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Exército atira cegamente, dizem civis encurralados
Refugiados palestinos relatam à Folha as horas de horror vividas no fogo cruzado
Segundo testemunhas, até clínicas foram atingidas pelo Exército do Líbano no campo de Nahr al Bared, que ficou sem luz, água e comida
TARIQ SALEH
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
DE BEIRUTE
O terceiro dia consecutivo de
combates, nesta terça-feira, foi
marcado por horas de pânico
dentro do campo de refugiados
palestinos de Nahr al Bared,
perto de Trípoli (norte do Líbano). Sob fogo dos tanques do
Exército libanês e tiros disparados pelos radicais do Fatah al
Islam, testemunhas relataram
à Folha, por telefone, horas de
terror, luta pela sobrevivência
e a fuga para escapar da área.
O professor Mahmoud Ahmad Wehby, 25, disse que a artilharia dos militares libaneses
disparava cegamente contra o
campo. "Os militantes estavam, em sua maioria, nos arredores ou nos campos que cercam Nahr al Bared. Mas os soldados disparavam em tudo",
disse ele.
De acordo com Wehby, os
disparos dos tanques acertavam residências e prédios usados como refúgio pelos civis.
Em uma oportunidade, disse o
professor, um projétil acertou
duas clínicas usadas para tratar
dos feridos.
"Felizmente ninguém se machucou, mas há mortos nas
ruas e feridos precisando de assistência médica." Segundo ele,
há falta de leite e água para as
crianças menores, que são as
que mais sofrem com a situação. "Não temos luz nem comida. As pessoas estão sofrendo",
contou. Ao fundo, podiam-se
ouvir gritos de mulheres e explosões.
Condições precárias
Não há dados precisos de
quantas pessoas teriam morrido no campo. Mas os relatos falam em dezenas de feridos e
corpos espalhados pelas ruas. O
desempregado Adnan Mekawi,
30, disse à Folha, também por
telefone, que médicos das clínicas dos campos tratavam feridos graves sem nenhuma condição sanitária.
"Eles estão batendo de porta
em porta para pedir até algodão aos moradores, pois estão
com falta de material básico",
contou Mekawi.
Um médico de um centro
hospitalar do campo disse à TV
Al Jazeera que o banco de sangue estava vazio. O médico
confirmou que as clínicas estiveram sob fogo da artilharia libanesa e que pessoas se aglomeravam em frente aos centros pedindo por ajuda.
De acordo com Mekawi, os
médicos fizeram o que podiam,
mas a falta de material e o grande número de pessoas dificultava o trabalho. "Muitas pessoas não puderam ser atendidas, somente os casos mais graves", complementou.
Foi preciso uma trégua, não
violada pelos dois lados, para
que milhares de refugiados iniciassem no final do dia uma fuga do campo para outro, o de
Beddawi, localizado dez quilômetros ao sul de Trípoli.
Imagens da rede de TV Al Jazeera mostraram um homem
socorrendo mulheres e crianças refugiadas numa casa e tiros vindos em sua direção. De
acordo com o canal árabe, o homem tentou salvar uma mulher mas teve que fugir para
não ser pego no fogo cruzado.
Moradores do campo também usaram bandeiras brancas
na janelas para mostrar que
não estavam armadas. "As pessoas fugiram com o que podiam, aproveitaram a trégua
para escapar", contou um refugiado.
Já na capital, Beirute, o clima
continuava de muito medo.
Ruas estavam desertas e vários
estabelecimentos fecharam
mais cedo. O Exército e a polícia montaram barreiras à noite
para revistar veículos à procura
de bombas. O governo teme
novos atentados como os de
domingo e segunda, em que um
bairro cristão e outro sunita foram alvos de explosões.
Pessoas carregando mochilas ou grandes volumes eram
paradas nas ruas e revistadas.
O motorista de táxi Nadib Haddad, 46, lamentava. "Estou dirigindo há várias horas e há
muito tempo não tinha um dia
tão ruim como esse". Irritado,
ele sentenciou: "A Síria quer
voltar e fará de tudo para tomarem o Líbano de novo".
Em outro ponto da cidade,
segundo a emissora de TV libanesa LBC, alguns jovens gritavam palavras de repúdio aos
palestinos. Também ocorreram discussões nos arredores
de Sabra e Chatila entre libaneses e palestinos.
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