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Congo ainda vive guerra civil no dia-a-dia
Terminado oficialmente há quatro anos, conflito persiste no país africano, fazendo mais de mil mortos quase a cada dia
Proximidade de eleição
presidencial falha em trazer
perspectiva para população,
que perdeu 4 milhões de
habitantes em uma década
LYDIA POLGREEN
DO "NEW YORK TIMES", EM AVEBA (CONGO)
Na primeira vez que o Exército do Congo (ex-Zaire) tentou
reconquistar uma aldeia das
milícias que vinham lutando
por seu controle desde que a
guerra civil do país supostamente terminou, em 2002, os
soldados do governo abandonaram as armas e fugiram. Isso
aconteceu em janeiro.
A segunda tentativa, um mês
mais tarde, também fracassou,
a despeito do apoio considerável das forças de paz das Nações
Unidas, que tentam estabilizar
a situação do país antes da eleição marcada para julho -a primeira em mais de quatro décadas. Em lugar de combater as
milícias, os soldados se amotinaram e saquearam a base das
forças de paz na cidade.
Foi só depois da terceira tentativa, em maio, que a milícia
foi enfim expulsa da aldeia, localizada em uma parte densa da
selva equatorial.
Mas embora o Estado tenha
reconquistado o controle provisoriamente, seus esforços
nesse sentido deflagraram uma
nova crise. Milhares de pessoas
se refugiaram na aldeia, exaustas e alquebradas depois de meses de combates nas selvas, e isso perpetuou a fome e a doença
que continuam a imperar no
Congo depois dos cinco mortíferos anos de guerra civil pelos
quais o país passou.
Em menos de uma década,
estima-se que 4 milhões de pessoas tenham morrido, principalmente de fome e em razão
de doenças causadas pelos
combates. Foi o mais mortífero
conflito travado no mundo desde a Segunda Guerra Mundial,
e mais de mil baixas vêm sendo
registradas a cada dia, ainda hoje. Para muitos dos moradores
locais, sobreviver, e não a eleição, é que representa um verdadeiro marco.
"Nós fugimos porque ficamos com medo de morrer em
nossas casas", disse Ngava Ngosi, um dos milhares de refugiados que se viram apanhados em
meio a uma rotina de fugir da
aldeia para a selva, e de volta,
em meio ao caos aparentemente interminável que assola o
leste do Congo. "Mas também
morremos na selva."
Milícias e vizinhos
As eleições presidenciais e
parlamentares de julho serão o
primeiro momento de autodeterminação para a maioria dos
congoleses; a última eleição
pluripartidária aconteceu em
1965. Durante 32 anos, o Congo
foi governado por Mobutu Sese
Seko, que mudou o nome do
país para Zaire e oprimiu a população com sua cobiça e repressão implacáveis.
Desde que Mobutu foi deposto, em 1997, o país, que passou a
se chamar República Democrática do Congo, caiu vítima de
uma disputa mortal entre milícias rivais, tanto congolesas
quanto movimentos apoiados
por países vizinhos. A guerra
terminou oficialmente com a
assinatura de um tratado entre
as facções, quatro anos atrás,
mas a transição para a paz ainda não aconteceu.
Milhares de civis fugiram das
ações militares para eliminar
redutos das milícias, refugiando-se na selva, onde enfrentam
fome e doença. Ocasionalmente, era difícil distinguir se estavam fugindo das milícias, que
saqueavam suas aldeias e praticavam estupros em escala maciça, ou dos soldados do governo congolês, que agiam mais ou
menos da mesma maneira.
As doenças também grassam
sem controle. Na última quinta,
os Médicos Sem Fronteiras
apelaram por ajuda para combater a praga pneumônica no
nordeste do país, após identificarem 144 casos.
Em Geti, 16 quilômetros a
leste de Aveba, centenas de
pessoas chegam a cada dia, em
busca de comida e segurança. A
família Kanoya, cerca de duas
dúzias de pessoas, estava sentada sob uma bananeira esperando que o patriarca, Tchoni Mugero, construísse um abrigo improvisado, usando gravetos e
folhas. A família precisara de
três dias para reunir material
suficiente para o precário abrigo, e enquanto não o conseguiram, dormiram ao relento.
No hospital de Geti, Ngele
Anyodi, um enfermeiro, diz que
as crianças estão morrendo por
falta de comida e devido a
doenças, a cada dia, porque não
é possível transportá-las a um
hospital mais bem equipado.
A eleição pode estar chegando, mas votar, disse ele, era a última coisa que o preocupava.
Mortos, afirma, não votam.
"Precisamos de ajuda", apelou Anyodi. "Primeiro precisamos sobreviver."
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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