São Paulo, sexta-feira, 24 de maio de 2002

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"BENEMÉRITO"

Bairro Pablo Escobar cultiva sua memória

Chefão do tráfico é herói em Medellín

DO ENVIADO ESPECIAL A MEDELLÍN

Se fosse candidato a presidente nas eleições do próximo domingo, Pablo Escobar, o chefão do cartel de Medellín morto pela polícia em 1992, seria certamente o mais votado entre as cerca de 800 famílias que vivem no bairro Medellín sin Tugurios (Medellín sem favelas), na zona norte da cidade.
Popularmente, o bairro é conhecido pelo nome do narcotraficante, que, no começo dos anos 80, em campanha para deputado, mandou construir 450 casas para abrigar as famílias que viviam em condições subumanas num lixão da cidade.
Poucos anos depois, ele se tornaria um dos mais temidos fora-da-lei da Colômbia, reconhecido pela frieza e violência, e teve sua cabeça a prêmio como um dos criminosos mais procurados pelos EUA.
Ainda assim, "Pablito" é um herói entre os moradores do bairro que leva seu nome. Fotos suas estão pregadas nas paredes de casas simples do bairro. Muitas vezes ao lado da de sua mãe, "dona Hermilda", que, após a morte do filho, doou mais uma parte do terreno para que o bairro fosse ampliado.
"Pablito era uma pessoa muito católica, muito humanitária. Ele foi o único político que subiu no lixão onde vivíamos para falar com a gente", afirma Francisco Luis Flores, 84, um dos pioneiros do bairro Pablo Escobar.
"Se ele fez alguma coisa má foi para sua defesa pessoal", afirma Flores, que guarda com orgulho uma foto ao lado do ídolo. "Não sei como ele conseguiu o dinheiro que tinha, mas, se conseguiu, foi certamente para fazer o bem à humanidade", diz.
Cada casa doada pelo narcotraficante tinha originalmente 72 m2, com sala, cozinha, um banheiro, dois quartos e um quintal. Hoje, quase todas as casas foram ampliadas, com anexos.

Igreja
Além das casas, ele mandou construir também uma igreja, a paróquia San Simón Apóstol, que por muitos anos ficou fechada por conta da violência na região e só começou a funcionar no começo da década passada. "Infelizmente Pablito não viu a igreja funcionando", lamenta a enfermeira aposentada Carlota Quintero, 62, representante da Pastoral Social local.
Segundo ela, o "benemérito" do bairro sumiu após perder o cargo de deputado e começar a ser perseguido pela polícia, mas acredita tê-lo visto no local pelo menos uma vez depois disso.
"Um dia, enquanto celebrávamos uma missa de Natal, chegou um homem vestido de Papai Noel, distribuindo presentes para as crianças, e foi embora sem dizer nada. Todo mundo teve certeza de que era ele", diz ela.
A violência que ameaçava até o pároco local e impediu o funcionamento da igreja por alguns anos já não assusta tanto os moradores como antes. "Problemas de violência existem em todos os lados, mas em outros bairros é bem pior. Aqui é um lugar tranquilo", conta a dona-de-casa Yenny Marjorie Rave.
Segundo Carlota Quintero, não há no bairro presença de narcotraficantes, guerrilheiros ou paramilitares. Mas são frequentes as brigas entre gangues de jovens, herdeiros, segundo analistas, dos grupos de sicários (matadores de aluguel) arregimentados pelo narcotráfico e que ficaram órfãos com o fim do cartel de Medellín. (RW)


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