência episcopal francesa.
Ele quer atrair árabes e africanos
com formação superior. E dificultar o acesso de imigrantes mais
pobres e menos qualificados.
A revista "The Economist", bíblia do meio liberal europeu, vê
em "Sarkô" uma esperança para
"flexibilizar" os direitos trabalhistas e acabar com o medo que a
França tem da globalização.
As controvérsias que ele gera
podem ser medidas por sua presença involuntária na internet.
Seu nome aparece 2,8 milhões de
vezes na blogosfera de seus concidadãos, segundo o Google francês. É dez vezes mais que Johnny
Hallyday, um cantor muitíssimo
popular que já vendeu 100 milhões de discos. Ou 15 vezes mais
que a atriz Juliette Binoche.
Entre os franceses já mortos,
Sarkozy tem nos blogs presença
seis vezes maior que as dos presidentes Charles de Gaulle e François Mitterrand e oito vezes maior
que a cantora Edith Piaf.
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