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Pacto com EUA divide Parlamento em Bagdá
Acordo que prevê mais três anos de presença militar americana deve ser submetido quarta-feira ao Legislativo iraquiano
Bloco liderado por clérigo
xiita promete barrar texto;
analistas vêem aumento
da violência sectária em
caso de retirada americana
SAMY ADGHIRNI
DA REPORTAGEM LOCAL
Negociado há um ano, o projeto de lei que pretende selar o
último capítulo da presença
militar estrangeira no Iraque
chega ao Parlamento de Bagdá
em meio a incertezas e tensões.
O texto, que delineia um cronograma de retirada dos cerca
de 150 mil soldados americanos
até o fim de 2011 (veja quadro
ao lado), deve ser submetido à
votação pelos 275 deputados
iraquianos depois de amanhã.
Após meses de hesitação, o
premiê Nuri al Maliki abraçou
o texto e teceu alianças que podem facilitar a sua aprovação.
O premiê tem garantidos os
apoios dos dois maiores blocos
do Parlamento: a Aliança Iraquiana Unida, que representa
os principais partidos xiitas do
país, entre eles o Dawa, do próprio Maliki; e a Aliança do Curdistão, uma influente rede de
agremiações curdas que tem no
presidente iraquiano, Jalal Talabani, seu maior expoente.
Maliki espera contar ainda
com a maior parte dos deputados da oposição -sunitas, esquerdistas e nacionalistas-
que vêem com bons olhos a
perspectiva de um compromisso de retirada americano, cinco
anos e oito meses após a invasão que derrubou o ditador sunita Saddam Hussein. Mas elas
queriam um pacto mais abrangente, que garantisse os direitos dos sunitas e laicos em um
cenário dominado por xiitas.
Paradoxalmente, é do campo
xiita que vem também a mais
contundente oposição ao pacto. O partido do clérigo rebelde
Moqtada al Sadr, que rejeita a
idéia de cronograma e exige
uma saída imediata dos EUA,
tem 32 barulhentos deputados.
Na semana passada, eles impediram com gritos e insultos o
presidente do Parlamento de
ler os termos do acordo, que
prometeram barrar.
Os sadristas, respaldados por
outros partidos xiitas minoritários, ainda obtiveram o improvável apoio de grupelhos sunitas -feito raro num país marcado há décadas por violentas
desavenças entre as facções.
Incógnita
O papel do Irã é uma das incógnitas nesta equação. O poderoso vizinho xiita, que tem
estreitas relações tanto com o
governo quanto com os sadristas, elogiou o acordo. Mas há
suspeitas de que os iranianos
estejam sabotando o trato nos
bastidores, recorrendo até a pagamento de deputados.
Apesar das pressões contrárias, a projeção mais plausível é
a de que o pacto seja aprovado e
sancionado pelo presidente e
seus dois vices -os três teoricamente podem vetá-lo.
A entrada em vigor do pacto
pelo Parlamento iraquiano ainda neste ano é fundamental para selar as bases legais da permanência de militares dos EUA
no Iraque quando expirar, no
dia 31 de dezembro, o mandato
atribuído pela ONU após a invasão. Caso não haja definição
até lá, Bagdá deverá solicitar
uma prorrogação do mandato.
A perspectiva de retirada levanta questionamentos sobre o
futuro do Iraque, num momento em que o reforço de contingente americano no ano passado, aliado à cooptação de ex-guerrilheiros sunitas, levou a
uma queda da violência no país.
"A questão é: "A presença dos
EUA desestabiliza ou estabiliza
o Iraque?". Há dois anos, a resposta parecia clara, mas hoje
percebe-se que os militares
americanos contribuíram muito para melhorar a situação no
país", diz o historiador americano Peter Hahn, da Universidade de Ohio, questionando a
capacidade das forças iraquianas de combater rebeldes.
A presença americana por
mais três anos também seria
um desafio para o presidente
americano eleito, Barack Obama, que prometeu uma retirada em 16 meses. "No fundo,
quando Obama assumir a Casa
Branca [em janeiro] e perceber
o quanto é difícil lidar com um
cenário de guerra, ele ficará aliviado por encontrar um trato
que lhe dê uma margem operacional maior", prevê Hahn.
O maior problema, segundo a
analista americana Jessica
Tuchman Mathews, do Carnegie Endowment for Peace, é
que o acordo não estipula nada
a favor da reconciliação nacional iraquiana. "O texto estimula a soberania, mas não elimina
as tensões internas, que podem
ressurgir com toda força."
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