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Conferência foca direitos humanos pós-Bush
Sob tom otimista em relação a Obama, Academia da Latinidade questiona a universalidade do conceito
UIRÁ MACHADO
ENVIADO ESPECIAL A OSLO
Dias após Barack Obama
anunciar o envio de mais 17 mil
soldados ao Afeganistão e Hillary Clinton adotar um tom
pragmático na relação dos EUA
com a China, intelectuais de 13
países se reuniram em Oslo
(Noruega) para debater os direitos humanos no pós-Bush.
Realizada entre os últimos
dias 16 e 18, a 19ª Conferência
da Academia da Latinidade teve "Os direitos humanos e sua
possível universalidade" como
tema e um tom otimista com
relação ao novo presidente dos
EUA como pano de fundo.
Na abertura, o ex-premiê da
Noruega e presidente do Centro de Oslo para a Paz e os Direitos Humanos, Kjell Magne
Bondevik (1997-2005), afirmou que "as intervenções militares no Iraque, bem como as
prisões de Abu Ghraib [desmantelada] e Guantánamo
[palcos de tortura], podem ter
feito os EUA e a Europa perderem credibilidade, mas Obama
escolheu outro caminho".
Para ele, agora será mais fácil
acabar com a ambiguidade na
aplicação dos direitos humanos. "Esse discurso duplo, como se o que vale para eles não
valesse para nós, é reflexo de
interesses econômicos e militares unilaterais que não podem
obstruir a universalidade dos
direitos humanos", disse.
Na mesma direção, o brasileiro Cândido Mendes, presidente do Conselho Internacional de Ciências Sociais, evocou
o discurso da posse do presidente americano e argumentou
que a eleição de Obama é a superação do dilema entre segurança e valores, com a recuperação destes e a reinstauração
de um diálogo pluralista. "Bush
criou a cruzada moderna, investindo contra o terrorismo.
Obama eliminou o fundamentalismo ocidental."
No entanto, a esperança depositada na promessa de um
novo avanço do multilateralismo não impediu que os palestrantes deparassem com problemas filosóficos velhos e difíceis -e para os quais ainda não
há respostas definitivas.
Por exemplo, como afirmar a
universalidade dos direitos humanos e, ao mesmo tempo, garantir a autodeterminação dos
povos? Como defender uma
noção específica de direitos humanos marcadamente eurocêntrica sem ofender a particularidade de cada cultura?
"É preciso ter clareza quanto
a isto: os direitos humanos são
uma produção teórica da Europa", afirma François Jullien,
professor da Universidade de
Paris 7 e diretor do Instituto de
Pensamento Contemporâneo.
"Eles são localizados no tempo -Declaração dos Direitos
do Homem e do Cidadão, de
1789, e Declaração Universal
dos Direitos Humanos, de
1948- e no espaço. Tanto assim que a tradução de direitos
humanos para o chinês leva a
uma expressão que em si mesma não significa nada", disse.
Formulação negativa
Jullien, autor de diversos livros sobre o pensamento chinês, propôs uma solução que
foi abraçada por quase todos os
participantes como uma das
conclusões da conferência: os
direitos humanos devem ter
uma formulação negativa.
Ou seja, "em vez de dizer
quais são esses direitos, o que
nos obriga a buscar aqueles
mais palatáveis ao maior número de culturas, dizemos que
é um direito dizer não. Cada um
tem o direito de dizer não ao
que for inaceitável para si. Desse ponto de vista negativo, a noção está afastada de uma ideia
universal de verdade, mas, ainda assim, é um direito universal
garantido a todos", afirmou.
Além dessas dificuldades filosóficas, alguns problemas
mais concretos também apareceram nas discussões. A antropóloga turca Ayca Cubukcu, do
Comitê de Pensamento Global
da Universidade Columbia
(EUA), argumentou que a universalidade dos direitos humanos não pode ser debatida de
forma descolada da realidade.
"Em nome desses direitos
têm sido conduzidas políticas
ditas globais contra pessoas
que têm uma religião específica
-os muçulmanos- e que são
caracterizadas como inimigos."
Para ela, nenhuma discussão
sobre direitos humanos pode
ser feita sem que se leve em
consideração a desigualdade de
força entre os diferentes povos.
Sua apresentação terminou
com uma pergunta que recolocou o dilema inicial: "Se os EUA
podem invadir o Iraque em nome dos direitos humanos e ao
mesmo tempo desrespeitá-los
no próprio Iraque e em outros
países, saindo impunemente,
então o que são todas essas discussões sobre direitos humanos e lei internacional?".
O jornalista UIRÁ MACHADO viajou a Oslo a
convite da Academia da Latinidade
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