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Filarmônica de NY polemiza ao se apresentar na Coréia do Norte
Conservadores acusam maestro de legitimar regime do ditador Kim Jong-il; regente reage e diz que "quem tem casa de vidro não deve ficar atirando tijolos"
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
A Orquestra Filarmônica de
Nova York estará se apresentando na terça à noite em
Pyongyang, a capital da fechadíssima Coréia do Norte. O
convite para o concerto foi feito
pelo governo norte-coreano. O
Departamento de Estado concordou e "encorajou" à iniciativa, sem considerá-la oficial.
Raramente um concerto gerou tanto barulho -nada a ver
com as três peças que os 106
músicos e o maestro Lorin
Maazel, 77, trarão no programa. É barulho de política, que
saiu sobretudo de ambientes
conservadores americanos.
A questão era basicamente a
de saber até que ponto a mais
importante orquestra de Nova
York não estaria indiretamente
reconhecendo a legitimidade
da ditadura de Kim Jong-il.
Washington e Pyongyang não
têm relações diplomáticas.
O primeiro lance na controvérsia partiu de Richard Allen,
assessor de segurança nacional
do presidente Ronald Reagan, e
do ensaísta Chuck Downs, ambos da Comissão Americana de
Direitos Humanos na Coréia
do Norte. O regime comunista,
disseram no final de outubro
em artigo no "New York Times", está interpretando a iniciativa da Filarmônica "como
um tributo e não como um ato
de generosidade".
Mesmo de modo indireto, argumentaram, a orquestra entregaria a Kim Jong-il algo que
ele inevitavelmente usaria como uma peça de propaganda.
O segundo lance veio de um
dos intelectuais mais refinados
dos Estados Unidos, Terry Teachout, que é blogueiro em Nova
York, especialista em jazz e
música erudita e crítico de teatro do "Wall Street Journal".
Em texto publicado pouco
antes do Natal, ele qualificou o
concerto de Pyongyang de "um
show de marionetes cujo objetivo é dar legitimidade a um regime desprezível". Lembrou
indignado a existência de 150
mil prisioneiros políticos.
O maestro Lorin Maazel,
americano nascido na França e
regente com intensa carreira
nos Estados Unidos e na Europa, saiu então em defesa da turnê - para a qual a Filarmônica
já viajou no último dia 7, com
apresentações em Taiwan,
Hong Kong, Xangai, Pequim e
as capitais das duas Coréias.
"As pessoas que moram em
casas de vidro não deveriam ficar atirando tijolos." Citou a reputação americana de maltratar prisioneiros, talvez uma
alusão a Guantánamo, em entrevista à Associated Press.
Maazel também defendeu a
democracia e disse ter levado
mensagens de liberdade ao se
apresentar na União Soviética
ou na Alemanha Oriental, nos
tempos do comunismo.
Esses detalhes passaram batido para o "Washington Times", jornal relevante por seu
caricatural conservadorismo.
"Maazel está agindo sob os
efeitos do veneno do multiculturalismo", disse ao jornal Paul
Lake, um dos editores do site
"First Things". John Mahlmann, diretor da Associação
Nacional de Educação Musical,
declarou ser "lamentável que
tudo o que sai do pódio de Maazel não tenha a mesma credibilidade que a sua música".
O tablóide "New York Post"
bateu também. Escreveu editorial em que qualificou o concerto da Filarmônica em Pyongyang de "uma desgraça".
Em verdade, Lorin Maazel
tem um currículo em defesa
dos direitos humanos bem
mais intenso que o de seus detratores. Ele é o autor de uma
ópera estreada há dois anos em
Londres, "1984", baseada no
romance homônimo de George
Orwell e que é uma crítica afiada aos regimes totalitários.
Maazel e diretores da Filarmônica obtiveram das autoridades norte-coreanas a aceitação de todas as suas condições.
Escolheriam o programa,
que inclui peças de Richard
Wagner, Antonin Dvorak, e
George Gershwin. Interpretarão o hino da Coréia do Norte,
mas também o americano
("The Star Spangled Banner").
A TV norte-coreana retransmitirá o concerto, e os 1.500 lugares do anfiteatro não serão ocupados apenas por dignitários
do regime. O concerto será
transmitido na Europa e nos
EUA.
O fato de o governo americano não patrocinar a turnê torna
ligeiramente forçada a expressão "diplomacia musical", que o
"New York Times" empregou.
Mas foi inevitável a lembrança
da ida da Filarmônica a Moscou, em 1959, na Guerra Fria.
No caso da Coréia do Norte, é
plausível que o governo americano tenha dado sinal verde em
razão da reaproximação de
Pyongyang com o Japão, China,
Rússia e ocidentais, depois da
decisão de desmantelar suas
instalações nucleares.
Com agências internacionais
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