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Sucata vira pólo turístico na Alemanha
Vale do Ruhr, que abrigava indústria pesada, passa a ganhar 1,5 bilhão por ano com turismo após reurbanização
Antigo centro industrial recicla siderúrgicas e minas de carvão abandonadas para convertê-las em locais de turismo, design e eventos
RAUL JUSTE LORES
DA REPORTAGEM LOCAL
Muros de escalada nas paredes de velhas fábricas. Parques
e muito verde em meio a antigas minas de carvão. Festivais
de teatro, de design e de música
em siderúrgicas abandonadas.
O entretenimento, o turismo, o design e até o verde estão
mudando a fisionomia dos antigos complexos industriais de
uma das regiões mais decadentes e feias da Europa. O vale do
Ruhr, antigo coração industrial
da Alemanha, virou atração turística no país sem esquecer
seu passado fabril.
Os turistas geram 1,5 bilhão por ano para a economia
local -são 2,5 milhões de alemães e 800 mil estrangeiros.
Dois terços dos visitantes vão à
região pelo turismo de negócios, mas a idéia é que eles fiquem alguns dias a mais quando seus congressos acabarem.
Até dezembro, a região abriga o fórum Entry, de design e
arquitetura, com 300 estandes
instalados em uma antiga usina
de lavagem de carvão; a Trienal
do Ruhr, festival de música dirigido pelo ex-diretor do Festival de Salzsburgo, na Áustria;
tem shows em uma termoelétrica adaptada; e um festival de
teatro ocupa siderúrgicas
abandonadas.
Há três semanas foi inaugurada em Essen a nova escola de
design, projetada pelos arquitetos japoneses do escritório
Sanaa. Novos museus e centros
de convenções serão abertos
até 2009. Essen será uma das
capitais culturais da Europa
em 2010 - um reconhecimento à nova vocação.
A transformação contrasta
com a história do Ruhr, que deve sua (má) fama de antiga região mais poluída e sem charme da Europa às centenas de
minas de carvão e siderúrgicas.
Cubatão e Bauhaus
A imagem de Cubatão no
Brasil dos anos 80 foi parecida
com a que o Ruhr carregou por
décadas. Nos anos 70 e 80, várias minas se esgotaram, e as fábricas mudaram para países do
Terceiro Mundo. O desemprego chegou a 17% há dez anos,
um dos maiores do continente,
e os jovens começaram a migrar para outras regiões.
"Até para recuperar a auto-estima da região, a primeira
idéia foi justamente restaurar
as fábricas abandonadas, que
eram a nossa cara, e dar-lhes
novas funções", disse à Folha
Irmgard Schiller, coordenadora do projeto Bismarck, de recuperação industrial de Gelsenkirchen.
O maior símbolo desse renascimento é Zollverein, em
Essen, tida como a fábrica mais
bela da Europa e declarada Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco. Inaugurada
em 1932, foi desenhada por
dois arquitetos da Escola Bauhaus, pioneira do modernismo.
Zollverein vem ganhando diversas novas funções depois de
um plano diretor concebido
por Rem Koolhas, vencedor do
Pritzker, o Nobel da arquitetura, em 2000. Nos últimos sete
anos, os governos alemão e regional e a União Européia investiram 110 milhões para
recuperar o complexo.
Ali, foi instalada a maior pista de patinação da Europa,
além de piscinas públicas, restaurantes, teatro e centros para
exposições. Um museu interativo de ciências foi inaugurado
no ano passado para atrair escolas de toda a Alemanha.
Por toda a região, foi criado
um cinturão verde, uma sucessão de parques horizontais por
400 km que praticamente ligam todas as cidades.
O principal deles é o Parque
Norte, em Duisburg, que aproveitou fornos e as minas abandonadas da antiga siderúrgica
da Thyssen.
Jardins entre chaminés
O paisagista Peter Latz criou
jardins dentro das antigas fábricas, trepadeiras que percorrem as usinas e árvores competindo com as chaminés. É um
parque lúdico, onde as paredes
das construções foram transformadas em muros de escalada. O verde invadiu um antigo
símbolo de poluição.
Em Essen, armazéns abandonados, muito parecidos aos
que povoam a Barra Funda, a
Mooca ou o Brás em São Paulo,
ou a zona portuária do Rio de
Janeiro, foram alugados com
subsídios para novas empresas
de jovens da região, que se responsabilizam pela manutenção
e adaptação dos espaços.
Estúdios fotográficos, empresas de internet, de design e
de moda se instalam nos velhos
armazéns. "Nossa idéia é manter um ambiente criativo, barato e dinâmico para os jovens
empreendedores da região
continuarem aqui", diz Dirk
Otto, um dos diretores da incubadora de empresas Triple-Z.
É talvez o objetivo mais ambicioso da empreitada no Ruhr.
A região de 5,3 milhões de habitantes ainda tem um desemprego de 13%, acima da média
alemã. Apenas 6% da força de
trabalho local ainda vive de siderúrgicas ou das sobreviventes sete minas de carvão.
Estimativas dizem que, até
2015, a região perderá 300 mil
habitantes. Se depender da
criatividade investida nas velhas fábricas, esse processo será menos doloroso.
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