São Paulo, domingo, 24 de junho de 2007

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entrevista

"Vivemos sob a tortura da ameaça"

DA REDAÇÃO

"É impossível seguir vivendo sob a tortura da ameaça", diz Teresita Gaviria, fundadora da associação colombiana Mães da Candelária. Ela cobra do governo Álvaro Uribe que dê aos parentes de seqüestrados pobres a mesma atenção destinada ao caso da ex-candidata presidencial franco-colombiana Ingrid Betancourt, que está em poder das Farc. (FM)

 

FOLHA - O que as "Mães" esperam do processo de desmobilização dos paramilitares? Os depoimentos dos chefes presos têm ajudado na busca pelos parentes?
TERESITA GAVIRIA -
Estamos acompanhando as versões livres [depoimentos] dos "paras" detidos. Mas não vejo muito horizonte para a construção da reconciliação. Eles prometeram que nos diriam a verdade. Mas até agora não cumpriram. Exigimos que os "paras" sejam mais claros nas apreciações, que nos digam se mataram as pessoas seqüestradas e onde estão os corpos e quem deu a ordem para tudo isso. Queremos os nomes. E se estão vivas, que nos digam onde estão. E repetimos que, depois da verdade, por dolorosa que seja, vem o perdão.

FOLHA - Como é a relação da associação com os governos agora?
GAVIRIA -
Com os governos municipal e do departamento é muito boa. Mas com o governo nacional é regular. Só tivemos duas ou três audiências com o vice-presidente, mas o presidente nem sequer nos concedeu um encontro. Ao governo não interessava reconhecer a nossa situação. Por que não fazem pelas vítimas humildes o que estão fazendo por Ingrid [Betancourt]? Primeiro estão os políticos e os empresários... Não vêem a mãe de Ingrid como me vêem, como vêem uma camponesa.

FOLHA - Em oito anos, a sra. não vê melhora na situação da Colômbia? Estatísticas mostram índices de violência melhores em Medellín, por exemplo...
GAVIRIA -
A situação melhorou, mas pouco. Há mais polícia na rua, mas não é só isso que resolve. Mas ainda tenho esperança. Queremos que esse senhor [presidente Álvaro Uribe], em vez de se preocupar com seus amigos desmobilizados, preocupe-se com a vítimas. O governo cumpre todas as exigências dos desmobilizados. E nós? Não estamos pedindo, neste momento, indenização. Agora queremos a verdade. Depois, veremos se alguém quer ser indenizado.

FOLHA - O que sra. achou da libertação de prisioneiros das Farc por Uribe?
GAVIRIA -
Estamos desesperadas e confiamos muito nessas negociações. Há pessoas que estão na associação que tiveram parentes seqüestrados pela guerrilha. Claro que as Farc estão jogando com o governo e com o sofrimento das pessoas. Olha tudo que o governo já ofereceu. E eles, nada.

FOLHA - Como a sra. tem sido recebida em outros lugares da Colômbia? Ainda há medo de denunciar os "paras"?
GAVIRIA -
Há vítimas que ainda têm medo de falar. Sentem a toda hora o terror das ameaças. Pensam: se eu, que sou a presidente, estou sendo ameaçada, o que será delas? Isso tem de acabar. Por Deus! É impossível seguir vivendo sob a tortura da ameaça. Não vamos recuar.

FOLHA - Depois do desaparecimento do seu irmão, no mês passado, a sra. não pensou em desistir, em deixar a Colômbia?
GAVIRIA -
Tenho muita esperança de encontrar meu filho, meu irmão, todos. Já esteve em Medellín? Lá é muito bonito [risos]. Eu não penso em sair daqui, nada disso. Não até esclarecer tudo.


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