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São Paulo, sábado, 23 de agosto de 2003

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Paris condena "lógica da ocupação"

ALAIN FRACHON
E BRUNO PHILIP
DO "LE MONDE"

O chanceler francês, Dominique de Villepin, não diz abertamente que vetará qualquer resolução do Conselho de Segurança da ONU que consolide diplomaticamente a presença dos Estados Unidos no Iraque. Mas defende uma solução em que a comunidade internacional se associe a um governo provisório iraquiano para preencher o atual vazio institucional. "A coisa certa a fazer é reunir uma verdadeira força internacional sob mandato da ONU", disse ele em entrevista.
Para ele, a coalizão anglo-americana que administra o Iraque precisa substituir "a lógica da ocupação pela lógica da soberania". "Choca-me que o povo iraquiano não tenha papel ativo nas decisões que lhes dizem respeito."
A atual política, baseada na segurança interna e destinada a combater o terrorismo, deve dar lugar a um processo que devolva aos iraquianos a responsabilidade de definir seu destino, diz ele.
Villepin defende também a urgência de um "eletrochoque" para romper o impasse entre israelenses e palestinos. Sem isso, as duas partes não voltariam a ter esperança de paz.
 

Pergunta - Qual seu diagnóstico sobre o Iraque após o atentado contra as instalações da ONU?
Dominique de Villepin -
Creio que haja o risco de uma dupla espiral: a do confronto, na qual a força é respondida pelo terrorismo, e a da decomposição.
Choca-me que o povo iraquiano não tenha papel ativo nas decisões que lhes dizem respeito. Isso reduz as chances de sucesso na reconstrução. O raciocínio baseado na segurança interna não permite recolocar o Iraque nos trilhos da normalidade.

Pergunta - O que deveria concretamente ser feito?
Villepin -
É preciso privilegiar medidas políticas que entreguem o poder aos iraquianos. O que exige o engajamento da comunidade internacional, por meio da ONU, para orientar esse processo e lhe dar legitimidade.

Pergunta - Mas de que forma?
Villepin -
Transformando em primeiro lugar o Conselho de Governo num verdadeiro governo provisório iraquiano, com autonomia e prioridades, como o restabelecimento dos serviços públicos. O governo provisório convocaria eleições para uma assembléia constituinte. Um representante da ONU acompanharia essa transição.

Pergunta - Isso excluiria um administrador norte-americano?
Villepin -
O importante é que o poder seja exercido pelos iraquianos. Devemos acelerar o cronograma dessa transição. Além da ONU, um governo provisório teria sua legitimidade reforçada pelos países vizinhos e por entidades como a Liga Árabe.

Pergunta - Isso vale para o Iraque, para o Afeganistão e para todo o Oriente Médio?
Villepin -
Sem dúvida. Engrenagens semelhantes criaram a desmobilização e o ressentimento. O palestinos não enxergam perspectiva de paz e de normalização de suas rotinas.
A incredulidade gera desespero. Os israelenses sentem o mesmo em razão da multiplicação dos atentados.
No Oriente Médio é preciso superar a desesperança. Israelenses e palestinos que acreditam na paz precisam lidar com credibilidade. É perigoso lançar processos demorados. A gravidade da situação exige a aceleração do plano de paz. Precisamos de um eletrochoque: uma conferência internacional, eleições palestinas, forças internacionais que mudem a equação.


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