São Paulo, quinta-feira, 23 de abril de 2009

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Eleição sul-africana tem 80% de presença

Alto comparecimento sob voto facultativo deve consagrar Congresso Nacional Africano e ascensão de Zuma à Presidência

É o quarto pleito depois do fim do apartheid; primeiros resultados hoje apontarão o tamanho da maioria governista no Congresso


John Moore/France Presse
Sul-africanos fazem fila para votar em favela de Johannesburgo


FÁBIO ZANINI
ENVIADO ESPECIAL A JOHANNESBURGO

Filas gigantescas -retilíneas, onduladas, em formato de meia-lua e até formando quadrados perfeitos- foram ontem a imagem da eleição sul-africana, a quarta desde o fim do apartheid, há 15 anos.
Nem a face sorridente de Nelson Mandela, votando com a ajuda de um neto, nem os gritinhos de alegria do arcebispo Desmond Tutu dentro da seção eleitoral na Cidade do Cabo foram suficientes para apagar a visão de milhares de pessoas esperando por até cinco horas no frio, pacientemente. O comparecimento foi de cerca de 80% entre os 23 milhões de eleitores -o voto é facultativo.
O resultado final é aguardado para o fim de semana, mas os primeiros resultados parciais já devem indicar hoje a vitória fácil de Jacob Zuma, do Congresso Nacional Africano.
Em alguns locais o clima foi tenso, com policiamento reforçado, mas os incidentes foram pontuais. No mais sério, o chefe de uma seção eleitoral na província de KwaZulu-Natal foi preso após terem sido encontradas cem cédulas pré-marcadas para o Partido Inkhata.

Sistema arcaico
No geral, o sentimento era de resignação com o arcaico sistema de votação sul-africano, baseado em poucas seções eleitorais, poucas cabines de votação e cédulas enormes. Eleitores, sobretudo os mais velhos, tinham dificuldade em encaixá-las nas urnas de papelão.
"Esperei duas horas de pé, mas não reclamo. É sempre assim", afirmou Solani, 23, ao sair de escola infantil transformada em seção eleitoral. Nas zonas rurais, imagens aéreas mostravam filas de um quilômetro.
No bairro de classe média alta de Sandton, brancos e negros se misturavam na fila em frente a um quartel do Corpo de Bombeiros. Uma das funcionárias colocou seus filhos pequenos para alugar cadeiras por 10 rands cada, o equivalente a pouco mais de 1 dólar.
Perto do meio-dia, a Folha contou 220 pessoas na fila, progredindo a passos lentos. Pouco depois, chegaram novas cabines de votação, o que amenizou um pouco o problema.
Sello Nkwana, 28, esperou por uma hora e quarenta e cinco minutos. "Foi até bom porque tive tempo de pensar. Decidi no último minuto. O CNA cometeu muitos erros, mas os manifestos dos partidos de oposição também não me agradam em nada", afirmou ele, um analista de informática que pode ser enquadrado na nova classe média negra -seus pais ainda vivem num casebre sem água corrente numa área rural.
Na África do Sul, o eleitor é obrigado a votar no bairro em que é registrado, mas pode optar por diferentes seções eleitorais dentro dele, o que levou vários a uma "pesquisa de mercado". O analista financeiro Matthew Wainwright, 24, desistiu de votar na seção do Corpo de Bombeiros. "Eu não me importo de esperar, mas acabei de receber um telefonema de que há uma outra seção mais vazia aqui perto. Vou tentar", afirmou ele, eleitor da oposição. "O CNA está ficando preguiçoso e abusando do poder."

Máquina
Zuma deve ser eleito com entre 60% e 70% dos votos, enquanto os dois principais partidos de oposição, a Aliança Democrática e o Congresso do Povo, juntos, devem ter entre 20% e 30%. A popularidade do CNA deve-se à sua aura de partido da libertação da segregação racial e a uma bem engrenada máquina partidária.
Em frente a uma seção eleitoral na favela de Alexandra, o militante do CNA Nathi Nkabinde pediu desculpas para interromper uma conversa com a Folha. Precisava passar uma mensagem de texto de seu celular para o escritório regional do partido, informando que, até aquele momento, 10h, 197 pessoas haviam votado na eleição nacional e 196 na provincial (as urnas são diferentes). O crédito foi pago pelo partido para milhares de pessoas.
"Assim nós mantemos o controle sobre o fluxo de eleitores e podemos mudar nosso pessoal para áreas mais movimentadas", afirmou.
A boca de urna é tolerada na África do Sul, mas com regras. Numa seção, duas mesinhas do outro lado da calçada tinham partidários do CNA e do Partido Inkhata tentando atrair eleitores para um último esforço de convencimento. Irritado com o fato de a mesa adversária ter uma grande bandeira, o representante do CNA foi reclamar com o chefe da seção, que o autorizou a colocar a sua.


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