São Paulo, domingo, 23 de agosto de 2009

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Após 2 anos, vítimas de tremor no Peru ainda esperam ajuda

Chávez ganha apoio por pagar cem casas na região, onde governo Alan García só refez 2.000 das 52.154 habitações arruinadas

Terremoto de 2007 destruiu centro histórico da turística Pisco e matou 560; Lima culpa governos locais por lentidão na reconstrução

NAOMI MAPSTONE
DO "FINANCIAL TIMES", EM CHINCHA (PERU)

Dois anos depois do terremoto que arrasou Pisco, Chincha e Ica, no sul do Peru, Milagros Collagos Olavarria, 25, lembra que ouviu um estalido em sua casa de tijolos de argila à beira da rodovia. Sentiu a terra começando a sacudir "como se estivesse nos engolindo". Ela se salvou, com o filho bebê, mas perdeu seis primos e tios naquele dia, vítimas do tremor que atingiu 8 pontos na escala Richter e afetou mais de 75 mil casas em uma região em que muita gente já enfrentava dificuldades para ganhar a vida com a pesca ou a plantação de alcachofras, aspargos, algodão e frutas cítricas. Nas três cidades, 560 pessoas morreram. Olhando à sua volta, porém, Collagos avalia agora que tem sorte. "Perdemos tudo. Um dia fomos à praça, nos inscrevemos e ganhamos uma casa", conta. O sorteio de cem casas de três dormitórios, bancadas por Hugo Chávez, o presidente esquerdista da Venezuela, é parte de uma estratégia já antiga. Ele costuma enviar assistência de emergência, e petróleo subsidiado a outros países, a fim de promover sua "revolução bolivariana" e conquistar apoio aos seus aliados esquerdistas, como Ollanta Humala, que foi derrotado em 2006 pelo presidente peruano Alan García. Chávez conquistou a gratidão de Collagos e de seus vizinhos em Chincha, muitos dos quais portam adesivos com a bandeira venezuelana em suas casas, ao lado da peruana. As casas, porém, são ameaça menor a García do que Keiko Fujimori, filha do ex-presidente e candidata direitista que tem liderado as pesquisas sobre a sucessão de 2011. Ainda assim, o panorama de casas brancas, gramados bem aparados e parques infantis coloridos do bairro Simón Bolívar, que leva o nome do herói da independência sul-americana e ícone para o chavismo, oferece um contraste brutal ante as milhares de habitações temporárias que se espalham na região. "Estou zangado com o governo. A reconstrução está muito, muito lenta", diz Emilio del Solar, prefeito de Chincha Baja.

Casas resistentes
Segundo a agência assistencial Care Peru, só 2.000 das 52.154 casas destruídas em 2007 foram refeitas. A Care está usando tecnologia desenvolvida pela Universidade Católica de Lima, após o terremoto, para construir casas de adobe -tijolos de argila- resistentes a tremores. "Pela primeira vez dispomos de uma tecnologia simples e efetiva para que as pessoas possam construir por conta própria, com alguma supervisão técnica", diz Julio Salcedo, diretor do projeto da Care. Construir uma casa com quatro quartos, e mais banheiro e forno construídos do lado de fora, custa entre US$ 5 mil e US$ 6 mil. Elas são feitas em regime de mutirão com materiais dados pelo governo e supervisão e treinamento da Care. Salcedo estima que as casas de Chávez, feitas por engenheiros, saiam US$ 30 mil cada uma. A Care vem treinando milhares de famílias para usar a nova técnica, mas o governo ainda não aprovou a casa-modelo. Em Chinca, diz a agência, 2.000 famílias foram treinadas, mas só 150 casas foram feitas. O governo diz ter investido US$ 112 milhões na reconstrução da infraestrutura, e promete investir nas casas. Culpa os governos locais pela inação. Na praça arruinada de Pisco, o guia turístico Jimmy Aicho Romero resume os sentimentos locais: "O governo tinha capacidade para fazer muitas coisas, e nada fez".


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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