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"Brasil tinha obrigação de dar abrigo", diz assessor do Planalto
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
O assessor internacional da
Presidência, Marco Aurélio
Garcia, disse ontem por telefone, de Nova York, que o Brasil
não tinha alternativa que não a
de abrigar o presidente deposto
Manuel Zelaya na embaixada
brasileira em Honduras: "Política é isso, não é só bônus, é
ônus também".
FOLHA - Zelaya acertou a ida à embaixada com o governo brasileiro?
GARCIA - Eu não tinha a mais
remota ideia. Se tivesse, eu diria, não haveria o menor problema, mas a verdade é que não
tinha. Fui surpreendido no
avião, vindo para Nova York.
Um diplomata da assessoria
[do Planalto] me telefonou, falando dessa situação complexa.
Do avião, tomamos as primeiras iniciativas. O Lula telefonou
para o [chanceler Celso] Amorim em Nova York e para o Samuel [Pinheiro Guimarães, secretário-geral do Itamaraty]
em Brasília.
FOLHA - Que informações o Brasil
tem sobre a volta do Zelaya? Foi
[Hugo] Chávez [presidente da Venezuela] quem planejou?
GARCIA - Não acredito. Escuta,
um sujeito que foi presidente
da República, que tem o prestígio que ele tem em Honduras...
Pela madrugada! Se não tiver
esquema, é melhor ficar em casa. Ele certamente tem um esquema suficientemente forte
para mobilizar pelo menos metade dos hondurenhos. Que esquema teria o Chávez? Não,
não, isso foi obra dos próprios
hondurenhos.
FOLHA - Não é difícil de acreditar
que o Zelaya fez tudo sozinho, chegou lá, bateu na porta da embaixada e foi entrando?
GARCIA - Zelaya é muito mais
esperto do que alguns querem
fazer pensar, com muita independência, com muita personalidade.
FOLHA - Então, o sr. e o governo
não sabem como foi tudo?
GARCIA - Nem eu sei nem ninguém sabe.
FOLHA - O Brasil ficou numa situação difícil?
GARCIA - Estão tentando criar
uma cortina de fumaça. O Brasil não se meteu em enrascada
nenhuma. Alguém bateu à porta da embaixada brasileira e,
evidentemente, o Brasil não
podia bater a porta na cara. Estão tentando negar um direito
internacional, que é o direito de
asilo, além de atribuir um papel
ao Brasil que o Brasil não teve.
Nem articulou nem estimulou.
FOLHA - É asilo?
GARCIA - Não houve pedido de
asilo. Ele está simplesmente
abrigado na embaixada.
FOLHA - É uma situação complicada. O que é possível fazer?
GARCIA - Situação complicada é
a do governo, que deu um golpe
de Estado e está num estado de
isolamento tremendo na comunidade internacional.
Quando Lula falou sobre isso
na ONU, a assembleia recebeu
com uma ovação.
FOLHA - Ao mesmo tempo, o Brasil
fez um apelo para o Zelaya não botar os pés pelas mãos?
GARCIA - Claro. Se ele está abrigado na embaixada, ele tem de
se comportar segundo determinadas normas. Isso é óbvio.
FOLHA - Há risco de invasão?
GARCIA - Pela forma destemperada pela qual o governo ditatorial está se comportando, tudo
é possível. De qualquer maneira, temos de tomar precauções.
FOLHA - Quais?
GARCIA - A primeira é mobilizar a comunidade internacional para garantir a inviolabilidade da embaixada. Além de
condenar totalmente o governo
de fato e respaldar o de direito.
FOLHA - O Brasil está com uma batata quente. Como sair disso?
GARCIA - Política é isso. Não só
bônus, ônus também.
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