São Paulo, quinta-feira, 23 de outubro de 2008

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Oposição racha após fechar acordo de Carta com Morales

Líder do Podemos festeja texto e atribui êxito de negociação à mediação estrangeira

Resistência do governador de Santa Cruz, que fará campanha anti-referendo, mostra, porém, que crise não está de todo superada

David Mercado/Reuters
O presidente da Bolívia, Evo Morales, fala à imprensa em La Paz

FLÁVIA MARREIRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Um dia após a convocação para janeiro dos referendos da nova Constituição da Bolívia -mesmo com o texto bastante modificado, uma vitória de Evo Morales-, a oposição exibia sua divisão. Enquanto o governador do poderoso departamento autonomista de Santa Cruz, Rubén Costas, abria campanha contra o projeto, o ex-presidente do país e presidente do opositor Podemos, Jorge Quiroga, defendia a Carta e atribuía o sucesso das negociações à presença dos observadores internacionais.
"Por que houve acordo agora? Pela presença dos observadores, que mudou o rumo das negociações. O olho externo mudou o comportamento do governo. Sem ele, teriam dito: votem como queremos ou tiramos vocês do Congresso com dinamite, como já fizeram antes", disse à Folha Quiroga, que foi presidente da Bolívia entre 2001 e 2002 e perdeu a eleição para Morales em 2005.
O ex-presidente argumenta que, embora o acompanhamento internacional e da Igreja Católica já existisse, o massacre no departamento de Pando -ao menos 18 mortos em de setembro- e a cúpula da Unasul (União de Nações Sul-Americanas) "elevaram o nível de atenção" para a crise. "A Unasul deu um selo institucional regional", disse. O Brasil divulgou nota ontem comemorando o acordo e o papel da recém-nascida entidade.
Quiroga promete debater a Carta com a população. "É a Carta que eu gostaria? Não. Mas incluímos garantia às autonomias, à propriedade rural e urbana. O governo segue sendo tirano, mas o que fizemos foi impedir que tivesse o poder constitucional para sê-lo."
O endosso da maior parte do Podemos no Congresso à Carta aprofundou o divórcio entre os interesses imediatos da sigla e os governadores de oposição.
Ao menos publicamente, o governador cruzenho, Rubén Costas, que negociou com Morales por três semanas mas não fechou acordo, rejeitou a Carta. Cobrado pelas TVs opositoras a pronunciar-se, disse que o texto foi só "maquiado".
Quiroga rebateu: "Em cinco dias melhoramos o que eles fizeram em três semanas. Se o que fizeram foi X, nós entregamos X + 50%". E alfinetou, sem citar nomes: "De longe, todos são muito valentes".
De todo modo, a oposição sabe que, com a provável aprovação da Carta em janeiro, a próxima batalha é em dezembro de 2009, quando acontecerão as eleições gerais, e que não tem, por ora, nomes nacionais para rivalizar com Morales (o Podemos negociou esse prazo dilatado justamente para tentar forjar essa candidatura, já que, a princípio, as novas eleições aconteceriam em julho).
A aposta é que a crise econômica debilitará o governo de Morales, com a queda nos preços de gás e minérios. Ontem, o presidente celebrou o triunfo e respondeu: "Quero dizer que nosso plano é chegar em 2009 com muito mais força."


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