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Lobby emperra projeto de Obama de reforma na saúde
Presidente recua da ideia de seguro público e dilui apoio democrata sem adesão opositora
Seguradoras, médicos e hospitais têm estimado em US$ 1,4 milhão por dia gasto para bancar ação de mais de 350 lobistas no Congresso
JANAINA LAGE
DE NOVA YORK
A forte campanha realizada
por seguradoras, hospitais e associações de médicos resultou
na mudança de um dos principais pontos da reforma do sistema de saúde: a inclusão de
um plano público. O que era
mencionado como um dos pontos essenciais do projeto é citado agora como uma mera possibilidade pelo presidente.
Ao ceder à principal reivindicação dos grupos de lobby no
Congresso, o presidente Barack
Obama viu seu apoio diluído
entre os democratas e continuou sem avanços expressivos
nas negociações com republicanos. Alguns analistas dizem
que a mudança ameaça o êxito
da reforma, principal item da
agenda doméstica de Obama.
Na prática, a reforma não satisfaz as reivindicações dos republicanos e ficaria aquém das
expectativas dos democratas
mais à esquerda, que amargaram o fracasso da tentativa de
reforma no governo de Bill
Clinton (1993-2001).
Obama diz que os republicanos estão tentando repetir a estratégia que resultou, à época,
na perda da maioria na Câmara
dos Representantes (deputados) na eleição subsequente.
As companhias temem que,
ao oferecer um plano público
subsidiado ao menos em parte
com impostos pagos pelos contribuintes, o governo ofereça
prêmios de seguros com valor
tão baixo que afete a concorrência e as margens de lucro. O
governo dizia que a medida estimularia melhores serviços.
As maiores empresas já contrataram mais de 350 ex-membros do governo e do Congresso
para atuar junto a deputados e
senadores. Estimativas dão
conta de que o gasto em lobby
chega a US$ 1,4 milhão por dia.
O setor de saúde americano
funciona hoje como uma espécie de bomba relógio, com previsão de gastos equivalente a
um quinto do PIB em dez anos.
Mesmo quem é contra a proposta original de Obama diz ser
favorável a uma reforma.
Em uma economia em crise
onde a maior parte da população obtém o plano de saúde via
empregador, aumenta o número de pessoas sem cobertura.
Dados do instituto Gallup indicam que 16,2% dos americanos
não têm plano. Há receio de
que a reforma leve a uma explosão do deficit público -e que
parte dos custos tenha de ser
compensada com impostos.
"O sistema é uma bagunça
por ser baseado em uma política de reembolsos. Hospitais e
médicos recebem valores que
não refletem o seu custo real.
Quando você mexe nisso, está
tirando dinheiro desses grupos.
Começa a briga política, nem
sempre limpa", disse à Folha
Amitabh Chandra, especialista
em política de saúde da Universidade Harvard.
Além dos 47 milhões sem
plano, outros 25 milhões têm
cobertura insuficiente.
Guerra psicológica
Um dos temas mais assustadores para o eleitorado americano é o aumento da presença
do Estado, considerado mau
administrador, na economia.
As campanhas contra o projeto jogam com o imaginário de
uma América "socialista" em
que a população enfrentaria racionamento, não poderia mais
escolher seu plano ou manter
seu médico, hipóteses negadas
pelo governo.
"Obama perdeu o controle
sobre a discussão", diz Wendell
Potter, ex-executivo de uma
grande seguradora. Antes de
entrar em férias, Obama disse
ontem que o debate não deveria ser dominado por "distorções" e "deturpações". Ele voltou a negar rumores como financiamento para aborto e estímulo à eutanásia, levantadas
por grupos de extrema direita.
Tanta exposição não resultou somente em perda de apoio
político, mas também popular.
Pesquisa do "Washington Post"
afirma que 50% dos entrevistados desaprovam a maneira como ele conduz a reforma da
saúde, o maior patamar de rejeição desde que foi eleito.
A reforma é hoje a maior
preocupação para 1 em cada 4
americanos.
Só perde para a economia.
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