São Paulo, sexta-feira, 25 de abril de 2008

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Greve de professores britânicos expõe o desgaste de Brown

Paralisação é a primeira da classe desde a era Thatcher; grevistas pedem aumento salarial para compensar inflação

No poder há menos de um ano, substituto de Blair enfrenta efeitos da crise financeira e divisões no seu partido, o Trabalhista

Adrian Dennis/France Presse
Professores pedem que o governo "deixe de pagar ninharia" durante manifestação em Londres

PEDRO DIAS LEITE
DE LONDRES

A Inglaterra e o País de Gales tiveram ontem a primeira greve nacional de professores em mais de 20 anos, em mais um desgaste para o combalido governo do primeiro-ministro britânico, Gordon Brown.
"A greve é mais uma pedrinha na montanha de problemas de Gordon Brown", disse à Folha o professor Paul Kelly, da London School of Economics and Political Science. "Pode ser que tenhamos nos esquecido disso [da greve] em algumas semanas. Mas é claro que a situação pode se deteriorar se houver novas adesões no serviço público", afirmou.
A greve de ontem afetou mais de 1 milhão de alunos e um terço das escolas britânicas. Metade das escolas atingidas fechou, e a outra metade abriu apenas parcialmente. Apesar de dois terços das escolas terem funcionado normalmente, a greve é a primeira mobilização nacional de professores por aumentos de salários desde 1987, quando Margaret Thatcher ainda estava no poder.
Em menos de um ano à frente do Reino Unido, depois de dez anos de Tony Blair, os problemas de Brown se acumulam. O primeiro-ministro enfrenta:
1. uma revolta de parlamentares de seu próprio partido, o Trabalhista, em torno de mudanças tributárias que provocam perdas para parcelas mais pobres da população;
2. a crise financeira global, que ameaça levar milhares de britânicos a perder suas casas e no segundo semestre do ano passado causou a primeira corrida a um banco inglês em mais de cem anos, o Northern Rock, posteriormente nacionalizado;
3. uma batalha no Parlamento para ampliar de 28 para 42 dias o tempo que suspeitos de terrorismo podem ficar presos sem acusação formal, cuja votação está marcada para junho.
A revolta dos parlamentares levou o governo a recuar das mudanças nos impostos, com promessas de ressarcir os prejudicados, um duro golpe na imagem do primeiro-ministro.
A isso tudo se soma a eleição para prefeito de Londres na semana que vem, em que o candidato da oposição, Boris Johnson, dos Conservadores, tem chances reais de derrotar o atual prefeito, Ken Livingstone, do partido de Brown.

Catalisador
O maior perigo da greve de ontem, como afirmou o professor Paul Kelly, é que ela pode funcionar como um catalisador para outras categorias do serviço público insatisfeitas com os salários. Há pouco tempo, os policiais -proibidos por lei desde 1919 de fazer greve- fizeram uma mobilização reclamando dos pagamentos.
Outros setores, como a Guarda Costeira, também têm feito paralisações. Se a moda pegar, pode se tornar mais um grande problema para Brown.
Os professores querem que o reajuste de seus salários seja ao menos igual à inflação de 4,1% dos últimos 12 meses. Dizem que nos últimos três anos os aumentos já ficaram abaixo da variação dos preços, e, pela proposta do governo, continuarão sendo corroídos ao menos pelos próximos três anos.
O governo responde que, desde 1997, quando os trabalhistas assumiram o poder com Blair, os professores tiveram aumento real de 19%. A média salarial de professores secundários em topo de carreira é de 34 mil libras por ano (cerca de R$ 120 mil anuais, ou R$ 10 mil por mês).
"Eu compartilho da raiva dos pais que vêem seus filhos sofrerem perdas na educação tão perto das suas provas [está perto o final do ano letivo no Reino Unido] e tendo até de faltar ao trabalho para cuidar de suas crianças", disse à BBC o ministro da Educação, Jim Knight.
O sindicato nacional dos professores, que liderou a paralisação, disse "não sentir culpa" nenhuma. A secretária-geral da entidade, Christine Blower, prometeu mais três anos de greves se o governo não recuar e disse que a paralisação tem como objetivo "assegurar o futuro da profissão".


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