São Paulo, domingo, 25 de janeiro de 2009

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Queda no preço dos minérios empobrece cidade de Potosí

De 2005 a meados do ano passado, houve um "boom" na área da montanha Cerro Rico

Com a crise econômica, mineiros estão deixando Potosí rumo a outros locais; em poucos meses, caíram de 15 mil para apenas 2.000

DO ENVIADO A POTOSÍ

As bananas de dinamite continuam sendo vendidas sem nenhum controle nas lojinhas e nos camelôs de Potosí na rua que dá acesso à legendária e aparentemente inesgotável montanha Cerro Rico, explorada já há quase cinco séculos. As portinhas das casas de teto baixo e as mesinhas armadas nas calçadas também expõem folhas de coca, capacetes, luvas e outros acessórios indispensáveis para a extração de zinco, prata, chumbo e estanho. O que está faltando é mineiro.
"Olha o silêncio, agora só tem silêncio", diz a vendedora Alice Gutierrez, quando a Folha lhe pergunta se suas vendas caíram. "E amanhã vai ser pior."
Até agosto, quando a mineração em Potosí ainda vivia o "boom" mineiro iniciado em meados de 2005, Gutierrez vendia cerca de 30 bananas de dinamite entre 6h e 10h da manhã, horário em que monta a sua venda na calçada diante do cortiço onde mora com dois filhos. Anteontem, não conseguiu vender nenhuma.
"Não ganho mais para comprar a carnezinha", diz Gutierrez, que vende cada dinamite por 2,70 bolivianos (R$ 0,90). Segundo ela, sua margem de lucro por unidade é de apenas 0,10 centavos de boliviano, o equivalente a R$ 0,03.
Os números oficiais confirmam o silêncio das ruas de Potosí desde que o preço dos minérios começou a despencar, principalmente o zinco. Segundo a estatal Comibol (Corporação Mineira da Bolívia), dos 15 mil mineiros que trabalhavam nas cerca de 30 cooperativas até meados do ano, apenas 2.000 continuam entrando nos precários túneis em extenuantes jornadas de cerca de oito horas sob a superfície.
Um deles é Ismael Morales, 16, que há três anos deixou os estudos e a área rural de Potosí para se aventurar no Cerro Rico. Enquanto esperava a van da cooperativa que o levaria até a mina, ele disse que, até agosto, ganhava o equivalente a R$ 33 por dia. Ontem, receberia a metade pelo mesmo trabalho.
"Se o preço do zinco não melhorar, vou buscar outro trabalho, em Santa Cruz. A maior parte já foi embora daqui, para a Argentina, para Cochabamba", afirma o adolescente, cuja cooperativa Conpotosí emprega apenas 80 mineiros -meses atrás, chegava a 180.
Há 20 anos, o principal modo de exploração do Cerro Rico é por cooperativas, fundadas pelos poucos mineiros que não deixaram a cidade na crise de 1985 e passaram a explorar túneis cedidos pelo governo.
"O recente "boom" da mineração, que durou apenas dois anos e meio, foi um efeito circunstancial e conjuntural da crise instalada desde 1985", diz o ex-governador do departamento de Potosí Sergio Medinaceli, em referência ao ano em que os preços baixos expulsaram milhares de famílias. "A exploração a partir de agora será apenas para a subsistência."
A queda brusca do preço dos minerais também atingiu os engenhos, empresas que compram a matéria-prima das cooperativas para o primeiro beneficiamento -dos 38 que funcionavam na cidade, apenas 11 continuam de portas abertas.
No setor imobiliário, um levantamento feito pelo jornal "El Potosí" revelou que o preço dos terrenos caiu pela metade.
Outro setor duramente atingido foi o dos transportistas, que financiaram a compra de caminhões para transporte de minério no "boom". Hoje, com a produção em queda livre, vários veículos ficaram ociosos, e muitos estão sendo revendidos a preços bastante baixos.
"Potosí e outras cidades mineiras são cíclicas. As pessoas chegam quando há atividade mineira e se vão quando deixa de haver. É assim desde o nascimento de Potosí", diz Medinaceli sobre a cidade localizada a mais de 4.000 metros acima do nível do mar e fundada em 1545, logo depois que os espanhóis descobriram Cerro Rico, então uma montanha de prata. (FABIANO MAISONNAVE)


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