São Paulo, sábado, 24 de fevereiro de 2007

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Polêmica no Oriente Médio leva Hillary a evitar encontro com socialista francesa

NEWTON CARLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Hillary Clinton, a primeira mulher a aspirar à Presidência dos Estados Unidos, recusou-se a receber Ségolène Royal, a primeira mulher a candidatar-se à Presidência da França. Ségolène suspendeu viagem a Washington alegando cansaço depois de haver visitado o Oriente Médio e Portugal, há pouco mais de duas semanas. Mas o motivo real foi a negativa de Hillary em colocá-la em sua agenda, e é duvidoso que a socialista Ségolène visite os EUA antes das eleições de abril na França, tais as razões do colapso do que fora imaginado como ato de primeira grandeza no universo feminista.
Críticos falam em inexperiência em política externa e até ingenuidade. O fato é que Ségolène reuniu-se no Líbano com um parlamentar do Hisbollah, o grupo radical islâmico tido como terrorista pelo Departamento de Estado, acusado de vinculações com o Irã e a Síria e empenhado em derrubar o governo libanês pró-ocidental. Surpreendeu sobretudo o conteúdo, não o encontro em si. Um assessor de Hillary, que preferiu o anonimato, disse a "Le Parisien" que o diálogo poderia ser interpretado como comunhão de crenças, merecedora de repúdio, não de afagos.
Ali Ammar denunciou o governo Bush, diante de Ségolène, por "demência sem limites". O "Jerusalem Post" acrescentou que Israel foi acusado de "nazismo" em política externa. Alguém lembrou que Ali Ammar foi o nome adotado por um guerrilheiro legendário que enfrentou os franceses na Argélia. Ségolène procurou limitar os estragos insistindo em que a conversa se referiu somente ao Iraque, não teve a dimensão de um programa de política externa. Mas a negativa de Hillary, temerosa de um passo em falso, repercutiu; até se falou em "incidente internacional". Mas as divergências não se limitam a esse episódio.
O Partido Democrata, de Hillary, tem muito pouco em comum com os socialistas franceses, que saúdam intervenções do Estado e não raramente vão em cima da "hegemonia americana no mundo". É persistência de antiga nostalgia gaullista, de um poder autônomo. A própria Ségolène, num debate na TV, disse que "não podemos aceitar o conceito da guerra preventiva, nem o conceito dos bons contra os maus, nem americanos pregando liberalismo econômico fora e praticando protecionismo em casa, nem a recusa ao Tratado de Kyoto".


O jornalista NEWTON CARLOS é analista de questões internacionais

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