São Paulo, terça-feira, 24 de março de 2009

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Taleban pode virar partido, dizem EUA


Embaixador americano em Cabul afirma que grupo fundamentalista poderia participar da eleição deste ano no Afeganistão


Nova orientação da Casa Branca reforça distinção entre objetivos nacionais do Taleban e guerra global de terroristas da Al Qaeda

S. Sabawoon/Efe
Mulher afegã e seus filhos dormem em uma rua de Cabul; sete anos de ocupação americana não pacificaram país da Ásia Central

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

O embaixador norte-americano no Afeganistão, William Wood, informou ao jornal britânico "The Observer" que uma das ideias com que trabalha o novo governo de seu país é a de tentar atrair o movimento Taleban para a arena política, seja por meio da constituição de um partido que concorra às eleições, eventualmente já na votação prevista para agosto deste ano, seja por meio de candidatos avulsos que representem o grupo que controlou o país até a invasão americana de 2001.
Essa legitimação do Taleban é a completa reversão da política seguida a partir dos ataques terroristas do 11 de Setembro. Os ataques foram atribuídos à rede Al Qaeda e, para caçar seus líderes, especialmente Osama bin Laden, os EUA invadiram o Afeganistão do Taleban, numa equiparação entre uma e outro.
Agora, permitir que o grupo fundamentalista volte eventualmente ao poder por meio de eleições significa implicitamente aceitar que Al Qaeda é uma coisa, o inimigo a combater, e o Taleban é outra, um grupo extremista mas com o qual é forçoso tentar conviver.
Afinal, como disse o embaixador Wood, "insurgências, como todas as guerras, terminam quando há um acordo".
Essa distinção entre Taleban e Al Qaeda é coerente com um estudo de 2008 de Oliver Roy, diretor do Centro Nacional de Investigações Científicas da França e professor da Escola de Estudos Avançados de Ciências Sociais de Paris.
Diz Roy que o então presidente George W. Bush fizera uma mistura de "dois tipos de islamitas: com os jihadistas globais [partidários da guerra santa], não há nada o que conversar. Mas o novo presidente deveria favorecer a negociação com nacionalistas como o Taleban e o Hamas", grupo islâmico que controla a faixa de Gaza.
Para o estudioso, a Al Qaeda e suas franquias locais "têm um programa mundial", ao passo que Taleba e Hamas "têm prioridades territoriais e nacionais". Esse segundo tipo de movimento "não dá para ignorar ou eliminar pela força".

Plano de Obama
O primeiro-ministro britânico Gordon Brown confirma indiretamente, em artigo para o "Observer", a distinção entre Al Qaeda e Taleban, ao escrever que, se em 2001, o grupo terrorista estava "baseado no Afeganistão", hoje "o núcleo duro da Al Qaeda cruzou a fronteira, para o Paquistão".
Não é o caso do Taleban, que embora tenha santuários no Paquistão, continua muito ativo no próprio Afeganistão, tão ativo que o embaixador norte-americano passa a defender uma negociação política para incorporá-los ao processo, em vez da vitória militar que se mostrou inalcançável nos quase sete anos de ocupação.
O presidente dos EUA, Barack Obama, já havia falado em diálogo com líderes "moderados" do Taleban, mas não em incorporá-los logo à política institucional. Obama deve anunciar formalmente nesta semana seu plano para o Afeganistão e o Paquistão.


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