|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Inseguros, iraquianos temem vingança de Saddam
PATRICK E. TYLER
DO "NEW YORK TIMES", EM BAGDÁ
O professor Hilal Al Bayyati, ex-diretor do Centro Nacional de
Computação do Iraque, pretende
abandonar o país no final deste
ano, porque não quer viver com
medo de Saddam Hussein.
"Eu tinha pensado em fazer carreira política, ainda que não seja
político, mas, depois, cheguei à
conclusão de que não queria criar
para a minha família o risco de
que alguém um dia me assassinasse", disse Bayyati. "Assim, decidi sair do país até que seja seguro retornar."
Quando o regime de Saddam
entrou em colapso, Bayyati ganhou proeminência ao liderar
uma revolta na Universidade de
Bagdá contra a administração da
instituição, dominada por membros importantes do partido
Baath, de Saddam.
Motivado por dois anos de prisão e tortura sob Saddam, Bayyati
estava determinado a livrar o país
-ou pelo menos a universidade- dos remanescentes dos mais
ardorosos partidários do ditador.
Mas agora ele acredita que esse
esforço esteja fracassando. O que
realmente incomoda o professor
é que, depois de mais de dois meses, o espectro de Saddam ainda
se faça sentir por todo o Iraque.
A despeito da presença de 140
mil soldados norte-americanos
no país, Bayyati e muitos outros
iraquianos, de origens e posições
políticas bastante diversificadas,
não têm a sensação de que a vitória tenha sido consolidada. Não
vêem a emergência de um poder
capaz de eliminar todos os vestígios do um dia todo-poderoso
Saddam.
Os ataques contra as forças
americanas e britânicas e a sabotagem de instalações elétricas e
petrolíferas críticas para a recuperação econômica e social do país
vêm alimentando uma nova psicologia do medo no Iraque.
Bayyati, uma dentre os milhares
de vítimas de Saddam, decidiu tomar a decisão pessoal de partir
porque teme voltar a ser vítima.
"Acredito que as coisas venham a
piorar caso não sejam tomadas
medidas reais", disse, se referindo
aos esforços até agora infrutíferos
para desarmar os iraquianos ainda leais a Saddam.
Muitos dos partidários de Saddam, ao que se acredita, teriam
acesso a arsenais ocultos e a dinheiro escondido. Milhares de
pessoas viram recusados seus pedidos de emprego no governo por
terem ocupado cargos importantes no partido Baath, mas elas
continuam em liberdade para
subverter o novo regime, caso optem por agir nesse sentido.
Quando multidões se reúnem
na capital, hoje em dia, as vozes
mais altas são frequentemente as
dos partidários de Saddam.
Aqueles que falam contra o líder
derrubado geralmente o fazem
chamando os repórteres para
conversas discretas, conduzidas
em inglês e aos sussurros, de modo que a maior parte dos circunstantes não as possa compreender.
Muitos iraquianos presumem
que Saddam tenha preparado esconderijos muito antes da invasão
liderada pelos Estados Unidos.
Imaginam que ele esteja oculto
em uma fazenda à margem do rio
Eufrates, em uma casa no subúrbio de Bagdá ou em uma fortaleza
militar, protegido por aliados
leais, e essa idéia continua a irradiar um senso de que ele detém
poder sobre os iraquianos.
A captura, na semana passada,
do assessor mais próximo de Saddam, Abed Hamid Mahmud al
Tikriti, gerou uma onda de esperança nas fileiras dos iraquianos
que temem a capacidade do ex-ditador para ameaçar seu futuro.
Governo forte
Galab Sadiq Muhammad é padeiro desde a era da monarquia
iraquiana, quatro décadas atrás.
Hoje em dia, ele se senta em um
banco sob uma acácia e passa lá a
maior parte de suas tardes, bebendo chá muito doce.
O único remédio que poderia libertar o país da sombra de Saddam, diz ele, seria um novo governo iraquiano capaz de se projetar
com grande clareza e vigor por toda uma terra desordeira, dividida
em termos étnicos e religiosos.
"Quem quer que surja, nós o
chamaremos pai", disse. "Mas, se
não tivermos logo um governo
iraquiano, não teremos estabilidade, e as coisas serão uma bagunça."
Os limites da autoridade de ocupação americana e britânica são
evidentes. Há 55 mil soldados da
coalizão estacionados em Bagdá,
e eles têm capacidade mais que
suficiente para garantir as ruas
com seus tanques, mas não são
capazes de proteger os iraquianos
contra crimes em suas casas, ou,
quem sabe, contra a vingança de
Saddam.
Texto Anterior: EUA negociam devolução de cinco guardas sírios feridos em ataque Próximo Texto: Irã na mira: 56% dos americanos apóiam ataque ao Irã Índice
|