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Brasileiras voltam; maridos ficam no Líbano
Com desembarques em Recife, SP e Rio, vôo trouxe ontem 139 brasileiros e 9 estrangeiros que fugiram do Líbano
Após 38 horas de viagem, 148 pessoas chegam ao país em vôo militar; mulheres trazem filhos ao Brasil, mas maridos ficam no Líbano
ALEXANDRA MORAES
DA REDAÇÃO
FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE
A segunda leva de brasileiros
que fugiram do Líbano chegou
ontem ao país, em vôo da Força
Aérea Brasileira (FAB), com
148 pessoas -sendo oito libaneses e uma paraguaia. O vôo,
de 14 horas, partiu de Adana
(Turquia), após 24 horas desde
a saída do comboio de ônibus
da capital libanesa, Beirute.
Mais de uma hora antes da
chegada, a família de Sicna Abdallah, 27, já a esperava com
cartazes diante da área de desembarque internacional do
aeroporto de Guarulhos, a terceira parada do vôo, após Argel
(Argélia), onde desembarcaram três pessoas, e Recife (PE).
A aeronave ainda seguiu para o
Rio, onde passaria por revisão e
embarcaria de volta à Turquia.
"Graças a Allah, vocês chegaram", dizia uma placa vermelha
feita pela prima de Sicna, Renata Nached Serhal, 25. "Ela teve
que se esconder dentro de um
porão por cinco dias", contou
Renata, antes da chegada da
prima. "A gente mandou mais
de 20 e-mails para o consulado
em Beirute e para a embaixada
brasileira falando que ela tinha
um bebê de dois meses."
Sicna foi recebida com gritos
e choro. Ela, que se casou e mora há seis anos no Líbano, chegou com o bebê, com um filho
de 2 anos e outro de 6 -o marido ficou no Líbano.
O mesmo ocorreu ao marido
de Antônia Merhi. Ela chegou a
São Paulo com três filhos.
"Perguntei se meu marido
poderia ir, eles disseram que
ele não tinha visto para a Turquia. Cancelei a minha viagem,
depois pensei direitinho, voltei
a ligar, aceitei vir, mas vou trabalhar aqui por ele e por todos
os libaneses casados com brasileiras", diz Antônia, que morava em Antilyas e foi recebida
pelo irmão, Antônio Youssef, e
pelo pai, Rachid, com camisetas
estampadas com a bandeira libanesa e a palavra "Paz".
Também Carla Mussallam al
Masri e Leila Ajouri, ambas casadas com libaneses, vieram
com os filhos e sem os maridos.
O de Leila também por problemas com visto. O de Carla ficou
para "aguardar o que vai acontecer". "Eu quase me arrependo. Na fronteira da Síria, quase
desci do ônibus para voltar.
Meu marido chorando, e a gente indo embora", conta Carla,
que veio com as duas filhas, de 4
anos e 8 anos.
No meio do saguão, Fahime
El Khatib, que também havia
chegado no vôo da FAB, parou
o representante do Itamaraty
em São Paulo, Jadiel Ferreira
de Oliveira, para falar sobre
seus filhos, de dez e seis anos,
cuja vinda não foi permitida pelo pai, palestino que mora no
Líbano. "Quem sabe se alguém
da embaixada falar com eles,
eles se tocam e mandam meus
meninos pelo menos até passar
a guerra?", pedia a brasileira.
"Vai dar tudo certo, Fahime",
dizia Oliveira.
Fátima Orra, libanesa radicada há 52 anos no Brasil, voltou
no dia 11 -um dia antes do início da guerra- da região do vale
do Bekaa, de onde dois cunhados voltavam ontem. "Não vi
nada quando saí, estava um Paraíso", conta Fátima, prima de
Dib Barakat, morto na semana
passada em ataque israelense.
Recife
Com pouco mais do que a
roupa do corpo, a família do encarregado de construção civil
Ali Said Chaito, 66, desembarcou ontem em Recife.
Chaito, a mulher Maria do
Socorro, 42, e três filhos deixaram casas, terrenos, jóias e automóveis. No Brasil, com R$
1.470 no bolso, não tinham como viajar de avião a Belém
(PA), onde têm parentes.
A comunidade libanesa em
Recife se mobilizou para ajudá-los. Enviou dois carros para levá-los à rodoviária, onde embarcaram em um ônibus para
uma viagem de 36 horas.
Libanês naturalizado brasileiro, Chaito deixou o Brasil em
1992, após 34 anos no país. Sua
mulher e dois dos filhos são paraenses. No Líbano, a família
vivia no povoado de Dair Intar,
a 100 km ao sul de Beirute.
"Os aviões começaram a destruir tudo por lá, mas a gente
pensava: amanhã acaba. Em
pouco tempo começou a faltar
comida, gasolina. Ficou pior e
resolvemos ir embora", disse.
Segundo Chaito, o clima na
viagem foi tenso. "Na fronteira
com a Síria, tivemos que pagar
US$ 40 por cabeça para passar." O medo só acabou quando
o grupo embarcou em Adana.
"Foi emocionante", declarou
o libanês naturalizado. "Quando os pneus bateram no chão,
todos aplaudiram", contou.
Ele e a mulher choraram ao
contar a história da fuga. "Agradeço a todos pela ajuda, mas
quero voltar ao Líbano depois
da guerra", disse. "Tudo o que
temos ficou por lá."
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